Valor Econômico
Os preços das terras para agricultura voltaram a ter forte alta nos Estados Unidos. Será que estamos nos aproximando de uma nova rodada de shows de Willie Nelson para socorrer o setor?
Aaron Packard/Bloomberg
Colheita de soja no oeste de Vermillion, no Estado de Dakota do Sul; terras atraem investidores institucionais e agricultores que querem ampliar atividade
A onda de alta das terras traz à memória a crise das dívidas agrícolas dos anos 80, quando agricultores pegaram empréstimos enquanto os preços das propriedades disparavam, para depois deparar-se com o estouro da bolha e as resultantes execuções de propriedades. As dificuldades dos agricultores levaram vários músicos, encabeçados por Nelson, a realizar os grandes concertos "Farm Aid", de auxílio aos agricultores.
As terras agrícolas voltaram a ser uma commodity atraente - apesar das dificuldades no setor imobiliário. As terras vêm atraindo desde investidores institucionais e donos de grandes fortunas a agricultores. Muitos investem em fundos de terras para cultivo, enquanto alguns agricultores procuram expandir suas operações.
"Simplesmente ficou algo atraente nos últimos tempos", afirma Shonda Warner, sócia-gerente da Chess Ag Full Harvest Partners, que tem um fundo com cerca de US$ 50 milhões investidos em terras agrícolas em quatro Estados.
O valor da terra na importante área ao norte do Meio-Oeste dos EUA subiu 10% no terceiro trimestre em comparação ao mesmo período de 2009, segundo o Federal Reserve Distrital de Chicago. Outra agência regional do banco central, a de Kansas City, informou que o preço das terras agrícolas irrigadas aumentou 12% no Kansas e em Nebraska no mesmo período. Essas altas acontecem depois de um aumento de 55% em termos reais ao longo dos últimos dez anos.
Os investidores despejam dinheiro não apenas nos melhores solos dos EUA, mas também em áreas agrícolas importantes no exterior. Alguns esperam que a terra se valorize. Outros apostam que os países de maior crescimento econômico terão de importar mais alimentos para atender suas populações, cada vez mais ricas, o que elevará a renda gerada pelas terras.
Em outubro, o Teachers Insurance & Annuity Association of America, parte do gigantesco fundo de pensão Tiaa-Cref, basicamente de professores, comprou o Westchester Group, que já administrava parte dos investimentos do Tiaa em terras. O Tiaa tem quase US$ 2 bilhões investidos em mais de 400 fazendas nos EUA, América do Sul, Austrália e Leste Europeu.
A George Washington University, em Washington, começou a comprar em 2007 e agora tem US$ 80 milhões investidos em terras cultiváveis. Do total, 25% estão nos EUA e o restante no exterior - incluindo investimentos em um fundo que arrenda terras na Polônia.
O Luminous Capital, empresa de consultoria em investimentos em Los Angeles e Menlo Park, Califórnia, que atende a donos de grandes fortunas, aplicou US$ 45 milhões do dinheiro de seus clientes em um fundo que planeja comprar 20 a 25 fazendas produtoras de milho, algodão e trigo.
"Acreditamos que os mercados emergentes continuarão a crescer em riqueza", diz Kim Ip, que administra a carteira de investimentos em terras da Luminous. Isso significará alta no consumo de carne, o que, por sua vez, levará à demanda maior por grãos para ração.
As fazendas nos EUA estão bem posicionadas para se beneficiar da forte demanda mundial pelas principais culturas, pois produzem bem mais do que os americanos consomem. Fornecerão mais da metade das exportações mundiais de milho e mais de 40% das exportações de soja e algodão nesta safra, segundo o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA).
As exportações podem ajudar os agricultores a ganhar receitas significativas, particularmente num momento de preços em alta. As cotações dos grãos subiram neste verão setentrional, após a dura seca na Rússia, que levou o país a proibir as exportações de trigo. Os preços do milho e trigo avançaram mais de 65% recentemente desde as baixas de junho, enquanto a soja subiu quase 40%.
A terra para agricultura nos EUA também está ficando mais escassa, o que pode impulsionar seu valor. A área de terra que pode ser trabalhada diminui de forma constante há mais de meio século, de 1,2 milhão de acres em meados dos anos 50 para menos de 920 milhões de acres em 2009, segundo o USDA.
A agricultura, no entanto, caracteriza-se por ser um negócio arriscado. Investidores de fora do setor normalmente recorrem a arrendatários ou empresas de gestão para administrar o dia a dia das propriedades, o que aumenta o valor dos agricultores mais capacitados. As lavouras também estão expostas aos caprichos da natureza.
"O maior risco é operacional", afirma Don Lindsey, chefe de investimentos da George Washington University. Ele tenta mitigar o risco de investir em regiões diferentes sob o comando de administradores também diferentes.
Os altos preços aumentam o risco de que os compradores estejam pagando excessivamente, diz Jim Grant, editor do boletim financeiro Grant's Interest Rate Observer. "Tenho preocupação com os agricultores mais idosos de Iowa que estão comprando 80 ou 100 acres de seus vizinhos porque as taxas de juros estão extremamente baixas", afirmou em um discurso no mês passado, em Cingapura. E também há a possibilidade de o valor das terras despencarem de novo.
O secretário de Agricultura dos EUA, Tom Vilsack, diz que a situação agora é diferente. "Não acho que estejamos vendo uma bolha, simplesmente porque acho que as pessoas vêm sendo bem mais conservadoras com as dívidas", diz.
De qualquer forma, a crise recente leva as autoridades a observarem a situação de perto. "Não queremos que se torne um problema", afirma Richard Brown, economista-chefe do Federal Deposit Insurance Corp., que monitora as instituições de crédito.
A Farm Aid, organização que surgiu a partir dos concertos originais, e da qual Nelson continua presidente do conselho, vem focando seus recentes esforços em outras preocupações do mundo agrícola, segundo uma porta-voz. Mas "estamos definitivamente observando a situação", acrescenta.
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