terça-feira, 2 de novembro de 2010

O otimismo que vem de Nagoya



Desejado por todos, mas considerado praticamente impossível de ser alcançado ao longo de arrastadas negociações que exigiam a concordância dos 193 países ali representados, o acordo a que se chegou na cidade de Nagoya, no Japão, para a conservação e o uso sustentável da biodiversidade, embora limitado, renova as esperanças sobre "a capacidade do ser humano de tomar decisões coletivas para sua própria sobrevivência" - como resumiu o enviado especial do Estado à décima Conferência das Partes (COP-10) da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), Herton Escobar.

Desde antes de seu início, temia-se que a COP-10 repetisse a Conferência sobre o Clima realizada em Copenhague, em dezembro de 2009 - como a Conferência sobre a Biodiversidade, também esta é patrocinada pela ONU -, que terminou sem nenhum entendimento entre os países ricos e os em desenvolvimento[ ]. Mais um fracasso, agora em Nagoya, [/ ]seria um péssimo sinal para a próxima reunião sobre o clima, que se realizará neste mês na cidade mexicana de Cancún.

Pior ainda, um mau resultado em Nagoya poderia ser interpretado como a prova da incapacidade das duas organizações criadas no âmbito da ONU durante a Conferência do Rio de Janeiro de 1992 (Rio-92) para assegurar um meio ambiente adequado às gerações futuras - a CDB, sobre biodiversidade, e a Convenção sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês) - de cumprir seu papel, ou seja, de sua inutilidade.

A ameaça do fracasso rondou a reunião de Nagoya praticamente todo o tempo e só foi afastada com a decisão de prolongar a sessão final até que se alcançasse um entendimento mínimo. Para o avanço das negociações, foi fundamental o empenho das delegações de alguns países e regiões, como o Japão, país anfitrião; o Brasil, pela disposição de negociar; a União Europeia, pela flexibilidade nas discussões; e alguns países africanos. "Foi uma vitória do multilateralismo", disse ao Estado o embaixador Luis Alberto Figueiredo Machado, principal negociador brasileiro nas duas convenções da ONU.

As medidas, aprovadas por consenso, referem-se a três temas principais: um protocolo sobre acesso e repartição de benefícios dos recursos genéticos da biodiversidade (ABS, na sigla em inglês); um plano estratégico para o período 2011-2020, com metas mais ambiciosas para a redução da perda de biodiversidade no período; e o compromisso dos países desenvolvidos sobre doações para financiar ações de preservação da biodiversidade.

A questão do acesso e repartição dos benefícios era a mais difícil. O Protocolo de Nagoya - como as decisões da COP-10 serão conhecidas doravante - estabelece que os países têm soberania sobre os recursos genéticos de sua biodiversidade e que o acesso a essa biodiversidade só poderá ser feito com o consentimento desses países. Além disso, caso o acesso resulte na elaboração de um produto, os lucros de sua produção e comercialização serão obrigatoriamente compartilhados com o país de origem.

No plano estratégico, um ponto positivo foi a inclusão do valor da biodiversidade nas contas públicas dos países e a redução dos subsídios destinados a atividades consideradas prejudiciais à biodiversidade. Quanto à porcentagem dos territórios a serem conservados, o resultado foi a ampliação das áreas terrestres de 10% (que deveria ter sido alcançada até 2010) para 17% até 2020, e a manutenção em 10% das áreas marinhas. É menos do que a meta de 20%, para áreas terrestres e marinhas, defendida por organizações de defesa do meio ambiente, mas é um avanço.

Ao contrário das decisões da Conferência sobre o Clima, que têm efeito vinculante (com força jurídica), o que torna mais difícil a sua aprovação, as da Conferência sobre Biodiversidade não têm força de lei. Mas o Protocolo de Nagoya cria uma obrigação política para os governos dos 193 países que participam da Convenção sobre Diversidade Biológica e estabelece balizas para a elaboração de políticas públicas. Cabe agora aos governos e aos cidadãos trabalhar para que ele seja cumprido. 
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