FERREIRA GULLAR
O melhor é ficar em terra mesmo. Morrer é o de menos, pior é o pânico que antecede o desastre
SABEM POR QUE deixei de viajar de avião? Porque não quero me estressar. Vejam bem, viajei de avião durante mais de 50 anos e só parei quando causas estressantes atingiram um ponto, para mim, intolerável.
Na verdade, certa noite, vinha de São Paulo, num voo da ponte aérea, quando, ao nos aproximarmos do Rio, o avião sofreu uma queda brusca que pôs em pânico os passageiros. Foi apenas um susto, mas tamanho susto que, quando pousamos, todos, aliviados, aplaudimos o milagre. E eu, ao atravessar a pista e ver uma fila de infelizes que esperavam para embarcar, dei graças aos céus por não estar entre eles.
Mas, dali a um mês, estava de novo dentro de um avião, na mesma ponte aérea. Mal completamos 15 minutos de voo, o comandante avisou que chovia muito em São Paulo e que Congonhas estava fechado, assim como Guarulhos. De fato, ficamos 40 minutos rodando no ar até que pudemos aterrissar, sob raios e trovões. Desde aquela manhã, prometi nunca mais entrar num avião. E passei a viajar apenas de carro.
Essa opção, se me livra desses estresses, atrapalha-me a vida, impede-me de ir a São Luís, minha cidade natal, e de atender a convites para visitar lugares mais distantes.
Sucedeu, porém, que, há uns três anos, aceitei ir a Madri para atender a um convite tentador. Topei e me arrependi amargamente. De saída, enfrentei um atraso de três horas antes de embarcar e mais uma hora dentro do avião esperando permissão para decolar.
Durante o voo, turbulências intermináveis que não me deixavam dormir. Ao descer em Madri, estava um trapo e me aterrorizava pensar que teria que tomar outro avião para retornar ao Brasil.
Mas houve uma coisa compensadora: conheci o TAV -o trem de alta velocidade-, que me levou de Madri a Sevilha, viagem maravilhosa, com pouco mais de uma hora de duração e nenhum susto. Embarcamos sem ter quer fazer check in e desembarcamos sem ter que esperar a devolução da bagagem.
Num trem desses, faço qualquer viagem, vou até o polo norte. Acredito que, dentro de alguns anos, o avião vai ficar apenas para voos intercontinentais. E o trem, além do mais, não polui, é ecologicamente correto.
Enquanto isso não ocorre, uso o automóvel, que me pega à porta de minha casa e me deixa à porta do hotel em São Paulo ou Belo Horizonte. E me distraio lendo as notícias acerca das encrencas em que se metem os que continuam a viajar de avião.
Não faz muito, li no jornal o artigo de um cidadão que levou 60 horas para ir de São Paulo ao Rio, viagem que dura menos de 40 minutos. É que mergulhou numa tempestade cheia de raios e turbulências que obrigou o piloto a desistir de pousar no Rio e dirigir-se para Belo Horizonte. Ali dormiram e, no dia seguinte, tomaram o rumo do Rio, mas uma nova tempestade o fez retornarem a Belo Horizonte, onde tiveram que dormir de novo para, na manhã seguinte, conseguirem finalmente pousar no Santos Dumont. Muito divertido, não?
Outro caso bem mais recente foi o daquele avião da Air France que teve de pousar em Recife devido ao boato de que havia uma bomba a bordo. Não havia, mas o voo atrasou 24 horas.
Em seguida, outro avião da mesma companhia teve de voltar para o aeroporto Tom Jobim, após duas horas de voo, porque os banheiros haviam entrado em colapso. E, logo depois, um avião com destino a Chicago entrou em zona de tanta turbulência que foi obrigado a pousar onde pôde: dezenas de passageiros, feridos, foram hospitalizados.
Naquela semana mesma, um desastre no Paquistão matou os 175 passageiros. Esta semana, no Brasil, instala-se o caos aéreo.
Esses fatos só fortalecem em mim a convicção de que o melhor é ficar em terra mesmo. Morrer é o de menos, pior é o pânico que antecede ou anuncia o desastre. Há pessoas que se dispõem a enfrentar qualquer situação porque amam voar, e há outras que têm que fazê-lo por necessidade profissional.
Difícil, para mim, é entender aqueles que escolheram ser piloto de avião ou comissário de bordo. Sentem-se tão à vontade voando a 10 mil metros de altura quanto eu na minha sala. Devem pensar que ninguém se vai antes da hora, que quem morre de véspera é peru. Aproveito para lhes desejar, antecipadamente, um feliz Natal.
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Bons transportes ferroviários seriam excelentes opções para muitos.
ResponderExcluirHoje vi na TV uma reportagem falando que até nos supermercados e lojas de eletrodomésticos estão vendendo passagens aéreas, com prestações mínimas de R$20,00 em até 60 vezes!! Bom porque torna acessível tal meio de transporte para muitas pessoas que até então não tinham condições de comprar passagens aéreas, mas imagino que isso irá gerar um caos ainda maior nos aeroportos. Terão de ser tomadas muitas medidas para que isso não ocorra e também para que não se perca essa nova clientela!
Pra mim, o transporte ferroviário seria uma excelente opção... Seria ótimo ir pro RN e voltar pro CE (e vice-versa) várias vezes de trem! E para outros lugares do Brasil também.
Nem lembro a última vez que andei de trem... Acho que andei uma única vez na vida!