sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Obama busca negócios, mas frustra empresários


Sergio Leo
Valor Econômico
  

Barack Obama vem aí, celebrar a reaproximação com o governo brasileiro e explorar a parceria econômica com o Brasil, mas desagradou a mais forte associação de empresários do país, a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), ao excluir a capital paulista de seu roteiro. Obama vai à favela no Rio, planeja fazer discurso histórico no litoral carioca, e a Fiesp, frustrada, reclamou da ausência da escala paulista, em contatos com os emissários de Obama que visitaram o Brasil nos últimos dias. As conversas desses emissários, aliás, indicam que os EUA ainda estão em busca de uma agenda plausível para o Brasil.

O último desses enviados foi o subsecretário de Estado para Assuntos de Economia, Energia e Negócios, José Fernandez, que, recebido em jantar pela Fiesp, na noite de quinta-feira, ouviu as queixas sobre a (falta de) visita de Obama - e, enquanto os executivos experimentavam a entrada, de sopa de cogumelos, foi direto: "o que podemos fazer para estimular parcerias entre empresas brasileiras e americanas?", indagou. Na visita ao Brasil, Fernandez insistiu que a relação entre os dois países passa por seu momento ideal ("sweet spot") e que os dois governos têm de aproveitar agora, antes que surja qualquer atrito que atrapalhe a aproximação bilateral.

"Por momento ideal quero dizer uma convergência de interesse e possibilidade", explicou ao Valor logo após o jantar. 

"Temos novo governo no Brasil, grande interesse de empresas americanas de negócios, comércio e investimento com o Brasil, empresas brasileiras grandes investidoras nos EUA e grandes oportunidades aqui no setor de infraestrutura". As oportunidades de aproximação dos dois países são das que se vê "uma vez na vida", disse ele.

Fernandez está encantado com o fato de que boa parte do crescimento das vendas dos EUA ao Brasil foi de 
equipamentos comprados para a exploração de petróleo no Brasil e diz não ver problema na intenção da Petrobras de aumentar o conteúdo nacional de seus investimentos no petróleo das camadas do pré-sal. Sugere que há espaço para isso sem abalar negócios das companhias americanas. Mas o otimismo do simpático subsecretário de Estado não atrai todos. Executivos de grandes construtoras brasileiras dizem não ter interesse em atrair sócios americanos para as obras do PAC ou para explorar juntos o mercado brasileiro do pré-sal, no qual a tecnologia da Petrobras não tem rivais no mundo.

Nas conversas com o governo, o otimismo teve mais eco; o subsecretário-geral do Itamaraty para assuntos econômicos e tecnológicos, Pedro Luiz Carneiro de Mendonça, um dos cérebros da atuação do Brasil no G-20, grupo das economias mais influentes do mundo, diz ter ficado entusiasmado com as visitas de Fernandez e, pouco antes, do secretário do Tesouro, Timothy Geithner, pelo grau do interesse demonstrado em criar uma agenda comum com o Brasil.

À exceção da nova conversa sobre infraestrutura e oportunidades de negócio no Brasil para companhias americanas, porém, os temas abordados não vão muito além da agenda já firmada com o governo George Bush: propostas como cooperação para atuar em terceiros países na América Central e África, colaboração em pesquisas sobre uso do etanol, manifestações de amizade e interesse no campo cultural. Os documentos vazados pelo WikiLeaks mostram como, com Bush, havia interesse em estreitar laços com o Brasil e o tema energia foi o que se encontrou para criar uma "agenda positiva" em meio a divergências dos dois governos.

A administração Obama passa a sensação de algo semelhante: há interesse político de ter o Brasil ao lado, e interesses econômicos, a começar pela necessidade de aproveitar o mercado brasileiro para expandir exportações americanas; mas ainda se tateia à procura de uma agenda positiva mais sólida. Voltou-se a falar no Fórum de Altos Executivos dos dois países, que tem servido bem para atacar a burocracia que atravanca os negócios, mas que se atolou numa campanha fadada ao fracasso, a defesa do acordo para evitar bitributação.

O aumento de investimentos de firmas brasileiras nos EUA cria impulso para um acordo de bitributação, mas nem o fisco brasileiro nem o americano aceitam mudar seus procedimentos para criar mecanismos contra a bitributação. 

Conseguiram chegar a um acordo para trocar informações sobre contribuintes - que vem sendo bombardeado por empresários brasileiros no Congresso, temerosos do uso que a Receita dará às informações recebidas dos Estados Unidos.

Para o Brasil, o maior interesse é descobrir maneiras de aumentar as medíocres taxas de crescimento das exportações ao mercado americano, e é uma simplificação excessiva atribuir o mau desempenho do Brasil à falta de um acordo de livre comércio com o país, ou à decisão do governo Lula de rejeitar a Área de Livre Comércio das Américas. O Mercosul, desde 2004, propôs um acordo de livre comércio com os EUA - ideia que voltou a ser levantada, sem receber reação, pela Fiesp no jantar com o subsecretário José Fernandez. Falta maior empenho das próprias empresas brasileiras, e sobra competitividade de concorrentes como a China.

"Números de comércio e investimento mudam, importante é a tendência de crescimento, que é positiva", minimizou Fernandez. É compreensível a falta de interesse do governo americano em negociações de comércio com o Mercosul: o acordo de livre comercio com a Colômbia até hoje rasteja no Congresso americano, apesar de a tarifa média para produtos colombianos já estar em ridículos 0,1% nos EUA. A boa relação entre os governos pode, no entanto, remover obstáculos não-tarifários às exportações dos dois países, como regras sanitárias e normas técnicas - como a administração Bush já vinha fazendo.

Obama quer marcar a visita como uma nova fase nas relações entre os dois países. Começou frustrando o empresariado paulista, e, aparentemente, ainda procura uma agenda nova para apresentar. Tem a seu favor, até agora, o interesse do governo brasileiro em fazer da visita um êxito diplomático da gestão Dilma Rousseff.
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