quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Transporte público, energia e a questão ambiental

Caros amigos, estimulo a leitura deste artigo que é fruto de uma análise científica muito bem elaborada acerca da relação entre transporte individual e coletivo nas grandes cidades tendo-se como base o impacto energético e ambiental.


Contudo, como sou um pesquisador e também tenho Mestrado em Segurança e Defesa, habitue-me a olhar todos os fenômenos sociais e econômicos através da lupa do binômio ocupação de mão-de-obra e segurança, ou seja, o homem empregado alimenta e educa uma família não estando nem ele nem os filhos nas ruas suscetíveis a pequenos ou grandes crimes.


Considerem, então, a título de exemplo, que uma montadora da Fiat, em Goiana-PE, vai gerar 3500 empregos diretos, utilizar uma cadeia de produção de mais de 40 médias e pequenas empresas em seu colar produtivo e, junto com revendedoras pode chegar a quase 3000 empregos indiretos. Ou seja, carro nas ruas emprega mais, arrecada mais e desenvolve mais. Se os recursos são desviados ou mal empregados aí o problema é o velho cochilo do cidadão que, em sua idiossincrasia, prefere não se envolver nesse complexo mar de vivenciar, plenamente, sua cidadania.




Transporte público, energia e a questão ambiental
Marcelo Cardinale Branco
Valor Econômico


Em todo o mundo se manifestam as consequências do modelo de deslocamento de pessoas e de cargas que foi adotado já no início do século passado, com o advento dos automóveis e caminhões, sustentado pela farta disponibilidade de petróleo. A primeira delas foi uma contínua perda da prioridade do transporte público em relação ao individual nas grandes cidades aliada a igual abandono das ferrovias no transporte de cargas no interior. A segunda foi o progressivo congestionamento das vias públicas, cujo efeito foi sendo postergado por meio do contínuo e crescente investimento nas obras viárias. Finalmente, a terceira consequência foi a constatação cada vez mais segura da elevação da poluição ambiental. Assim, foi dado o alerta ambiental, com o reconhecimento da poluição local e global, reflexo da queima de combustíveis, especialmente os de origem fóssil.

Nas fases anteriores de desenvolvimento, aspectos econômicos pouco importaram, sendo sempre encobertos pelo aumento da produtividade. O progressivo encarecimento do transporte, a utilização de veículos de baixíssimo rendimento energético, os riscos de escassez dos combustíveis, entre outros, sempre foram vistos como inconvenientes superáveis pelo lucro. Até mesmo a escassez de combustíveis foi encarada apenas como uma questão de preço e/ou de pressões econômica e política sobre os produtores.

Mas o alerta da poluição mudou os rumos da história. Os seus efeitos não são controláveis por meio de maior ou menor investimento. Talvez um pouco tarde, face às consequências adversas de curto prazo, foi preciso verificar as causas.

Dessa forma, é necessário e urgente mudar as matrizes de transporte, dando ênfase aos modos ambientalmente sustentáveis e reduzindo aqueles que consomem combustíveis com baixo rendimento energético, que promovem mais acidentes e que, nas cidades, forçam cada vez mais o desaparecimento das funções sociais da rua. Significa jogar no lixo da história os cálculos de "custo-benefício", sempre invocados em favor dos transportes menos sustentáveis, por não levar em conta as chamadas "externalidades negativas" e seus vastos custos socioambientais.

Para ilustrar o que se afirma, apoiemo-nos no caso da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). Os deslocamentos motorizados de pessoas hoje se distribuem entre os modos públicos (metrô, trem, ônibus, trólebus) e privado (basicamente automóveis). No tocante aos transportes motorizados, o sistema público representa 55% dos deslocamentos e os automóveis representam 45% na cidade de São Paulo, conforme pesquisa Origem/Destino do Metrô, realizada em 2007.

Basta lembrar que o transporte de um passageiro de automóvel ocupa um espaço viário cerca de 60 vezes maior do que aquele efetuado por um ônibus grande circulando em corredor apropriado, para sentir o significado da grande participação dos automóveis no transporte urbano. Este dado recomenda esforços no sentido da alteração da matriz de transporte.

Essa mudança deve levar em conta possibilidade de geração contínua e não esgotável das fontes de energia como o etanol e da energia elétrica firme. O etanol, além de emitir cerca de 70% menos gás carbônico, tem a possibilidade de ajudar no resgate do carbono graças às plantações de cana-de-açúcar.

Além disso, a fluidez do transporte coletivo tem relação direta com o meio ambiente. O aumento da velocidade diminui as emissões. Um ônibus em um corredor em São Paulo tem velocidade média 20 km/h, o que diminui o consumo em 20% e as emissões, em 40%, se comparado aos que não estão nos corredores. Em casos como Expresso Tiradentes, a velocidade sobe para 37 km/h, cortando o consumo pela metade e as emissões, em 60%.

Assim, sob o ponto de vista do dispêndio de energia, a situação não é menos gritante. Basta lembrar que, na RMSP, avaliou-se, alguns anos atrás, que, enquanto uma viagem por automóvel demanda 13 kWh de energia, aquela feita em metrô consome 0,5 kWh.

Façamos então um exercício. O que aconteceria se a matriz de transportes motorizados fosse alterada para 70% e 30%, na relação do uso do transporte público e do privado? Isso poderá ocorrer se esse transporte público for de boa qualidade, por meio de aumento de oferta dos sistemas metroferroviários e uma parte razoável do espaço liberado destinada a corredores de transporte eletrificado sobre pneus, em faixa segregada, formando um modo de transporte de média capacidade, que a cidade hoje não possui.

Reduzir em 1/3 o transporte por automóveis, cuja frota circulante paulistana é de 3,3 milhões do total de veículos particulares (com exceção de motos, caminhões e ônibus), significa transferir para os modos públicos 1,54 milhão de passageiros, liberando cerca de 1 milhão de automóveis que, em circulação, ocupam 49 milhões de metros quadrados de vias, além das faixas de estacionamento correspondentes. A absorção desses passageiros por um corredor eficiente implica a utilização prioritária de apenas 3,9 milhões de metros quadrados.

A energia economizada, por outro lado, chegaria a 16 milhões de kWh por dia, suficiente para abastecer cerca de 1,4 milhão de casas com demanda unitária de 350 kWh/mês.

Além das economias enormes que podem advir da substituição do transporte individual pelo coletivo, a troca de veículos a combustíveis por outros de tração elétrica, cujo rendimento energético dos motores é três vezes maior, também representa economia nada desprezível. Ademais, a produção de energia se torna cada vez mais difícil, onerosa e arriscada (vide Japão e Golfo do México), sendo uma insensatez desperdiçá-la, seja a que título for.

Marcelo Cardinale Branco, administrador de empresas, é secretário municipal de Transportes de São Paulo. Foi presidente da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) e secretário municipal de Infraestrutura e Obras.
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Um comentário:

  1. Olá Jefferson!

    Muito interessante o artigo, acho que muitas pessoas têm plena consciencia dos danos que o transporte individual causa ao meio ambiente. Mas como o próprio artigo diz, fazendo um exercício, de imaginação, "se esse transporte público for de qualidade" o problema é que não adianta propor a redução dos carros se o sistema de transporte é deficiente e as pessoas que sofrem no transporte público se limitam a repetir todos os dias "O trabalho nem cansa, o que cansa é o caminho, este aperto, a gente paga caro para andar nisso aqui quero ver se os governadores pegassem isso aqui”
    Sem acreditar que a mobilização pode gerar mudanças!

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