sábado, 4 de setembro de 2010

China - demografia, emprego e salário

Uma reportagem muito esclarecedora sobre a China e os desafios daquela economia que irão interferir em nossa vida nos próximos anos.
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China - demografia, emprego e salário

Autor(es): José Pastore
O Estado de S. Paulo - 31/08/2010
 As notícias que chegam da China dão conta de fortes aumentos salariais. O que será do futuro?
A configuração do mercado de trabalho chinês depende muito da dinâmica demográfica, da migração e da produção mais intensiva em capital. As estatísticas da China são precárias. Mas encontrei dados um pouco mais sólidos num trabalho escrito por chineses (Cai Fang, The China Population and Labor Yearbook, Chinese Academy of Social Sciences, Pequim, 2010).

A taxa de fertilidade está caindo. É de 1,7 filho por mulher. Cerca de 55% das famílias estão no regime de apenas um filho. Em 2030, a população vai se estabilizar em 1,440 bilhão de habitantes. O peso dos idosos será maior e o dos jovens, menor.

As empresas nas cidades sempre contaram com enormes avalanches de migrantes da zona rural. Para ser legal, a migração deve ser autorizada pelo governo ("hukou"). Mas há mais de 200 milhões de migrantes ilegais, na maioria jovens de 16 a 35 anos, solteiros e que ainda aceitam trabalhar 29 dias por mês e com salários bem mais baixos do que os residentes locais. Cerca de 50% dos empregos urbanos são ocupados por esses migrantes.

Mas isso está mudando. Dos que moram na zona rural, cerca de 70% trabalham nos grandes projetos de infraestrutura patrocinados pelo governo no interior do país. A migração para as grandes cidades está arrefecendo. Diminuindo os jovens e os migrantes, diminuirão também os excedentes de mão de obra. As empresas industriais já estão sendo pressionadas a elevar substancialmente os salários de seus empregados.

A guinada da produção em direção a produtos mais intensivos em capital trará mudanças na demanda de pessoal e de recursos naturais. No tempo da produção intensiva em mão de obra, cada 1% de crescimento do PIB gerava 960 mil empregos. Com o início da produção mais intensiva em capital, o mesmo 1% está gerando 880 mil postos de trabalho. Nos próximos 20 anos vai gerar menos. E as exigências de qualificação serão maiores. Há solução para isso?

Os dados do citado livro mostram que 76% dos trabalhadores locais urbanos frequentaram o curso médio ou mais. Entre os migrantes, a proporção é de apenas 23%. Mas nos dois casos está havendo um treinamento maciço com vistas às novas necessidades da indústria.

No campo dos recursos naturais, aumenta a cada dia a demanda por carvão, eletricidade, petróleo, minérios, metais e outros insumos que são raros na China. O que dizer?

Também nesse campo a China tomou providências. O país está buscando esses recursos nos países em que são abundantes, em especial os da África e da América Latina, inclusive o Brasil. O excesso de dólares está sendo trocado por insumos estratégicos.

Como se vê, o país tem grandes desafios pela frente. Mas nada disso ameaça abalar severamente a competitividade da China. No campo dos salários, por mais que subam, as diferenças em relação aos países desenvolvidos e em desenvolvimento continuarão grandes. Vale lembrar que os operários chineses depois das greves recentes passaram a ganhar o equivalente a US$ 300 ou US$ 400 por mês (em média), enquanto no Japão, nos Estados Unidos e na União Europeia ganham mais de US$ 3 mil e nos países em desenvolvimento, US$ 800 (em média).

Um desafio que está sem solução à vista é o da previdência social. Entre os trabalhadores locais urbanos, pouco mais de 50% estão protegidos por aposentadoria, seguro-saúde e seguro-desemprego. Entre os migrantes, zero. Mas todos os trabalhadores (rurais e urbanos) começam a pressionar por uma cobertura universal. Isso custará caro e afetará os preços relativos.

Conclui-se assim que, em breve, desaparecerão os excedentes de mão de obra, os salários aumentarão, mas a China continuará sendo a fábrica do mundo, desafiando as indústrias de muitos países, inclusive as do Brasil.
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