RUY CASTRO
FOLHA DE SÃO PAULO
RIO DE JANEIRO - Longa vida a Ronaldo, mas, do ponto de vista do biógrafo, só será possível escrever um livro independente -"não-autorizado", como se diz- a seu respeito quando ele não tiver condições de atrapalhar a investigação. Esse é o problema de qualquer biografado vivo: não ser confiável. Mesmo que prometa "abrir tudo", ele constrangerá as fontes com o peso de sua presença e induzirá a que soneguem informações ou nem recebam o escritor.
Dito isto, não há biógrafo que não lamba os beiços ou esfregue as mãos diante dos desafios de se escrever uma biografia de Ronaldo. Sua brilhante trajetória como jogador de futebol e sua incrível série de contusões e recuperações já garantiriam uma narrativa emocionante sob o aspecto humano -a origem na pobreza, a luta na grande área, a dor, o estoicismo, a vitória e a fartura de dinheiro, sexo e festa, tudo em níveis que o torcedor comum nem pode conceber.
Mas este é só o esmalte, a superfície. O irresistível numa biografia de Ronaldo seria jogar luz nas zonas de sombra -aquelas que, tanto quanto os gols, as conquistas e os contratos, compuseram a sua personalidade. E elas não são poucas. Começaria pela convulsão a poucas horas da final da Copa de 1998 e, apesar disso, sua presença em campo contra a França- o quê, como e por quê aquilo aconteceu.
Seguiria com a história de seu casamento com a modelo e atriz Daniela Ciccarelli, em 2005, e a separação três meses depois; o constrangedor episódio com os travestis num motel da Barra, no Rio, em 2008; o namoro platônico com o Flamengo e seu inesperado casamento com o Corinthians, naquele mesmo ano; e, finalmente, a queda em desgraça, a aposentadoria e a mal contada alegação de hipotireoidismo para aplacar a ira dos corintianos contra ele.
Como eu disse, longa vida a Ronaldo. Mas que vida a ser contada!
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