terça-feira, 25 de outubro de 2011

A qualidade da energia

Para os leitores terem uma boa noção da complexidade que se é buscar o desenvolvimento em um país com sérios problemas estruturais.
Além do aspecto ideológico que permite ao governo de plantão lotear, politicamente, uma agência reguladora da importância da ANEEL.
Energia elétrica sustentável é um pressuposto básico para o desenvolvimento e redução da desigualdade social e, em consequência, da violência urbana.




A qualidade da energia
O Estado de S. Paulo

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) está criando um indicador para avaliar a qualidade da distribuição de energia. Nos casos em que o serviço não atingir um mínimo de qualidade, pretende aplicar um redutor nas tarifas cobradas pelos fornecedores, anunciou o diretor do órgão regulador, Julião Coelho, em entrevista ao Estado (19/10). A medida se justificaria diante da falta de investimentos e das interrupções do fornecimento de energia, que provocam graves prejuízos às empresas e às famílias.

A Aneel quer criar um novo índice, denominado Xq, capaz de aferir a evolução da qualidade do serviço. "Se a concessionária deixar de realizar investimento, no reajuste vamos identificar isso e reduziremos a tarifa, caso a qualidade (do serviço) tenha se deteriorado", disse Coelho. Hoje, os reajustes das tarifas ocorrem anualmente, com base em índices de inflação, havendo uma revisão a cada quatro anos. A tarifa é reavaliada pela Aneel com base em indicadores de investimento e de produtividade das distribuidoras de energia.

O indicador proposto introduz um novo parâmetro para a determinação do reajuste tarifário. Ele permitirá, segundo a reportagem, rever a tarifa em prazos de apenas um ano. A Aneel quer coibir uma prática de várias empresas do setor: a de dar preferência à distribuição de dividendos aos acionistas, em detrimento de investimentos imperativos para a manutenção e a expansão dos serviços.

Nos últimos anos, com a aceleração do ritmo de crescimento da economia e o aumento do número de consumidores de energia, os colapsos no fornecimento tornaram-se mais frequentes e mais prolongados em todo o País. Por isso, a nova regra é defendida pelo diretor técnico da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), Luciano Pacheco. Em artigo no Estado (20/10), ele mostrou que bastam interrupções de curta duração e variações na tensão de fornecimento para provocar impactos na produção industrial comparáveis aos de "apagões de várias horas".

O anúncio da Aneel pode ser um sinal de exaustão dos mecanismos de punição existentes, como as multas aplicadas em escala crescente pela agência e por órgãos reguladores estaduais. No primeiro semestre, a Aneel impôs às concessionárias o pagamento aos consumidores de R$ 163,77 milhões, a título de ressarcimento por prejuízos decorrentes de colapsos energéticos. Mas o montante foi apenas 7,4% superior ao do primeiro semestre de 2010 e em muitos casos não compensou os prejuízos que tiveram os consumidores que deixaram de trabalhar ou estudar por falta de energia ou perderam negócios devido a colapsos. E, se o consumidor tiver de recorrer à Justiça para se ressarcir, não pode esperar uma solução rápida.

A fixação de novos limites para os indicadores de qualidade aplicados pela Aneel está em audiência pública, abrangendo as companhias CPFL Piratininga, Elektro, Bandeirante, AES Eletropaulo, Coelce e CEA. É tarefa rotineira, que ocorre nos anos de revisão tarifária periódica das empresas.

As distribuidoras manifestam preocupação com a mudança das regras da Aneel. O presidente da Associação Brasileira dos Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Nelson Fonseca, entende que as empresas serão duplamente punidas, pois já pagam as multas. Além disso, estão sujeitas à redução da taxa de remuneração dos ativos, de 9,95% para 7,15%, e ao aumento do repasse para o consumidor dos ganhos de produtividade, o chamado Fator X, de 0,4% para 3,3%. Com lucros menores, o investimento tende a cair, avalia a Abradee.

Ainda que a Aneel tenha o poder de alterar as regras de avaliação da qualidade dos serviços, não se deve afastar a hipótese de que as distribuidoras contestem judicialmente as mudanças, contrariarem os termos dos contratos de concessão.

Que é preciso melhorar os serviços e o fornecimento, não resta dúvida. Mas o resultado final das iniciativas da Aneel não pode ser um retardamento ainda maior dos investimentos. Afinal, o mais caro dos serviços é aquele que não está disponível.
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