Claudio Sales
O Estado de S. Paulo
Há o risco iminente de que seja votado na Câmara dos Deputados, ainda nesta semana, o projeto que altera o Tratado de Itaipu e que, se aprovado, custará mais de R$ 5 bilhões para os brasileiros. O líder do governo na Casa apresentou um requerimento de urgência ao Projeto de Decreto Legislativo n.º 2.600/10 com a intenção de inserir a matéria diretamente na pauta do plenário e, com isso, dispensar a instalação da Comissão Especial criada em 2010 para debater o tema e apreciá-lo com maior rigor. A pressa do governo em precipitar essa votação - que, aliás, não tem nada de urgente - preocupa pela falta de transparência em várias frentes. Principalmente quando se sabe que o Brasil não deve nada ao Paraguai e que a maneira mais rápida de prejudicar acordos futuros de integração energética é a quebra de contratos e tratados atuais.
O projeto do governo propõe alterar o Tratado de Itaipu para triplicar o valor pago pelo Brasil ao Paraguai a título de "remuneração por cessão de energia". Se aprovado, os brasileiros pagarão cerca de US$ 240 milhões a mais por ano pela energia proveniente de Itaipu, o que somaria mais de R$ 5 bilhões de reais até 2023, data em que os termos financeiros do Tratado poderão ser repactuados.
Tratados não devem ser objeto de mudanças levianas e oportunistas, principalmente quando surgem de demandas políticas de governos que passam e deixam a conta para os outros. Tratados são estabelecidos entre Estados. O de Itaipu foi firmado entre estadistas brasileiros e paraguaios em 1973 e, por ser uma peça jurídica perfeita, deve ser preservado. Esse tratado foi resultado de uma delicada arquitetura diplomática e financeira desenvolvida para tornar viável esse grande empreendimento que tanto beneficia ambos os países.
Mudanças nos termos pactuados não só dificultam a manutenção do delicado equilíbrio entre as partes, mas também representam um golpe mortal para futuros empreendimentos. Um novo acordo futuro com o calibre e a complexidade de Itaipu pode ser sumariamente descartado se for feita a alteração do Tratado de Itaipu.
No lado do Paraguai, os grupos de pressão, com o apoio de alguns políticos brasileiros, procuram obter mais dinheiro do Brasil com base na defesa da ideia de que o Tratado de Itaipu é "injusto" com o país. Uma falácia. Itaipu, além de fornecer 90% da energia consumida pelos paraguaios, gera receitas anuais de US$ 350 milhões, o que equivale a 15% da receita total paraguaia. E não esqueçamos de que o país obteve tudo isso sem assumir nenhum risco financeiro: todas as garantias para o financiamento de Itaipu foram dadas pelo Tesouro Nacional brasileiro.
No lado de cá, as justificativas apresentadas pelo governo federal e seus representantes no Congresso para alterar o Tratado são apoiadas na tese do aprimoramento das relações bilaterais com o Paraguai. Em nenhum momento aparecem argumentos que indiquem problema com os termos do Tratado de Itaipu. A proposta visa claramente a transferir recursos do Brasil para o Paraguai.
As justificativas são, portanto, de cunho político, e não econômico ou jurídico. O mais triste de toda a história é que, por causa de uma manobra de oportunistas, o Tratado de Itaipu deixará de ser uma peça juridicamente perfeita e diplomaticamente justa.
Mas isso pode ser evitado.
O Brasil não precisa se acanhar diante das pressões paraguaias e pode tranquilamente afirmar que o Tratado foi excelente negócio para nosso vizinho. Com base nessa constatação apoiada em fatos e números, a presidente do Brasil e o nosso Congresso têm a oportunidade de enviar duas mensagens. A primeira é: "Neste país, contratos e tratados são cumpridos, independentemente de pressões políticas". A segunda: "Manter o Tratado de Itaipu é a melhor maneira de "ajudar o Paraguai" e de manter abertas as portas de futuros projetos de integração energética"
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