Os princípios éticos são fundamentos importantes para nortear as ações das pessoas num país que se pretenda verdadeiramente democrático e justo. Não se trata de uma sociedade utópica, como a construída por Thomas Morus, mas de práticas perceptíveis e necessárias, porém vergonhosamente "esquecidas" nos dias atuais.
Ao acompanhar diariamente o noticiário veiculado por este tradicional periódico, não são raras as vezes em que o leitor se depara com relatos de denúncias de corrupção, desmandos e abusos de autoridades em diferentes níveis e de mau uso do dinheiro público - ações essas que remetem claramente a questões de desvios éticos e morais. E, como uma praga que se dissemina, tais práticas atraem seguidores em velocidade e reverberação tão impressionantes quanto a propagação de um novo vírus pela internet ou de um vídeo cômico no YouTube.
Um dos antídotos mais eficazes para essa ameaça letal à liberdade, à democracia e à civilidade é a educação. Tanto aquela que aprendemos dentro de casa, desde os primeiros anos de vida, com os pais, como também - e principalmente - aquela transmitida na escola por mestres na melhor acepção da palavra. As instituições de ensino - que todos devem frequentar, ao menos, pelos nove anos iniciais - precisam assumir o compromisso de educar os seus alunos dentro dos princípios da ética e da democracia.
Quando se incutem na criança e no jovem tais conceitos, quase certamente eles os seguirão na idade adulta - pautando desde os pequenos atos do dia a dia até os grandes momentos do exercício da cidadania. Não haverá a surpresa, por exemplo, se o cliente avisar ao caixa do supermercado que recebeu troco a mais. Ou se a esmagadora maioria dos cidadãos decidir votar movida pelo interesse maior do País, e não por anseios pessoais ou corporativistas. E nem se espantará se os ocupantes do governo elegerem prioridades que beneficiem efetivamente as suas comunidades, e não persigam apenas ganhos eleiçoeiros ou atração de apoios espúrios.
Este quase fim de ano, às vésperas da posse de novos governantes e legisladores, é momento mais do que propício para pôr em debate e cobrar uma postura clara, geral e irrestrita em favor da ética. Postura que deverá ter início com o apoio de todas as instâncias do poder público e da sociedade organizada a um projeto educacional destinado a formar cidadãos dotados de capacidade crítica e de saberes que os tornem aptos a atuar, nas mais variadas esferas sociais, com competência, responsabilidade e consciência cívica.
Não se trata, aqui, apenas de uma questão de moral nem restrita à educação. A ética está acima da moralidade; é, na verdade, um valor inerente aos direitos e deveres dos cidadãos. Mas não um valor que nasce por geração espontânea; ao contrário, ele resulta de decisão individual refletida e seguida de uma prática vigilante e diuturna. Aristóteles, com toda a sua sabedoria, já dizia na Antiguidade clássica que "nenhuma das virtudes morais surge em nós por natureza, adquirimo-las por exercício". Porém, atualmente, nas escolas predomina a quase obsessão pelo sucesso nos vestibulares (a bem da verdade, isso também ocorre na maioria das famílias) ou por modismos didático-pedagógicos, permeados de vieses ideológicos que desvirtuam a transmissão de conhecimentos e mandam para escanteio a construção dos valores éticos nos alunos. Isso sem falar nos prejuízos causados ao aprendizado pela sucessão de tais mudanças, que acabam por constituir pseudorreformas do ensino, visto que resultam em crescente evasão e deficiência do desempenho dos alunos.
Não é descabido associar a esse cenário a crescente onda de violência que marca as ruas, vem invadindo os muros escolares e estimula a formação das verdadeiras gangues de bairro ou de torcidas organizadas. Os frutos? Ações e ilícitos que configuram desrespeito contínuo à lei e à ordem jurídica, denotando a rarefação dos parâmetros de convivência civilizada em sociedade.
Os professores têm um papel fundamental na formação dessa juventude que dirigirá a economia e conduzirá o desenvolvimento do País nos próximos anos. Com exemplo e coragem, devem mostrar a seus alunos a importância da aceitação de limites, dos valores - solidariedade, compromisso, honestidade, estudo, trabalho - e do respeito às normas e aos princípios que deles decorrem. Isso vale tanto para o relacionamento entre chefia e subordinados no mundo corporativo ou entre professores e alunos em sala de aula, quanto, por exemplo, para os pais e filhos na convivência familiar, para os moradores de um condomínio ou para os músicos que formam uma filarmônica. E o professor - esse profissional pouco valorizado pela sociedade, negligenciado pelo poder público e desrespeitado por pais de alunos, sem formação adequada e com remuneração quase tão baixa quanto a sua autoestima - é um pilar importante para propagar esses conceitos.
Por tudo isso, merece ter o seu papel resgatado por todos e cada um em particular - afinal, esse processo se enquadra nos caso em que, pelo valor da emulação, o total poderá ser maior do que a soma das partes.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) estabelece que a escola deve ser um local de formação de cidadãos e difusão de valores que expirem cidadania e ética. Mas para que ela realize a missão de formadora das novas gerações é necessário que governo e sociedade também a consagrem como espaço da ética, resgatando a autoridade dos mestres e colaborando para o aprimoramento de suas relações com a comunidade, os pais e os alunos. Até porque disseminar os princípios éticos na escola é, antes de tudo, garantir uma sociedade mais justa e mais humana para as novas gerações.
PRESIDENTE DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS JURÍDICAS
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