O enorme apoio ao governo Lula vem, sobretudo, dos resultados das políticas sociais. O apoio é tão generalizado (mais de 80% e apenas 3% de rejeição) que fica difícil distinguir diferenças por nível de renda ou de escolaridade. Mas o resultado eleitoral permite ver como os setores de apoio mais firmes — os que deram inequivocamente a vitória a Dilma — foram os de menor nível de renda. Visível também porque foram os apoios amplamente majoritários nas regiões com peso predominante dos pobres — como o Norte e o Nordeste.
Uma das questões que se coloca é saber a que se deve a diferença entre o índice de apoio ao governo e a votação de Dilma. Claro que o apoio ao governo tem matizes — do ótimo ao regular — e estes refletem disposição de transferência do voto a Dilma ou apenas anuência diante das relações inegáveis do governo Lula.
Mas foi possível perceber que, colocada diante da comparação entre os governos Cardoso e Lula — ou diante da percepção do que viveu nos anos 90 e do que passou a viver na primeira década deste século —, uma grande maioria de brasileiros opta pela continuidade e aprofundamento do governo Lula com Dilma. Foi diante dessa barreira que o candidato tucano buscou um atalho — desviar o debate dessa comparação política para um tema como o aborto e seus desdobramentos religiosos, no circuito das igrejas.
Essa operação teve efeitos eleitorais, porque uma parte dos beneficiários das políticas sociais opta claramente pela continuação do governo Lula, representado por Dilma, mas foi vítima dos preconceitos explorados por religiosos.
Podemos dizer que o governo encontrou o modelo econômico social, que o Brasil precisa para retomar o desenvolvimento e, ao mesmo tempo, distribuir renda. Adequações são necessárias e já começaram a ser feitas ainda no governo Lula, para superar os efeitos negativos da taxa de juros alta e da valorização artificial do real. As políticas sociais terão não apenas que ser intensificadas, mas diversificadas e ampliadas, porém, seu norte básico já está dado.
A oposição já demonstrou que não tem modelo alternativo. Oscilou entre reivindicar o atual como seu ou fazer críticas marginais. Entra agora em grande crise de identidade, com um polo assumidamente direitista, que pretende personificar o neoliberalismo duro e puro, do Estado mínimo e do reino do mercado. Esse polo se isolará cada vez mais, sem capacidade de incorporar políticas sociais e de conquistar bases populares de apoio, ficando restrito a setores ideológicos da classe média e grupos ruralistas. Já os tucanos ficam sem identidade, passarão por um longo processo de brigas internas, do qual não sairão tão cedo e marcados por muitas feridas.
A principal disputa na sociedade se dará no plano dos valores, da cultura, da luta ideológica. Porque a complexidade e o desenvolvimento desigual das relações sociais e também ideológicas fazem com que as pessoas comecem a tomar consciência social do mundo a partir de circunstâncias concretas. Sentem a melhoria das suas condições de vida, se dão conta de que nunca tinham sido contempladas pelos governos anteriores. Mas continuam, em outros planos, a ser vítimas de preconceitos, disseminados pela imprensa, por religiosos conservadores. Para que superem essa alienação, para que tomem consciência não apenas dos seus interesses imediatos, mas também de como funciona a sociedade, o poder, a imprensa, as igrejas conservadores, entre tantos outros fenômenos, torna-se indispensável uma consciência social ampla.
A democratização econômica e social extraordinária que o Brasil passou a viver nos últimos anos precisa se estender ao plano da consciência, da organização popular e da construção de novos representantes políticos das camadas emergentes do povo brasileiro.
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