Mauro Zanatta | De Brasília
Valor Econômico
Apontada como sucessora da soja no papel de vilã do desmatamento na Amazônia, a pecuária nacional começa a reunir argumentos em defesa de sua reabilitação. Um inédito levantamento realizado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) calcula que os recentes ganhos de produtividade da pecuária brasileira "pouparam" uma área superior ao território de 420 milhões de hectares de todo o bioma Amazônia.
O polêmico estudo, assinado por três dos mais influentes pesquisadores da estatal, estima em 460 milhões de hectares a área "poupada" de desmatamento por causa de mudanças tecnológicas adotadas ao longo das últimas duas décadas. Com base em dados do Censo Agropecuário do IBGE, os pesquisadores Eliseu Alves, Elisio Contini e Geraldo Martha Junior foram mais longe: voltaram a 1950 para apontar um ganho de produtividade total de 79% na pecuária nacional e afirmar que a expansão das áreas de pastagens no país foi responsável por menos de 21% da elevação da produção da atividade. Em 2006, a área da pecuária era de 159 milhões de hectares no país.
"A pecuária não cresce às custas da expansão da área de pastagens sobre a vegetação nativa. É o oposto. A produção aumentou em razão dos ganhos de produtividade", afirma Eliseu Alves, ex-presidente e um dos fundadores da Embrapa. "Sem esses ganhos, uma área maior do que a Amazônia seria necessária para obter a mesma produção", acrescenta.
O maior avanço da produtividade ocorreu, segundo a pesquisa, entre 1996-2006, quando a atividade cresceu ao ritmo de 6,6% ao ano. Nesse período, a área de pastagens recuou 19 milhões de hectares no país. O efeito "poupa-terra" na região Norte chegou, segundo os especialistas, a 70 milhões de hectares.
Na base das mudanças, estão razões como melhoria genética do rebanho via cruzamentos e seleções para criar raças mestiças; investimentos em pastagens melhoradas, sobretudo na gramínea africana braquiária; disseminação do uso de suplementos e sal mineral; ampliação do controle de doenças como febre aftosa, raiva, brucelose e tuberculose por meio de campanhas de vacinação; e crescimento das unidades de confinamento bovino para aumentar velocidade no ganho de peso. "Além disso, houve um aumento na renda do brasileiro e demanda crescente por carne. Os pecuaristas também estão mais capitalizados e preparados", afirma Eliseu Alves.
A pesquisa da Embrapa mostra que o resultado desses fatores foi um sensível aumento no desempenho animal, ou o ganho de peso em equivalente-carcaça por cabeça. A produção saltou de 1,85 milhão de toneladas, em 1970, para 6,89 milhões de toneladas em equivalente-carcaça. Os dados levam em conta 1,08 cabeça por hectare, ganho de peso médio anual de 40 quilos por cabeça e produtividade de 43 kg por hectare por ano.
Os pesquisadores da Embrapa também avaliam o efeito da produtividade na redução dos preços da carne ao consumidor. Em junho do ano passado, esse item significava, segundo as estatísticas do Dieese, somente 30% do valor pago em novembro 1973 pelos habitantes da cidade de São Paulo. "Em 40 anos, essa queda de preços tornou a carne um alimento de elevado valor biológico acessível aos mais pobres", avalia Eliseu Alves.
A evolução da pecuária, atestada por dados oficiais, ajudou a atenuar "pressões inflacionárias" e, pelo efeito-renda e demanda, sobretudo na população de renda mais baixa, "dinamizou" outros setores da economia, aponta o levantamento da Embrapa.
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