EDITORIAL
ZERO HORA (RS)
De acordo com a Constituição Federal, a prerrogativa de nomear e exonerar ministros de Estado é exclusiva do presidente da República. Nada mais falso, portanto, do que responsabilizar a mídia pela queda de integrantes do primeiro escalão, com o evidente propósito de transformá-los em vítimas de supostas conspirações.
Se já é constrangedor para o país assistir à demissão de um ministro a cada mês, a maioria por protagonismo em malfeitorias ou tolerância com irregularidades nas suas áreas de atuação, mais chocante ainda têm sido as cerimônias de substituição transformadas em atos de desagravo. Até se compreende que subalternos e correligionários do político demissionário se mantenham solidários a ele, fechando os olhos para os motivos que provocaram seu afastamento, mas é desconcertante quando integrantes do governo e, às vezes, a própria presidente da República participam do coro de aplausos, elogios e louvações ao demitido. Em tais ocasiões, os cidadãos ficam se perguntando: se o homem era tão íntegro e competente, por que está sendo afastado?
De acordo com a Constituição Federal, a prerrogativa de nomear e exonerar ministros de Estado é exclusiva do presidente da República. Nada mais falso, portanto, do que responsabilizar a mídia pela queda de integrantes do primeiro escalão, com o evidente propósito de transformá-los em vítimas de supostas conspirações. A imprensa brasileira tem, sim, participado diretamente do processo de depuração da máquina pública, por meio de investigações jornalísticas e de denúncias. Faz o papel que lhe cabe numa democracia. Infelizmente, como se pôde constatar em cada uma das últimas demissões, os órgãos fiscalizadores e o próprio governo só agiram depois do alerta dos veículos de comunicação.
Foi, por exemplo, o que ocorreu em junho, quando o ministro Antonio Palocci foi afastado da chefia da Casa Civil por não conseguir explicar o aumento desmesurado de seu patrimônio. Na cerimônia de transferência de cargo para a senadora Gleisi Hoffmann, ele foi aplaudido de pé pelos presentes e chamado de amigo pela presidente Dilma Rousseff, em discurso emocionado. Alfredo Nascimento, demitido em julho por conivência com um esquema de cobrança de propina na pasta dos Transportes, não recebeu elogios, mas reassumiu sua cadeira no Senado e a presidência do PR, um dos partidos integrantes da coligação que sustenta o governo. Em agosto, dois ministros deixaram os cargos: Nelson Jobim, da Defesa, por declarações polêmicas sobre integrantes do governo, e Wagner Rossi, da Agricultura, por relações espúrias com lobistas e suspeita de tráfico de influência. Ambos saíram sem aplausos.
O quinto ministro a deixar o governo foi Pedro Novais, do Turismo, que já colecionava um histórico de irregularidades em sua vida parlamentar e levou para o ministério práticas incompatíveis com a probidade que a presidente exige de seus assessores. A presidente aceitou aliviada e silenciosa sua demissão em setembro, mas mostrou-se pouco conformada com a saída de Orlando Silva, do Esporte, no mês passado. A posse de Aldo Rebelo, também do PC do B, transformou-se novamente num ato de desagravo ao afastado, que foi fartamente elogiado pela presidente. Refém do processo de alianças que sustenta o governo, a chefe do Poder Executivo muitas vezes hesita em afastar assessores diretos que lhe foram impostos pelos partidos da coligação, razão da demorada decisão sobre o pedetista Carlos Lupi, enrolado em contradições.
Não é de estranhar, portanto, que políticos inconformados com a fiscalização da imprensa e com o inequívoco repúdio da opinião pública à corrupção tenham desengavetado, mais uma vez, a surrada tese do linchamento moral e da execração pública. No mínimo, subestimam a autonomia e a integridade da presidente da República. E desconsideram um valor ainda mais alto, que é o apreço do povo brasileiro pela honestidade de seus representantes.
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