quinta-feira, 30 de junho de 2011

Falácias e verdades

 Maílson da Nóbrega
Veja


Em seu livro Economic Facts and Fallacies, de 2008, o economista americano Thomas Sowell assinalou que falácias nem sempre são ideias malucas. "Elas costumam ser plausíveis e lógicas, embora lhes falte alguma coisa." Por sua plausibilidade, ganham apoio.

A mais famosa falácia é a do geocentrismo. O Sol, dizia a Bíblia, girava em torno da Terra. A tese foi questionada pelo heliocentrismo, ou o Sol como centro, de Nicolau Copérnico (1473-1543). Copérnico foi apoiado por Galileu Galilei (1564-1642), que teve de se desmentir para não ser queimado vivo pela Inquisição.

O geocentrismo tinha sua lógica. Nos tempos bíblicos, de limitados conhecimentos científicos, o movimento diário do Sol dava a impressão de que a Terra ficava parada e ele girava ao seu redor.

Para Sowell, políticas públicas baseadas em falácias podem ter efeitos perversos. Começa-se com o controle de aluguéis para proteger os inquilinos. O efeito da falácia e desestimular a construção de novas residências.

No Brasil, já houve controle de preços. Era a consequência natural do fechamento da economia e da ausência de competição. Várias vezes o controle foi usado falaciosamente contra inflação causada por políticas fiscais e monetárias expansivas.

Para obterem reajustes, as empresas se encontravam nas reuniões em Brasília. Passaram a se conhecer e a combinar estratégias de preços. Oligopólios surgiram, prejudicando os seus consumidores. O que parecia uma solução virou um problema.

Uma nova falácia é dizer que os bancos exageram nas expectativas de inflação informadas ao Banco Central para assim induzi-lo a aumentar juros e ganhar mais dinheiro. Economistas influentes repelem a tolice.

A afirmação tem sua lógica. Se os juros sobem, dita o senso comum, os bancos cobram mais. Acontece que bancos são como supermercados. Compram dinheiro de seus investidores e depositantes e o vendem aos que precisam de crédito.

Os bancos ganham mais com juros baixos. Seu lucro vem dos serviços que prestam e da diferença entre a captação e a aplicação dos recursos. Juros baixos expandem os empréstimos e reduzem a inadimplência. Mais crédito e menos risco produzem maiores lucros.

O Banco Central vai apurar separadamente as informações de bancos, administradores de recursos e demais participantes de suas pesquisas. Para os que acreditam na falácia, ficará provado que os bancos falseiam as informações. Acontece que o melhor para os bancos é acertar as projeções (na verdade, eles têm subestimado as estimativas de inflação).

O BC deixou de valorizar as expectativas dos bancos quanto à inflação. No regime de metas de inflação, que adotamos desde 1999, o seu papel central é influenciar as expectativas. Pareceu estranho que as minimizasse. O BC estaria sendo vítima da falácia? Em 2009, Richard Wilkinson e Kate Pickett publicaram The Spirit Level: Why More Equal Societies Almost Always Do Better (O nível do espírito: por que sociedades mais iguais quase sempre se saem melhor, numa tradução livre). O livro logo entrou na lista dos mais vendidos e foi saudado como revolucionário por políticos e pela imprensa.

Os autores afirmam que as sociedades desenvolvidas teriam atingido o limite dos benefícios do crescimento econômico. Apesar de ficarem cada vez mais ricas, as pessoas não se tornam mais saudáveis ou felizes. Ao contrário, seus problemas sociais estariam piorando.

Wilkinson e Pickett apresentam estudos de caso para provar que as sociedades menos desiguais sofrem menos os efeitos da vida moderna em sua saúde. Assim, os suecos e noruegueses, povos de renda mais bem distribuída, fumam e bebem menos.

Christopher Snowdon desmontou as falácias da dupla em seu livro The Spirit Level Delusion (A ilusão do nível do espírito, em tradução livre). De forma clara, baseado em sólida argumentação e dados insofismáveis, ele escancarou os inúmeros erros do The Spirit Level. Bebe-se menos na Noruega e fuma-se menos na Suécia por causa da pesada tributação e do rigoroso controle da venda de bebidas e cigarros.

Essas e outras falácias dependem, para sobreviver, da desinformação de quem as toma como verdadeiras. E não raramente se nutrem da desonestidade intelectual de quem as propaga.
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