quinta-feira, 14 de julho de 2011

Os tubarões chegam ao Tibre


CLÓVIS ROSSI
FOLHA DE SP


A chamada "segunda-feira negra" nos mercados é como escreveu para o jornal italiano "La Repubblica" o colunista Massimo Giannini: as polêmicas na Europa em torno da ajuda à Grécia são um ato "irracional e irresponsável, equivalente a espalhar sangue no mar de um mercado infestado pelos tubarões da especulação".

Que os tubarões tenham chegado ao Tibre, o rio que banha Roma, não surpreende, mas tampouco se justifica. Não surpreende porque a Itália tem uma dívida imensa, das maiores do mundo, equivalente a 120% de sua economia.

É maior que a de Portugal (93%) ou a da Irlanda (96,2%), dois dos três países já colocados na UTI da Europa, ou seja, socorridos por pacotes que impediram a quebra.

Mas não se justifica, entre outras razões, porque é um dado antigo, que até melhorou de 2010 para 2011 (a dívida retrocedeu para 119% do PIB). Ou seja, não há, nesse campo, novidade alguma acontecida de quinta para sexta-feira passadas, quando os tubarões começaram a navegar no Tibre.

Além disso, o deficit italiano é relativamente baixo, cerca de 4%, inferior aos 4,3% da média do euro. É verdade que o premiê Silvio Berlusconi jogou algumas gotas de sangue na água já turva ao criticar publicamente seu ministro Giulio Tremonti(Economia), tido, nos mercados, como garante da austeridade.

Mas, desta vez, a crítica do usualmente tresloucado Berlusconi tinha um fundo de realismo político: queixou-se de que Tremonti, ao propor pacote de austeridade de imponentes € 48 bilhões (R$ 106 bilhões), não levou em conta que austeridade não dá votos. Aliás, não dá em lugar nenhum: acaba de sair pesquisa no Reino Unido que mostra que caiu de 69% para 55% a porcentagem de britânicos que acham que austeridade é bom para sanear a economia.

Com esse dado em mente, podemos voltar à Grécia e às hesitações europeias: a pressão do público contra a austeridade leva crescente número de dirigentes europeus a defender a tese de que é preciso aliviar a pressão dos mercados sobre a Grécia, o que significa que qualquer socorro a Atenas tem que incluir a participação substancial do setor privado (leia-se: sistema financeiro).

É sintomático que o "Financial Times" tenha anunciado ontem que "líderes europeus estão, pela primeira vez, preparados para aceitar que Atenas deveria não pagar alguns de seus títulos como parte de um novo plano de ajuda que poria os níveis globais da dívida em um patamar sustentável".

O problema é que nem todos os líderes concordam. O Banco Central Europeu, em particular, é contra. Fica, então, esse ambiente de hesitações e adiamentos no qual os tubarões nadam de braçada.

A contrapartida desse apetite é a crescente disposição -por enquanto apenas verbal- de autoridades europeias de tentar pôr limites aos predadores.

Ontem, foi a vez de Michel Barnier, comissário europeu para o Mercado Interno, sugerir que as agências de risco não deveriam ter poderes para classificar a dívida de países já colocados na UTI europeia. No mínimo, diminuiria a quantidade de sangue a atrair tubarões.
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