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.O Tempo que Foge
Contei os meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui parafrente do que já vivi até agora. Sinto-me como aquele menino que ganhou uma bacia de jabuticabas. As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço. Já não tenho tempo para lidar com mediocridades. Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados.Não tolero gabolices. Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para projetos megalomaníacos. Não participarei de conferências que estabelecem prazos fixos para reverter a miséria do mundo. Não vou mais a workshops onde se ensina como converter milhões usando uma fórmula de poucos pontos. Não quero que me convidem para eventos de um fim-de-semana com a proposta de abalar o milênio.
Já não tenho tempo para reuniões intermináveis para discutir estatutos,normas, procedimentos parlamentares e regimentos internos. Não gosto deassembléias ordinárias em que as organizações procuram se proteger eperpetuar através de infindáveis detalhes organizacionais.
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar daidade cronológica, são imaturos. Não quero ver os ponteiros do relógioavançando em reuniões de "confrontação", onde "tiramos fatos à limpo".
Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário do coral (ou síndico).
Já não tenho tempo para debater vírgulas, detalhes gramaticais sutis, ousobre as diferentes traduções da Bíblia. Não quero ficar explicando porquegosto da Nova Versão Internacional das Escrituras, só porque há um grupo que a considera herética. Minha resposta será curta e delicada: - Gosto, e ponto final! Lembrei-me agora de Mário de Andrade que afirmou: "As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos". Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos.
Já não tenho tempo para ficar explicando aos medianos se estou ou nãoperdendo a fé porque admiro a poesia do Chico Buarque e do Vinicius deMoraes; a voz da Maria Bethânia; os livros de Machado de Assis, Thomas Mann, Ernest Hemingway e José Lins do Rego.
Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita para a "última hora"; não foge de sua mortalidade, defende a dignidade dos marginalizados, e deseja andar humildemente.
Caminhar perto delas nunca será perda de tempo.
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Com certeza! Concordo!!
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