sexta-feira, 4 de novembro de 2011

A PRAGA DO FISIOLOGISMO


EDITORIAL
ZERO HORA (RS)

A multiplicação de casos de ministros que utilizavam o cargo e o poder para facilitar o acesso de seus partidos a verbas públicas, em alguns casos pela via tortuosa de ONGs oportunistas ou clandestinas, evidencia o mal que o fisiologismo político causa ao país. Não é um problema específico do primeiro escalão do atual governo, nem é uma questão nova: desde que o país se redemocratizou, sucessivas administrações são formadas na base do loteamento de cargos num processo permissivo e descontrolado, que invariavelmente deixa o governante refém da aliança partidária que o apoia. Para compensar este apoio, é feito um rateio imoral de postos, que acaba transformando ministérios e estatais em feudos partidários.

Por que, por exemplo, o Ministério do Esporte tem que ficar com o PC do B? Nada contra o partido, nem contra o parlamentar escolhido para substituir o ministro demissionário, mas o ideal para os brasileiros é que os ministérios e o comando de estatais fossem preenchidos por critérios predominantemente técnicos. Compreende-se que os governantes se preocupem com a governabilidade e com a sustentação parlamentar, mas o fisiologismo acaba formando um ciclo vicioso e danoso para a nação.

Ocorre em todas as esferas da administração pública, mas é na União que essa deformação fica mais evidenciada. O governo federal emprega cerca de 90 mil servidores em cargos de confiança – outra distorção brasileira, já que países desenvolvidos têm um número infinitamente menor de funcionários nessa condição. Só para ficarmos com um exemplo comparativo, os Estados Unidos têm menos de 10 mil cargos de confiança na administração federal.

Mas a pior parte desta mistura de empreguismo e fisiologismo parece ser mesmo a relação promíscua entre os ocupantes de cargos importantes, seus partidos e prestadores de serviços para o governo, sejam eles empresas ou organizações não governamentais. A tentação de usar o poder para beneficiar amigos e apadrinhados é sempre muito grande, especialmente quando o favorecimento resulta em retorno para os cofres da agremiação partidária preferida ou para o financiamento da própria campanha eleitoral. Quando os mecanismos de controle são frouxos e ineficientes, fica-se sempre a um passo da corrupção. Há casos, também, em que as irregularidades ocorrem sem o conhecimento direto do administrador, pela ação de subalternos, o que não livra o chefe da responsabilidade.

As recentes marchas contra a corrupção mostram que o povo brasileiro está cansado de conviver com esquemas delituosos que se perpetuam à sombra do poder. Estão inseridas neste contexto as campanhas pela Lei da Ficha Limpa, pelo voto aberto nos parlamentos e por uma reforma política séria, que moralize partidos e coligações, livrando os governantes da obrigação de tolerar e, às vezes, acobertar desvios éticos de seus colaboradores.
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