ANTONIO C. PANNUNZIO
O Estado de S.Paulo
Entre as previsões que pululam nessa transição de calendário, a que mais chama a atenção é a advertência da diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI). Segundo Christine Lagarde, a severidade da crise e a dificuldade que os europeus têm para geri-la criarão uma onda que atingirá todas as economias do mundo.
Se a principal autoridade da economia mundial não esconde o que espera para 2012, relatório divulgado pela Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal) esboça cenários pouco confortáveis para o panorama social da região na esteira dos efeitos da turbulência internacional.
O receio inicial é de que fluam para o ralo os avanços na distribuição de renda proporcionados pela implementação de programas sociais, conforme registra o estudo realizado em 17 países pela Cepal, que também constatou recuo na taxa de pobreza. A questão, entretanto, é que esses números são paliativos, não resolvem os graves problemas estruturais desses países, que convivem com riscos cotidianos de exclusão e índices educacionais sofríveis.
Mudar esses parâmetros tem sido um desafio desde sempre e já era tema de Eduardo Galeano em seu livro As veias abertas da América Latina, publicado há quatro décadas. Se o incremento das políticas públicas sociais depende diretamente do processo de evolução da economia, é preciso que os governantes prestem atenção aos temores dos arautos globais e ponham suas barbas de molho.
As projeções de especialistas e organismos internacionais também fazem coro ao pessimismo generalizado em relação à crise do euro e suas consequências para o resto do mundo. O balanço das economias da América Latina e Caribe, divulgado pela Cepal, sinaliza crescimento menor para a região do que o registrado em 2011.
É nesse contexto que a advertência da diretora do FMI suscita a expectativa de que uma nova espiral negativa na economia mundial será potencialmente muito maior do que a simples "marolinha" de 2008 e não irá fazer distinção entre países ricos, emergentes e pobres. Naquele ano, é bom lembrar, os países da América Latina fizeram costuras políticas regionais que blindaram a região da hecatombe, que, como se viu, impactou as economias da União Europeia.
A recessão anunciada desde então, e agora realidade, deverá obrigar os governos da América Latina a posturas mais ousadas em relação à circulação do dinheiro. Em 2011, os sinais mais visíveis da crise na Europa e nos Estados Unidos foram o crescimento do desemprego e o corte de gastos públicos, contrapondo-se à queda nas taxas de pobreza e desigualdade registradas na América Latina e no Caribe.
Diante disso, como desenvolver programas sociais que reduzam contrastes tão evidentes, se os próprios gestores das políticas públicas são claudicantes na administração de verbas como as que são destinadas ao combate e prevenção de desastres naturais - aqui, no Brasil, só agora liberadas depois de todo o caos e tantas vítimas? E o que dizer do caso de desvio dos repasses às ONGs? Nesse caso, "há males que vêm para o bem": elas acabam de ser bafejadas com mais R$ 1 bilhão no Orçamento de 2012.
O Brasil e demais países da América Latina precisam, primeiro, fazer a lição de casa se quiserem que a região venha efetivamente a fazer parte da solução para a crise mundial, como propagam arautos do otimismo. O fato de o País ter assumido a posição de sexta economia no ranking mundial não pode ser visto como panaceia. É uma boa notícia, mas que tem o seu avesso quando se sabe que ao Brasil caberá papel preponderante como interlocutor dos emergentes e do Terceiro Mundo.
Seja como for, o futuro da economia latino-americana é uma incógnita, mesmo que se leve em conta a perspectiva otimista de que a China - cujo PIB deverá ultrapassar o dos EUA nessa década - continuará sendo o fiel da balança comercial da região, como preveem especialistas, entre eles o Nobel de Economia Joseph Stiglitz.
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