Por mais fortes que sejam, as expressões utilizadas pelo diretor-geral da Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata), Giovanni Bisignani, para se referir à situação do sistema aeroportuário brasileiro e à falta de ações concretas do governo para melhorá-lo até a realização da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada de 2016 - "vergonha", "desastre" são algumas delas - retratam a realidade. "O Brasil é a maior economia da América Latina e a que mais cresce, mas a infraestrutura de transporte aéreo é um desastre de proporções crescentes", disse Bisignani, em encontro internacional de companhias aéreas no Panamá.
Dirigente de uma entidade formada por mais de 200 empresas aéreas, a maioria das quais opera no País, Bisignani conhece cada detalhe da situação aeroportuária brasileira. O quadro é crítico em São Paulo, observou, na reunião realizada na semana passada.
E o governo tem dificuldades para encontrar as soluções adequadas, como mostrou, ao contar que, para as obras de modernização e ampliação do Aeroporto Internacional de Guarulhos, a Infraero chegou a propor o fechamento de uma pista. "Isso teria cortado a capacidade pela metade. Nós gritamos e o governo está agora buscando uma solução", disse.
As críticas do diretor-geral da Iata mostram que os problemas do sistema de transporte aéreo e a lentidão do governo em enfrentá-los tornaram-se motivo de preocupação internacional. A reação do ministro da Defesa, Nelson Jobim, às críticas, que classificou como "terrorismo", exprime o comportamento comum de boa parte das autoridades diante dos problemas crescentes no sistema aeroportuário: desqualificar quem os aponta.
Coincidência ou não, poucos dias depois das observações da Iata a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) finalmente mostrou disposição de agir preventivamente e realizou uma reunião de emergência com todos os envolvidos na questão, para evitar novo caos aéreo no fim do ano. Infraero, Polícia Federal, Receita Federal, companhias aéreas e Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea), além da própria Anac, aprovaram várias medidas para melhorar os serviços aéreos e aeroportuários nos próximos meses. Entre elas estão a disponibilidade de aeronaves reservas, o aumento das equipes de atendimento, a ocupação de todas as posições de check-in das companhias nos horários de pico e a proibição de overbooking.
São medidas paliativas - ou inúteis, como a proibição de overbooking, que já deve ter sido feito para o fim do ano - que não respondem à preocupação central da Iata com relação aos próximos anos. "O que era para ser feito de forma estratégica, estrutural, é feito como se fosse para apagar um incêndio", disse ao Estado o professor de logística da FGV Marcio Nobre Migon.
Uma Anac mais atuante na fiscalização é defendida pelo professor de engenharia da Universidade Federal Fluminense Marco Aurélio Cabral, que estuda o setor aeronáutico. É necessário também "um esforço de planejamento e articulação com as companhias aéreas, mas sem ceder aos interesses do mercado".
E há a questão das obras indispensáveis para evitar um novo colapso aéreo. A Infraero, responsável por elas, diz conhecer bem as necessidades do País e assegura que recursos existem. Até 2014, diz, serão investidos R$ 5,6 bilhões em 13 aeroportos.
Esse, de fato, é o plano do governo. O que não está certo, porém, é que ele será executado no prazo previsto, que é exíguo. Em julho, auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) constatou que "o planejamento de investimentos efetuado pela Infraero indica a existência de situações que podem resultar em não conclusão das obras em tempo hábil".
O planejamento da Infraero prevê uma forte concentração de investimentos em 2012 e 2013. Mas, mesmo num ano como 2010, em que teria de investir menos do que naqueles que antecedem a Copa do Mundo, a Infraero não está conseguindo cumprir o programado. Até outubro, investiu apenas 22% do valor previsto para todo o ano.
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