terça-feira, 23 de novembro de 2010

Construção do futuro

 Marcelo Garcia e Rodrigo Maia
O Globo

A pobreza, em toda a sua extensão e complexidade, não deve ser medida e avaliada com base em indicadores sociais que levam em conta apenas a renda. Ser pobre é padecer em meio a um rol de privações, uma sucessão de ausências e uma imensidão de incertezas. A falta de renda é uma das inúmeras carências deste lado pior do mundo.

Ao definir a pobreza como um conjunto de privações, o Índice de Pobreza Multidimensional (IPM), do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), passou a representar um marco na história das políticas públicas na área social. Com o novo conceito finalmente vamos ter espaço para inúmeras mudanças na luta contra a pobreza.

Para se ter ideia do avanço que isso pode representar, podemos dizer, com muita tranquilidade, que a adoção do índice multidimensional do PNUD poderá criar todas as condições para avançarmos rumo à segunda fase da luta contra a pobreza no Brasil.

Para começar, o índice permitirá que o foco das ações passe a ser a família. Com esta inovação, a responsabilidade dos gestores públicos será maior, uma vez que cada família pobre precisará de uma agenda especial para avançar em direção a uma vida melhor.

De forma muito acertada, a nova regra considera que uma família é pobre quando reúne 30% de privações sobre um conjunto de indicadores que incluem Educação, Saúde e outros sinais do padrão de vida na residência - energia elétrica, banheiro, água potável e bens domésticos. Antes, a pessoa que vivia com até US$1,5 por dia era considerada pobre.

Desde o fim dos anos 90, temos repetido que para identificar e quantificar as causas, as expressões, os efeitos e os legados da pobreza teríamos de ampliar os levantamentos estatísticos feitos com base na renda.

Agora, os estudos do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento comprovam: a busca de soluções eficientes para os problemas sociais implicam a superação do pensamento simétrico dos economistas.

Nos últimos 14 anos foram consolidados três grandes programas federais de transferência de renda: Beneficio da Prestação Continuada para idosos com mais de 65 anos e pessoas com deficiência, aposentadoria rural e Bolsa Família.

Até o fim de 2010, serão transferidos mais de R$40 bilhões para as famílias pobres no Brasil.

Estes programas - necessários e importantíssimos - estão assegurando, de fato, o aumento da renda familiar entre os mais pobres. Ocorre, porém, que só garantem um tipo limitado de inclusão social, que nada tem de sustentável.

É por esta razão que defendemos o aperfeiçoamento dos programas por meio da nova metodologia do PNUD. Tanto para calcular indicadores sociais precisos, quanto para garantir a realização de políticas públicas adequadas, as variáveis propostas pelo PNUD são as mais indicadas.

O processo de erradicação da pobreza no Brasil tem chances de ser ainda mais amplo, caso o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome decida compartilhar uma parcela dos dados do seu Cadastro Único com os Estados e os municípios.

Este gesto de grandeza do poder central teria impacto na República por abrir, a todos os agentes públicos do país, a oportunidade de participar de um grande esforço nacional para acabar com a pobreza.

A organização de uma Agenda Social ampla, que tenha âmbito nacional e que eleve a família ao primeiro plano das políticas públicas, aliada à aplicação dos novos métodos do PNUD, são medidas essenciais para acelerar a inclusão social dos pobres, de forma efetiva. Além de nosso dever e nossa responsabilidade como homens públicos, atuar no combate à pobreza é o melhor legado que podemos deixar às próximas gerações.

MARCELO GARCIA é assistente social e coordenador do programa Agenda Família dos Partido Democratas (DEM). RODRIGO MAIA é deputado federal (RJ) e presidente Nacional dos DEM.

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