Fabio Giambiagi
Valor Econômico
"2022". É esse o título do livro que organizamos em conjunto com Cláudio Porto e que foi recentemente lançado pela editora Campus. Nele, convidamos um conjunto de especialistas a fazer uma reflexão acerca de que perfil de país podemos aspirar a ter quando o país estiver fazendo 200 anos como nação independente. Há um tom de cauteloso (e potencial) otimismo que se depreende da leitura da maioria dos capítulos.
Na apresentação do livro, citamos o escritor Laurentino Gomes que, no seu livro "1822" (Editora Nova Fronteira, 2010), chama a atenção para o fato de que "no ano de sua Independência, o Brasil tinha, de fato, tudo para dar errado... Era uma população pobre e carente de tudo, que vivia... em uma economia agrária e rudimentar, dominada pelo latifúndio e pelo tráfico negreiro... O analfabetismo era geral... As perspectivas de fracasso, portanto, pareciam bem maiores que as de sucesso... (No entanto) o Brasil conseguiu manter a integridade do seu território e se firmar como Nação independente..." (páginas 17/18).
Destacamos que isso é uma demonstração de que o futuro não é um prolongamento predeterminado pelo passado e pelas condições vigentes. Ao contrário, ele pode ser construído. Boas políticas podem ensejar um futuro promissor - e políticas inadequadas têm consequências negativas.
O país desponta hoje como uma das principais nações emergentes do século XXI, em função de transformações positivas ocorridas ao longo de muitos anos. No livro, citamos algumas delas, parte das quais remonta a épocas bastante distantes no tempo:
1) A consolidação da democracia nos últimos 25 anos;
2) Um conjunto de avanços institucionais próprios de uma economia e de um país maduro, como a respeitabilidade adquirida pelo Banco Central (BC) ou a eficiência da urna eletrônica;
3) A modernização do país em consequência da abertura econômica nos anos 90;
4) A estabilização da economia;
5) O ajuste fiscal posterior a 1999, com destaque para a Lei de Responsabilidade Fiscal; e
6) Os avanços sociais observados desde as primeiras tentativas de inclusão social com os programas pioneiros para o meio rural ainda nos anos 70, até as conquistas mais recentes.
Ao mesmo tempo, as carências e os desafios que o país tem pela frente são maiúsculos. Entre eles, podem ser mencionados o baixo investimento; a existência de uma taxa de inflação ainda elevada; os indicadores educacionais insatisfatórios; a alta proporção de pessoas pobres e extremamente pobres; as deficiências da infraestrutura; a degradação do meio ambiente etc. Todos esses são temas tratados no livro.
Estando a pouco mais de 10 anos de 2022, há tempo suficiente para fazer intervenções que modifiquem as características do país até essa data. Uma década é tempo suficiente para que certas políticas amadureçam e apresentem resultados. Para isso, porém, é preciso evitar que o país se deixe ofuscar pelo imediatismo e ter a dimensão precisa do significado da frase do ex-ministro Célio Borja citada como uma das epígrafes do livro ("O homem de Estado antevê os tempos futuros. Não planta couves; planta carvalhos"), complementada por outra sábia frase também citada em epígrafe, esta de Georges Clemenceau, advertindo os argentinos entusiasmados pela situação do país nas primeiras décadas do século XX ("O êxito costuma perder as nações imaturas"). O Brasil precisa "plantar carvalhos" e não se deixar "perder pela imaturidade".
O livro está dividido em três partes. A primeira trata do que se poderia denominar de "macroeconomia do crescimento". A segunda constitui o resultado do esforço de identificar metas para os próximos anos para diversas questões da vida nacional, incluindo a inflação, a inserção externa do país, a Previdência Social, a política fiscal, o setor de energia elétrica, a infraestrutura em geral, o ataque à pobreza e à extrema pobreza, a educação e o meio ambiente. Por último, a terceira parte é uma tentativa de pensar alguns temas que dizem respeito à sociedade e que transcendem as fronteiras estreitas da economia, envolvendo elementos territoriais, culturais etc.
Na parte "quantificável" das propostas resultantes da reflexão feita, pode-se chegar às seguintes metas que sintetizam os objetivos que o país poderia perseguir até 2022, em termos macroeconômicos, em um contexto de crescimento médio da economia de 4,5% ao ano:
*Inflação 2022: 3% (2010: 6%)
*Taxa de investimento em 2022: 24% do PIB (2010: 18%)
*Poupança doméstica em 2022: 23% do PIB (2010: 17%)
*Proporção de pobres em 2022: 5% (estimativa 2010: 22%)
*Proporção de extremamente pobres em 2002: 0% (estimativa 2010: 8%)
Se o país conseguir atingir alguns alvos ligados a esse esforço, terá feito avanços importantes em relação à situação atual. Esperamos, com o livro, dar nossa modesta contribuição para a necessária reflexão acerca de que caminho trilhar nos próximos anos.
Fabio Giambiagi, economista, co-organizador do livro "Economia Brasileira Contemporânea: 1945/2004" (Editora Campus), escreve mensalmente às segundas-feiras.
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