quinta-feira, 28 de abril de 2011

O plano quinquenal da China

Martin Feldstein
Valor Econômico 

 O novo plano quinquenal da China tem implicações importantes para a economia mundial. Sua principal característica é mudar a política oficial, passando da busca por maximizar o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) para o aumento do consumo e do padrão de vida do trabalhador médio. Embora essa mudança seja guiada por considerações chinesas domésticas, pode ter impacto significativo nas taxas de juros e fluxos de capitais mundiais.

O alto índice de crescimento do PIB da China nos últimos dez anos, é claro, aumentou a renda real de centenas de milhões de chineses, particularmente, dos que vivem em áreas urbanas ou em suas proximidades. E os fundos que os trabalhadores urbanos enviam a seus parentes que continuam no setor agrícola também ajudaram a elevar seu padrão de vida.

O crescimento do consumo e dos salários reais, no entanto, foi mais lento que o do PIB total da China. Grande parte da renda decorrente do crescimento do PIB foi parar nas grandes estatais, que fortaleceram seu poder de monopólio. E uma parte substancial da produção da China é dirigida ao exterior, com as exportações superando as importações em grau suficiente para criar superávit em conta corrente superior a US$ 350 bilhões no último ano.

A China agora pretende elevar o índice de aumento relativo dos salários reais e encorajar os gastos dos consumidores. Também haverá mais ênfase na expansão do setor de serviços e menos no industrial. As empresas estatais serão forçadas a distribuir mais de seus lucros. O aumento no valor do yuan induzirá as indústrias chinesas a redirecionar sua ênfase, dos mercados exportadores para os mercados domésticos. E o governo gastará mais em habitações para o setor de baixa renda e na expansão dos serviços de assistência médica.

Tudo isso significará uma redução na poupança nacional e o aumento dos gastos das famílias e do governo chinês. A China exibe atualmente o maior índice de poupança do mundo, provavelmente próximo a 50% do PIB, o que é importante tanto local como mundialmente, porque isso impulsiona o superávit em conta corrente do país.

Os países que poupam mais do que investem em equipamentos e estrutura (como é o caso da China) têm a produção adicional para enviar ao exterior como superávit em conta corrente, enquanto os países que investem mais do que poupam (como é o caso dos Estados Unidos) precisam preencher a diferença importando mais do que exportam ao resto do mundo. E um país com superávit em conta corrente tem os fundos para captar e investir no resto do mundo, enquanto um país com déficit em conta corrente precisa financiar seu déficit externo captando do resto do mundo. Mais precisamente, o balanço em conta corrente de um país é exatamente igual à diferença entre sua poupança nacional e seu investimento.

A futura redução da poupança da China significará, portanto, uma redução no superávit em conta corrente da China — e, portanto, em sua capacidade para emprestar aos EUA e outros países. Se a nova ênfase no aumento do consumo encolher a taxa de poupança da China em 5% do PIB, ainda será a maior do mundo. Tal declínio, no entanto, eliminaria completamente seu superávit em conta corrente. Pode não ser assim, mas certamente essa é uma possibilidade até o fim do plano quinquenal.

Se for assim, o impacto nos mercados de capitais mundiais será enorme. Sem superávit em conta corrente, a China deixaria de ser compradora líquida de bônus do governo dos EUA e de outros países. Além disso, se o governo chinês e as empresas chinesas quiserem continuar investindo em recursos petrolíferos e empresas no exterior, a China terá de vender bônus em dólares e outros títulos de dívidas soberanos de sua carteira. O resultado líquido disso seriam taxas de juros maiores para os bônus dos EUA e de outros países.

A alta das taxas de juros também dependerá de como os investimentos e a poupança dos EUA se comportarem ao longo do mesmo período. O índice de poupança das famílias nos EUA aumentou em cerca de 3% do PIB desde 2007. A poupança das empresas também está em alta, mas o aumento no déficit governamental absorveu toda essa economia adicional e mais.

De fato, a única razão para o déficit em conta corrente dos EUA ter sido menor em 2010 do que nos anos anteriores é que o investimento no setor habitacional e em outras construções caiu pesadamente. Se a demanda dos americanos por imóveis residenciais aumentar e as empresas quiserem elevar seus investimentos, o choque entre o menor índice de poupança da China e a permanência de um déficit fiscal elevado nos EUA poderia impulsionar as taxas de juros globais de forma significativa.

Martin Feldstein é professor de Economia em Harvard, foi presidente do Conselho de Assessores Econômicos do ex-presidente dos Estados Unidos Ronald Reagan e presidente do Gabinete Nacional de Análises Econômicas dos EUA. Copyright: Project Syndicate, 2011.
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