segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

EXÉRCITO NA AMAZÔNIA - DRAUZIO VARELLA

                                        EXÉRCITO NA AMAZÔNIA

 O depoimento de um cidadão isento para ilustrar a realidade e as
 distorções que cometem nos gabinetes refrigerados de Brasília no trato
 das questões das reservas indígenas, da política indigenista e da
 ausência do poder público nos confins da Amazônia!!!

 A FORÇA DOS MILITARES NA AMAZÔNIA
 Uma visão isenta da ação dos militares na Amazônia.

 DRAUZIO VARELLA

 Perfilados, os soldados aguardaram em posição de sentido, sob o sol do
 meio-dia. Eram homens de estatura mediana, pele bronzeada, olhos
 amendoados, maçãs do rosto salientes e cabelo espetado.O observador
 desavisado que lhes analisasse os traços julgaria estar na Ásia.

 No microfone, a palavra de ordem do capitão: 'Soldado Souza, etnia tucano'.
 Um rapaz da primeira fila deu um passo adiante, resoluto, com o fuzil
 no ombro, e iniciou a oração do guerreiro da selva, no idioma natal.
 No fim, o grito de guerra dos pelotões da fronteira:  "SELVA !!!"

 O segundo a repetir o texto foi um soldado da etnia desana, seguido de
 um baniua, um curipaco, um cubeu, um ianomâmi, um tariano e um hupda.

 Todos repetiram o ritual do passo à frente e da oração nas línguas de
 seus povos; em comum, apenas o grito final: "SELVA !!!"

 Depois, o pelotão inteiro cantou o hino nacional em português, a plenos pulmões.

 Ouvir aquela diversidade de indígenas, característica das 22 etnias
 que habitam o extremo noroeste da Amazônia brasileira há 2..000 anos,
 cantando nosso hino no meio da floresta, trouxe à flor da pele
 sentimentos de brasilidade que eu julgava esquecidos.

 Para chegar à Cabeça do Cachorro é preciso ir a Manaus, viajar 1.146
 quilômetros Rio Negro acima, até avistar São Gabriel da Cachoeira, a
 maior cidade indígena do país.

 De lá, até as fronteiras com a Colômbia e a Venezuela, pelos rios
 Uaupés, Tiquié, Içana, Cauaburi e uma infinidade de rios menores, só
 Deus sabe..

 A duração da viagem depende das chuvas, das corredeiras e da época do
 ano, porque na bacia do Rio Negro o nível das águas pode subir mais de
 dez metros entre a vazante e o pico da cheia.

 É um Brasil perdido no meio das florestas mais preservadas da
 Amazônia. Não fosse a presença militar, seria uma região entregue à
 própria sorte. Ou, pior, à sorte alheia.

 O Comando dos Pelotões de Fronteira está sediado em São Gabriel. De lá
 partem as provisões e o apoio logístico para as unidades construídas à
 beira dos principais rios fronteiriços: Pari-Cachoeira, Iauaretê,
 Querari, Tunuí-Cachoeira, São Joaquim, Maturacá e Cucuí.

 Anteriormente formado por militares de outros estados, os pelotões
 hoje recrutam soldados nas comunidades das redondezas. Essa opção foi
 feita por razões profissionais: 'O soldado do sul pode ser mais
 preparado intelectualmente, mas na selva ninguém se iguala ao
 indígena'.

 Na entrada dos quartéis, uma placa dá idéia do esforço para
 construí-los naquele ermo: 'Da primeira tábua ao último prego, todo
 material empregado nessas instalações foi transportado nas asas da
 FAB'.

 Os pelotões atraíram as populações indígenas de cada rio à beira do
 qual foram instalados: por causa da escola para as crianças e porque
 em suas imediações circula o bem mais raro da região: salário.

 Para os militares e suas famílias, os indígenas conseguem vender algum
 artesanato, trocar farinha e frutas por gêneros de primeira
 necessidade, produtos de higiene e peças de vestuário.

 No quartel existe possibilidade de acesso à assistência médica, ao
 dentista, à internet e aos aviões da FAB, em caso de acidente ou
 doença grave.

 Cada pelotão é chefiado por um tenente com menos de 30 anos, obrigado
 a exercer o papel de comandante militar, prefeito, juiz de paz,
 delegado, gestor de assistência médico-odontológica,
 administrador do programa de inclusão digital e o que mais for
 necessário assumir nas comunidades das imediações, esquecidas pelas
 autoridades federais, estaduais e municipais.

 Tais serviços, de responsabilidade de ministérios e secretarias
 locais, são prestados pelas Forças Armadas sem qualquer dotação
 orçamentária suplementar.

 Os quartéis são de um despojamento espartano. As dificuldades de
 abastecimento, os atrasos dos vôos causados por adversidades
 climáticas e avarias técnicas e o orçamento minguado das Forças
 Armadas tornam o dia-a-dia dos que vivem em pleno isolamento um ato de
 resistência permanente.

 Esses militares anônimos, mal pagos, são os únicos responsáveis pela
 defesa dos limites de uma região conturbada pela proximidade das Farc
 e pelas rotas do narcotráfico. Não estivessem lá, quem estaria?
 "SELVA !!!"

 Lema do soldado da Amazônia:
 "Senhor, tu que ordenastes ao guerreiro de Selva, sobrepujai todos os
 vossos oponentes, dai-nos hoje da floresta, a sobriedade para
 resistir, a paciência para emboscar, a perseverança para sobreviver, a
 astúcia para dissimular, a fé para resistir e vencer, e daí-nos também
 senhor a esperança e a certeza do retorno, mas , se, defendendo essa
 brasileira Amazônia, tivermos que perecer, oh Deus, que façamos com
 dignidade e mereçamos a vitória, Selva!!!"
 .
.

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