Pedagoga contratada não fez o curso de formação previsto pelo MEC
Passar creme hidratante nas mãos faz parte da lição numa turma do Brasil Alfabetizado, em Brasília. Os 18 alunos trabalham em áreas como limpeza, lavanderia ou jardinagem. E alguns penam para segurar um lápis. Ou melhor, penavam, porque as aulas, iniciadas em março, já dão resultado.
Quem leva o creme hidratante é a alfabetizadora Marilene Sacramento. Formada em Pedagogia, ela está desempregada.
Antes, trabalhava como auxiliar administrativa terceirizada num ministério.
Marilene recebe R$ 250 por mês nem metade de um salário mínimo.
Faço por amor diz Marilene.
Aos 52 anos, ela nunca lecionou no ensino regular. Sua experiência resumiase a dar aulas como voluntária num centro espírita. Ao ser selecionada pelo governo do Distrito Federal, este ano, ela conta que não recebeu orientação pedagógica nem participou do curso de formação inicial previsto pelo MEC.
Marilene alfabetiza funcionários do Minas Brasília Tênis Clube. Eles são dispensados do serviço na hora de estudar.
As aulas vão de terça à sexta-feira, das 15h30m às 17h50m, numa área coberta com vista para o Lago Paranoá. O clube também serve lanche. Ainda assim, na última sexta-feira, estavam presentes só 12 dos 18 matriculados. Quando estão de folga, eles não costumam ir às aulas.
O governo do DF decidiu reformular sua participação no Brasil Alfabetizado.
De olho num contrato futuro, a organização não-governamental Alfasol está prestando consultoria gratuita para as turmas do programa no DF. Isso inclui um encontro semanal de Marilene com especialistas da Alfasol.
Uma das atividades postas em prática pela alfabetizadora foi a simulação de uma eleição, na semana passada. Os alunos fizeram a vez de candidatos, e a turma lidou não só com conceitos de voto e democracia, como também com números, nomes e cargos.
A riqueza da alfabetização de jovens e adultos está nisso: vai muito além das letras diz a supervisora de pedagogia da Alfasol em Brasília, Clélia Rabelo.
A lavadeira Marlene Maria Alves de Sousa, de 49 anos, conta que aprendeu a assinar o nome com as filhas. Mas, ao receber o contracheque do clube, todo mês, ela não sabia preencher o espaço reservado à data. Aprendeu no Brasil Alfabetizado.
Antes de trabalhar na lavanderia do clube, Marlene atuava no setor de limpeza.
Ela diz que poderia ter sido promovida para a portaria. Mas foi barrada por não saber ler e escrever.
Funcionário da náutica, onde limpa lanchas, Messias Sousa da Silva, de 37 anos, diz que é um pouco vergonhoso ser analfabeto. Ele já trabalhou como cozinheiro e lembra que precisava da ajuda de colegas para ler o cardápio.
Nascido na zona rural de São Benedito (CE), Messias conta que seu pai só valorizava o serviço na roça: Meu pai dizia: não tem caneta melhor do que o cabo da enxada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário