segunda-feira, 15 de novembro de 2010

G-20 marca divergência entre as potências

Cláudia Trevisan
O Estado de S. Paulo


Estados Unidos e China não entraram em acordo a respeito de política econômica

O encontro dos líderes das 20 maiores economias do mundo encerrado sexta-feira em Seul deixou claro os limites do G-20 e o conflito entre o esforço de coordenação global e os interesses nacionais defendidos por cada um dos integrantes do grupo. Os dois pesos-pesados, Estados Unidos e China, se enfrentaram nas negociações, mas cederam pouco ou quase nada diante do apelo para que mudem políticas domésticas que têm impacto sobre o restante do mundo.

O diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Dominique Strauss-Kahn, avalia que o agravamento das divergências internas é o resultado da mudança das circunstâncias em que o G-20 atua.

Quando o grupo de líderes se reuniu pela primeira vez há dois anos, havia necessidade de enfrentamento do furacão financeiro que se abatia sobre o mundo e todos concordaram em combater o protecionismo e estimular suas economias.

Agora, o G-20 caminha para uma fase "pós-crise", diz Strauss-Kahn, na qual os interesses nacionais podem se sobrepor à coordenação global.

"Na primeira fase, a cooperação, que é o objetivo do G-20, era mandatória. Na segunda fase, que se inicia agora, a cooperação é voluntária." O presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu em seu discurso no G-20 a necessidade de que os países do grupo levem em conta o impacto de suas políticas macroeconômicas sobre as demais nações do mundo antes de adotá-las.

"Qualquer decisão que a Argentina tomar ou que o Brasil tomar terá efeitos imediatos nos países vizinhos. Agora imaginem potências econômicas como a União Europeia, os Estados Unidos, a China ou a Índia tomando posições unilaterais sem levar em conta a repercussão no restante do mundo." O discurso foi uma reação à decisão dos Estados Unidos de injetar US$ 600 bilhões na economia nos próximos oito meses, o que aumentará a quantidade de dinheiro em circulação no mundo e os fluxos de capitais para países emergentes, como o Brasil. O resultado é a valorização do real e a redução da competitividade das exportações.

Mas ele também pode ser aplicado à China, principal parceira comercial do Brasil, que há anos resiste a pressões internacionais para que aprecie o valor de sua moeda.

Guerra cambial. As duas maiores economias são os principais atores da guerra cambial que ameaça se abater sobre o mundo. Ao despejar dinheiro no mercado, os norte-americanos provocam a desvalorização do dólar e, por tabela, estimulam suas exportações.

Se o dólar se deprecia, outras moedas devem necessariamente se apreciar. Como os chineses intervêm pesadamente para impedir que o yuan se valorize, o peso do ajuste recai sobre as outras moedas, especialmente a de países como o Brasil, que têm câmbio flutuante e conta de capitais aberta.

A dificuldade de obtenção de consenso é agravada pelo fato de que os países ricos estão tendo mais dificuldade para sair da crise do que os emergentes. Com desemprego alto e economia estagnada, seus dirigentes acabam tomando medidas que levam em conta os interesses de seus eleitores e não o impacto que elas podem ter sobre as demais nações.

O risco é que isso se transforme em um "salve-se quem puder", cenário no qual se encaixa a guerra cambial, uma espécie de corrida por desvalorizações de moedas que acaba se transformando em uma guerra comercial, com impacto devastador sobre o comércio.

John Kirton, co-diretor do G-20 Research Group, com sede em Toronto, no Canadá, acredita que o mundo não está nem perto de uma guerra cambial e acha que o ministro da Fazenda do Brasil, Guido Mantega, exagerou ao levantar o assunto.

Em sua avaliação, a cúpula de Seul avançou em vários pontos, entre os quais no desenho de um mecanismo para a análise dos desequilíbrios da economia mundial.
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