Eleições livres, limpas, periódicas e abertas a toda a população adulta são condições necessárias para o ingresso de um país no grupo das democracias estáveis. Mas não são suficientes, por si sós, para atender a outros requisitos, a partir dos quais se pode medir a legitimidade dos resultados eleitorais, no caso das disputas para as Casas Legislativas. Um é a igualdade de oportunidades entre os candidatos. Outro é a representatividade dos eleitos.
Esses objetivos - aos quais se acrescentam o fortalecimento do sistema partidário e a qualidade do processo legislativo - costumam ser alcançados uns à custa dos outros, porque ainda está para nascer um sistema eleitoral livre de distorções. Que nem por isso devem permanecer intocadas. No Brasil, duas delas são particularmente perversas. Os seus efeitos combinados desfiguram a vontade do eleitorado nacional.
Em primeiro lugar, o princípio clássico da democracia - um homem, um voto - é atropelado pela norma que estabeleceu um piso e um teto (8 e 70) para a representação dos Estados na Câmara dos Deputados. Foi uma regra imposta de cima para baixo. Fez parte do conjunto de mudanças constitucionais baixadas pelo presidente Ernesto Geisel a partir de 1.º de abril de 1977 - quando ordenou o fechamento do Congresso Nacional por duas semanas exatamente para isso. O chamado Pacote de Abril visava sobretudo a perpetuar a maioria governista no Legislativo.
Para isso, além de manter as eleições indiretas para governadores, criou a figura do senador biônico, as sublegendas nos pleitos para o Senado e o único entulho autoritário que os políticos se recusaram a remover - a ampliação das bancadas federais dos Estados menos habitados. Neles, a Arena, o partido oficial do regime militar, conseguiu manter-se à tona no naufrágio eleitoral de 1974, quando a oposição, reunida no MDB, obteve surpreendente votação no País.
O argumento de que a alteração se destinava a diminuir a concentração do poder político nos Estados já detentores do poder econômico não passava, portanto, de pretexto para um golpe político. A distância entre a distribuição das cadeiras na Câmara e a distribuição do eleitorado pela Federação faz com que um voto digitado em Roraima, por exemplo, valha 11 vezes mais que o de um eleitor registrado em São Paulo. No pleito recente, essa foi a diferença entre o maior e o menor quociente eleitoral (número de votos válidos em cada Estado, dividido pelas vagas a que tem direito) do País.
Não se trata de sugerir que os candidatos de um Estado sejam piores ou melhores do que os de outro. Mas é fato que o sistema tende a prejudicar os partidos mais votados nos Estados mais populosos. Foi o caso do PSDB. Metade dos seus 11,3 milhões de votos para a Câmara veio de São Paulo e Minas Gerais. Esses Estados deram ao PMDB apenas 12% dos seus 12,5 milhões de votos. Isso ajuda a explicar por que, embora a votação do PMDB tenha sido apenas 9% maior que a do PSDB, o número de cadeiras conquistadas pelo primeiro foi 49% maior que o deste.
O outro grande fator que deforma os resultados das eleições parlamentares é o mais lembrado. A cada pleito, só uma ínfima parcela de deputados se elege com os seus próprios votos. Este ano foram 35 em 513, ou 7%, os candidatos que alcançaram o quociente eleitoral em seus Estados. Em São Paulo, apenas dois candidatos, o notório Tiririca, do PR, e o vereador Gabriel Chalita, do PSB, ultrapassaram o mínimo necessário de 304 mil votos. Com as sobras, elegeram companheiros de viagem e correligionários.
É conhecida a causa do chamado desvio de votos, pelo qual o eleitor marca o candidato A do partido X e acaba elegendo, sem saber, o candidato B do partido Y a ele coligado. É a regra que permite parcerias partidárias em eleições para Câmaras e Assembleias. Elas servem para os partidos nanicos cederem tempo de TV em troca de vagas na chapa a que se juntaram. Bastaria acabar com as coligações em eleições proporcionais e um grande passo teria sido dado para diminuir o hiato entre a composição do Congresso e a intenção do eleitor.
Esses objetivos - aos quais se acrescentam o fortalecimento do sistema partidário e a qualidade do processo legislativo - costumam ser alcançados uns à custa dos outros, porque ainda está para nascer um sistema eleitoral livre de distorções. Que nem por isso devem permanecer intocadas. No Brasil, duas delas são particularmente perversas. Os seus efeitos combinados desfiguram a vontade do eleitorado nacional.
Em primeiro lugar, o princípio clássico da democracia - um homem, um voto - é atropelado pela norma que estabeleceu um piso e um teto (8 e 70) para a representação dos Estados na Câmara dos Deputados. Foi uma regra imposta de cima para baixo. Fez parte do conjunto de mudanças constitucionais baixadas pelo presidente Ernesto Geisel a partir de 1.º de abril de 1977 - quando ordenou o fechamento do Congresso Nacional por duas semanas exatamente para isso. O chamado Pacote de Abril visava sobretudo a perpetuar a maioria governista no Legislativo.
Para isso, além de manter as eleições indiretas para governadores, criou a figura do senador biônico, as sublegendas nos pleitos para o Senado e o único entulho autoritário que os políticos se recusaram a remover - a ampliação das bancadas federais dos Estados menos habitados. Neles, a Arena, o partido oficial do regime militar, conseguiu manter-se à tona no naufrágio eleitoral de 1974, quando a oposição, reunida no MDB, obteve surpreendente votação no País.
O argumento de que a alteração se destinava a diminuir a concentração do poder político nos Estados já detentores do poder econômico não passava, portanto, de pretexto para um golpe político. A distância entre a distribuição das cadeiras na Câmara e a distribuição do eleitorado pela Federação faz com que um voto digitado em Roraima, por exemplo, valha 11 vezes mais que o de um eleitor registrado em São Paulo. No pleito recente, essa foi a diferença entre o maior e o menor quociente eleitoral (número de votos válidos em cada Estado, dividido pelas vagas a que tem direito) do País.
Não se trata de sugerir que os candidatos de um Estado sejam piores ou melhores do que os de outro. Mas é fato que o sistema tende a prejudicar os partidos mais votados nos Estados mais populosos. Foi o caso do PSDB. Metade dos seus 11,3 milhões de votos para a Câmara veio de São Paulo e Minas Gerais. Esses Estados deram ao PMDB apenas 12% dos seus 12,5 milhões de votos. Isso ajuda a explicar por que, embora a votação do PMDB tenha sido apenas 9% maior que a do PSDB, o número de cadeiras conquistadas pelo primeiro foi 49% maior que o deste.
O outro grande fator que deforma os resultados das eleições parlamentares é o mais lembrado. A cada pleito, só uma ínfima parcela de deputados se elege com os seus próprios votos. Este ano foram 35 em 513, ou 7%, os candidatos que alcançaram o quociente eleitoral em seus Estados. Em São Paulo, apenas dois candidatos, o notório Tiririca, do PR, e o vereador Gabriel Chalita, do PSB, ultrapassaram o mínimo necessário de 304 mil votos. Com as sobras, elegeram companheiros de viagem e correligionários.
É conhecida a causa do chamado desvio de votos, pelo qual o eleitor marca o candidato A do partido X e acaba elegendo, sem saber, o candidato B do partido Y a ele coligado. É a regra que permite parcerias partidárias em eleições para Câmaras e Assembleias. Elas servem para os partidos nanicos cederem tempo de TV em troca de vagas na chapa a que se juntaram. Bastaria acabar com as coligações em eleições proporcionais e um grande passo teria sido dado para diminuir o hiato entre a composição do Congresso e a intenção do eleitor.
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