sábado, 27 de novembro de 2010

Novo ataque expõe a falta de opções para a Coreia do Sul

 Evan Ramstad | The Wall Street Journal, de Seul
Valor Econômico

Quantos ataques mais a Coreia do Sul vai absorver antes de contra-atacar?

Com o ataque mortal de foguetes a uma ilha sul-coreana, mais uma vez a Coreia do Norte colocou sob os holofotes o paradoxo da segurança que tem definido o impasse nas relações bilaterais entre os dois países por mais de 60 anos: apesar de ser um país militarmente e economicamente mais fraco, a Coreia do Norte tem sido capaz de atacar e desafiar a Coreia do Sul à vontade e sem medo de contra-ataques.

Desde o cessar-fogo que pôs fim à Guerra da Coreia, em 1953, a Coreia do Norte provocou a Coreia do Sul mais de 30 vezes com atos de violência fatais ou com risco de vida. Explodiu um avião sul-coreano, assassinou integrantes do gabinete presidencial da Coreia do Sul, disparou em barcos da Marinha e enviou soldados para matar sul-coreanos por terra e em submarinos.

As respostas da Coreia do Sul variaram de sanções comerciais a cortes de comunicação e de ajuda econômica, mas nunca houve retaliação militar. E esse padrão parece que irá continuar, apesar de o ataque de ontem ter sido o primeiro em que a Coreia do Norte atingiu alvos baseados em terra desde a guerra entre os dois países.

"A questão para a Coreia do Sul é saber quão mais sérios esses ataquem podem ser em relação ao risco de não fazer nada e de mostrar que não há custo pior do que o risco de provocar uma reação ainda mais forte da Coreia do Norte", diz Andrew Gilholm, analista em Pequim da Control Risks, uma consultoria de risco para empresas financeiras. "Minha visão é que ainda não estamos nesse nível."

Parte do risco que a Coreia do Sul enfrenta é que sua capital e maior cidade, Seul, está a apenas 40 km da fronteira entre os dois países, onde a Coreia do Norte enfileirou centenas de foguetes que podem atingir a cidade em minutos. A Coreia do Norte também possui centenas de mísseis de curto e médio alcance que poderiam atingir qualquer ponto do Sul.

Além disso, a Coreia do Sul, com um produto interno bruto de US$ 900 bilhões, é a 15ª maior economia do mundo e hospeda fabricantes mundialmente conhecidos de produtos eletrônicos e veículos, bem como siderúrgicas e petroquímicas - indústrias que seriam prejudicadas por um conflito na península coreana.

"A Coreia do Norte pensa que o Sul nunca irá contra-atacar. Este é o entendimento", diz Yoo Dong-ryull, analista da Coreia do Norte no Instituto de Ciência Política em Seul. "Eles sabem que o povo sul-coreano, assim como o governo, tem medo de uma guerra."

Segundo um assessor, o presidente sul-coreano, Lee Myung-bak, disse ontem à noite que a Coreia do Sul deve "puni-los várias vezes pelo que eles nos fizeram". O mesmo assessor, no entanto, havia dito mais cedo que a primeira ordem de Lee numa reunião emergencial com seus principais assessores de segurança foi de "assegurar que isso não se deteriore". O presidente não fez aparições públicas depois do ataque de ontem.

O incidente é um novo teste para Lee, poucos meses depois que o barco de patrulha sul-coreano Cheonan afundou perto de uma ilha na fronteira marítima entre os dois países, matando 46 marinheiros.

Lee não responsabilizou a Coreia do Norte durante dois meses, até que partes da embarcação foram recuperadas e os investigadores encontraram pedaços de um torpedo norte-coreano entre os destroços. Ele determinou punição econômica, mas tinha poucas opções porque a Coreia do Sul já havia restringido sua ajuda ao Norte e havia concordado com outras sanções impostas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas depois que Pyongyang testou uma bomba nuclear no ano passado.

Então, Lee suspendeu até mesmo a imposição de punições simbólicas, menos uma, a que a Coreia do Norte mais criticou: a divulgação de propaganda por alto-falantes na fronteira entre os dois países. A Coreia do Norte ameaçou atirar nos equipamentos.

"O governo sul-coreano deveria ter sido mais forte na sua resposta ao incidente de Cheonan", disse Kim Heung-Kwang, um desertor norte-coreano de alto escalão, que era professor de ciência da computação em Pyongyang.

As imagens capturadas ontem, por câmeras de circuito fechado, de foguetes explodindo em casas e as nuvens de fumaça, chocaram os sul-coreanos. Eles estão acostumados à belicosidade extrema da retórica do Norte e a suas ocasionais escaramuças militares com o Sul. Mas, apesar de a maior parte das baixas terem sido no campo militar da ilha de Yeonpyeong, os foguetes também destruíram casas e locais de trabalho de civis, que já haviam sido alvos da Coreia do Norte. O caso mais notável foi o bombardeio, em 1987, de um jato da Korean Air Lines sobre o Mar de Andaman que resultou em 115 mortes.

Ontem à noite, Park Jung-jin, um banqueiro de Seul, disse que estava assustado com as últimas imagens e considerava a possibilidade de uma guerra com o Norte. "Eu ainda acredito que não irá tão longe, mas a notícia sobre todos aqueles tiros foi definitivamente a maior provocação norte-coreana que já vi até hoje", disse.

As provocações da Coreia do Norte aconteceram tanto em tempos de relações próximas quanto mais frias entre os dois países. Logo depois de a Coreia do Sul ter lançado a Política Sunshine de aproximação com o Norte, em 1998, um submarino norte-coreano foi capturado perto da cidade sul-coreana de Sokcho, na costa leste. Os nove tripulantes foram encontrados mortos num aparente suicídio coletivo. E, durante a ajuda oferecida em 2002, a Coreia do Norte envolveu-se em um conflito naval que resultou na morte de seis marinheiros sul-coreanos.

Em 1974, um agente da Coreia do Norte foi a Seul e tentou matar o então presidente sul-coreano Park Chung-hee, mas conseguiu apenas feri-lo e acabou matando a primeira-dama Uyk Yeong-su. A reação depois dos disparos foi complicada pelo fato de o assassino ter vivido no Japão e usado uma pistola da polícia japonesa no ataque. O governo japonês inicialmente se recusou a fazer o pedido de desculpas que a Coreia do Sul queria, atraindo a fúria popular mais contra o Japão do que contra a Coreia do Norte, e estimulando manifestações diárias contra Tóquio.

Em 1983, um esquadrão norte-coreano matou 17 membros do alto escalão do governo sul-coreano, inclusive alguns do gabinete presidencial, que realizavam uma visita de Estado a Yangon, no Mianmar (antiga Birmânia). Após o incidente, a Coreia do Sul esperou várias semanas até Mianmar acusar formalmente a Coreia do Norte pelos assassinatos, e pressionou este e outros países a impor sanções econômicas ao Norte.
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