segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Autonomia não é desmando



O Globo 


A universidade pública é uma ilha de excelência na Educação superior brasileira. Nesta rede, estão as escolas mais qualificadas e os professores mais bem preparados do país, aqui comparecendo as faculdades privadas com honrosas exceções.

Se isso é inquestionável em relação à Universidade no contexto nacional, também é fora de questão que, mirando os rankings internacionais, as instituições brasileiras, públicas ou privadas, aparecem fora do foco onde se concentram os mais respeitáveis centros de produção do saber do planeta. Um indicador dá a medida dessa indigência: a USP, a nossa mais bem colocada na lista do Times Higher Education (THE), lá aparece num modesto 178º lugar. É muito pouco para a Educação do país.

Dados como este passam ao largo das entidades que mobilizam parte dos professores das universidades federais numa greve que já entra em seu terceiro mês (esta semana, oito delas devem voltar ao trabalho). Tanto quanto lutar por salários, e professores (de todos os níveis da Educação) precisam mesmo ser bem remunerados, é tarefa estratégica mudar os parâmetros de ensino acadêmico do país. Isso, de modo a não só melhorar sua participação nos rankings internacionais (o que não é um fim em si, naturalmente), mas aperfeiçoar seu próprio perfil em benefício das ciências no Brasil. Dar este passo implica comprometimento do corpo docente com a conquista de objetivos educacionais de longo prazo para o campus. A atual greve, que reivindica melhorias corporativas, sequer tangencia este tema.

Também passam longe das preocupações do comando grevista os prejuízos que a paralisação causa à sociedade em geral, e aos estudantes em particular. Interromper por três meses atividades comprometidas com um calendário rígido é caminho certo para o sacrifício do ano letivo. O corpo discente tem um currículo a cumprir, e, para isso, precisa ter os docentes ensinando nas salas. Ademais, pela experiência de outras greves, e por mais que com isso se comprometam os docentes parados, a reposição das aulas perdidas com certeza entrará nas negociações e delas sairá embalada em promessas para acabar como peça de ficção.

E, se neste aspecto do problema, os docentes combatem com o argumento da autonomia universitária, em si um princípio correto, deve-se ter claro que tal pressuposto não é um cheque em branco para desmandos. A sociedade, que paga os salários dos grevistas, tem o direito de cobrar responsabilidade na aplicação dessa prerrogativa.

A greve, que se beneficia de prerrogativas do funcionalismo público (a estabilidade que garante o emprego de quem deixa de trabalhar) e da costumeira leniência do governo - não à toa outras categorias de servidores também estão paradas -, revelou seu caráter explicitamente afrontoso quando os dirigentes sindicais rejeitaram uma proposta de aumentos salariais baseada num critério claro, a meritocracia, sempre rejeitada pelo sindicalismo estatal. A paralisação avançou sobre direitos alheios como imposição unilateral de uma categoria sobre toda a comunidade acadêmica.
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