MIRIAM LEITÃO
O GLOBO
Em cada litro de Etanol, incidem R$0,46 de PIS/Cofins. Na gasolina, são R$0,26. Deve ser o único caso de país que incentiva o combustível fóssil e pune o que emite menos gases de efeito estufa. Recentemente, o governo reduziu a Cide sobre a gasolina. A Petrobras paga mais pela gasolina importada do que cobra das distribuidoras. São muitas as distorções no mercado de combustíveis.
O Brasil lutou por 30 anos para derrubar as barreiras que impediam o Etanol brasileiro de entrar no mercado americano. E agora que caíram as sobretaxas o Brasil está importando Etanol dos Estados Unidos. O presidente da ETH Bioenergia, José Carlos Grubisich, disse que o Brasil comprou um bilhão de barris de Etanol na safra 2011/2012, mas exportou 1,5 bilhão de litros. Vende produto mais nobre, como álcool para bebidas e alimentos, e compra álcool anidro para a mistura na gasolina. Mesmo assim, é incrível que um país que investiu por décadas para ser o grande fornecedor desse combustível, alternativo à gasolina, esteja agora importando os dois produtos.
O que o consumidor que comprou carro flex quer saber é quando haverá álcool a um preço competitivo nas bombas. E talvez isso não aconteça tão cedo.
Ismael Perina Júnior, presidente da Organização dos Plantadores de Cana-de-Açúcar do Centro Sul do Brasil, a Orplana, admite que vai demorar um pouco, porque há falta de matéria-prima:
- Não houve renovação dos canaviais nos últimos anos e portanto o Brasil não conseguirá elevar a produção de uma hora para outra. A regularização vai demorar ainda um pouco.
O BNDES anunciou um programa de R$4 bilhões em empréstimos para a renovação dos canaviais. Sem isso, não adiantaria muito continuar financiando a indústria. Como disse Grubisich, o Brasil hoje não está com problema de demanda, mas sim de oferta:
- Existe uma demanda potencial para 35 bilhões de litros no Brasil, o país já chegou a produzir 27 bilhões e hoje só produz 20 bilhões. Mas, quando em 2020 olharmos para trás, vamos considerar este momento como um incidente histórico, porque nós dominamos todo o ciclo de produção de álcool de cana-de-açúcar e seremos sempre grandes produtores.
Ouvi Perina e Grubisich na Globonews e os dois disseram que tanto para produtores de cana quanto para a indústria de álcool a conjuntura é desfavorável. Nos últimos três anos, houve seca, geada e crise financeira internacional atingindo a produção. A crise pegou vários investimentos na sua fase inicial, e o colapso do crédito impediu que os projetos fossem adiante. Hoje, há um parque instalado de processamento da cana maior do que a capacidade do país de produzir cana.
Só isso já seria o suficiente para elevar o preço do Etanol. Mas, além disso, o produto ficou relativamente mais caro por outras distorções. Apesar de o consumidor sentir o peso no bolso na hora de abastecer, a Petrobras vive a estranha situação de ter prejuízo na venda da gasolina importada. Só de janeiro a novembro do ano passado, segundo o consultor Adriano Pires, essa diferença custou R$460 milhões à empresa. Isso acontece porque o governo não admite mexer no preço. Para evitar que o preço da gasolina suba, impactando a inflação, os impostos foram reduzidos, aumentando as distorções.
- A volatilidade de preço é horrível para todo mundo. O governo precisa corrigir a aberração que é o combustível fóssil ser menos taxado que o produto mais sustentável - disse Perina.
Grubisich acha que as decisões já tomadas pelo governo, reduzindo impostos sobre a gasolina para evitar o reajuste do preço ao consumidor, provocaram várias assimetrias:
- Um fato concreto: a gasolina no mercado internacional tem preço mais alto do que a Petrobras vende às distribuidoras. A empresa perde ou deixa de ganhar R$0,12 por litro. Isso acaba tendo efeito no mercado do Etanol, pela regrinha mágica de que o biocombustível tem que ter um preço até 70% da gasolina para valer a pena a escolha.
A solução, na opinião dos empresários, é desonerar o Etanol, tanto de PIS/Cofins quanto de ICMS. E o governo financiar um novo ciclo de investimento.
Evidentemente, não basta dinheiro subsidiado e renúncia fiscal. É necessário ter uma política com uma visão mais ampla desse problema. O passo dado pelo BNDES mostra que o banco sabe que não adiantaria financiar só a indústria, que já tem capacidade ociosa, sem ver que o gargalo está na renovação dos canaviais. Não adianta apostar tudo em cana-de-açúcar sem pensar na segunda geração do Etanol, o celulósico, e há notícias de que o BNDES pretende também financiar pesquisas nessa área.
Mas, se a indústria do álcool for incentivada através de redução de impostos ou empréstimos de bancos públicos, que se cobre do setor compromisso com novas atitudes na área ambiental e social. O setor de açúcar e álcool tem um lado moderno e um arcaico, como se sabe há 500 anos. Só pode se apresentar como o substituto sustentável ao produto fóssil se for de fato sustentável.
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