quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Qualidade das instituições e PIB per capita nas cidades

Ana Elisa Pereira, Luciano Nakabashi e Adolfo Sachsida

Valor Econômico 

Diante das grandes disparidades observadas no nível de renda entre os países, vários estudos buscam explicar os determinantes do crescimento econômico. Quais fatores são responsáveis pela elevação do padrão de vida em uma sociedade? Por que alguns países são ricos, enquanto outros permaneceram estagnados num patamar inferior de renda? A diferença no nível de bem-estar é verificada não somente entre diferentes países, mas também em diferentes regiões dentro do mesmo país.

No Brasil, por exemplo, essas diferenças no padrão de vida entre regiões alcançam valores exorbitantes sendo que a maior renda per capita municipal é mais de 190 vezes superior à menor renda per capita municipal.

Uma possível explicação para tais discrepâncias nos níveis de renda refere-se à diferença na qualidade institucional entre as regiões. Por qualidade institucional nos referimos ao grau de eficiência das instituições que afetam o nível de renda por meio da distribuição de poder político, da garantia dos direitos de propriedade, da geração de oportunidades econômicas, do estímulo à inovação e à acumulação de capital humano, além de outras vias. Podemos verificar sua importância por meio de um exemplo: se investimentos em uma determinada atividade produtiva, como na construção de uma fábrica industrial, não levam a um retorno compatível com outras atividades de risco econômico similar, ocorrerá uma reduzida quantidade de investimento, o que leva a um baixo crescimento desse segmento. Esse baixo retorno pode ocorrer mesmo que o potencial de realização de lucros nessa atividade seja elevado devido à insuficiente proteção contra roubos ou expropriação, o que mostra como instituições de baixa qualidade podem afetar negativamente o crescimento da região.

Em uma sociedade com instituições sólidas, o investidor recebe todo o retorno de seu investimento, além de não precisar gastar recursos em atividades que não elevam a produtividade de sua empresa, como segurança particular, alarme, seguros, construção de muros e cercas, etc. Dessa forma, há maiores estímulos ao investimento com efeitos relevantes sobre o crescimento e desenvolvimento econômico da região.

Embora as análises comparando instituições de países distintos tenham lançado luz sobre diversos aspectos da relação entre instituições e desenvolvimento econômico, hoje existe grande debate sobre o efeito da qualidade institucional na determinação do nível de renda de regiões dentro de um mesmo país. Alguns autores argumentam que estudos sobre desenvolvimento institucional e econômico intra-país podem melhorar o entendimento das questões já debatidas pela literatura internacional nas análises entre países. Eles apontam as vantagens empíricas de se limitar a análise ao âmbito nacional: as fontes de variações podem ser mais facilmente identificadas, em comparação com a análise entre países, pois algumas instituições podem não ser diretamente comparáveis entre países, mas o ser entre regiões ou municípios.

Mensurar em que medida o arcabouço institucional de um município pode afetar seu nível de renda é fundamental como suporte para políticas públicas que visem tanto ao crescimento econômico quanto à redução das imensas desigualdades regionais que se observa no Brasil.

Realizamos um estudo empregando uma amostra de 5.507 municípios brasileiros para os quais existem dados de PIB, população e qualidade institucional disponíveis, para o ano 2000. A variável que representa a qualidade das instituições dos municípios utilizada na análise empírica é o Indicador de Qualidade Institucional Municipal (IQIM), elaborado pelo Ministério do Planejamento para 5.507 municípios brasileiros, dentre aqueles considerados pelo IBGE (2000). Este índice, composto por três conjuntos de sub-indicadores, busca refletir a capacidade financeira, o grau de participação da população na administração pública e a capacidade gerencial de cada município.

Para contornar o problema da possível causalidade reversa entre renda e instituições, ou seja, o fato de que cidades com maior renda per capita possuem maior capacidade de investir e desenvolver instituições com boa qualidade, levando a uma relação positiva entre as duas variáveis, mas com causalidade oposta àquela enfatizada pela teoria, utilizamos uma variável que está associada às instituições, mas que não é afetada pela renda municipal per capita (a latitude, a média de temperatura e chuvas, e o fracionamento étnico).

De acordo com os resultados da análise empírica, podemos constatar que as diferenças verificadas na qualidade das instituições locais podem explicar boa parte dos diferenciais de renda existentes entre os municípios brasileiros. A análise empírica demonstrou que o Índice de Qualidade Institucional Municipal (IQIM) é significante para explicar as diferenças no PIB per capita entre os municípios do Brasil, mesmo quando levamos em consideração o problema da causalidade reversa.

Verificou-se também que mesmo levando em consideração os efeitos dos estoques de capital humano e físico per capita sobre o nível de renda, diferenças nas instituições podem explicar diferenças expressivas no nível de produto per capita municipal. As análises demonstraram que, em média, uma diferença de um ponto no indicador de qualidade institucional - que varia de 0 a 6 - corresponde a uma variação de cerca de R$ 1.900 no PIB per capita municipal.

Adicionalmente, alguns resultados apontaram para a existência de um efeito indireto da escolaridade sobre o desempenho econômico - por meio de seu impacto na qualidade institucional - e não corroboraram a existência de um impacto direto da educação sobre o PIB, quando se inclui a qualidade institucional na análise. Ou seja, há evidências de que o maior nível de educação promova instituições melhores, e tais instituições conduzam a um patamar de produto per capita mais elevado.

Embora algumas evidências empíricas apontem que as instituições mudem lentamente ao longo do tempo, a teoria institucionalista admite possíveis reversões do quadro institucional. O estudo da interrelação entre instituições e desenvolvimento pode apontar formas de se promover mudanças institucionais que conduzam regiões de baixa renda a um patamar mais elevado de PIB per capita. Portanto, melhorias na qualidade das instituições políticas e econômicas podem auxiliar na promoção do desenvolvimento e na redução das expressivas desigualdades regionais que se observa no território brasileiro.

Ana Elisa Gonçalves Pereira é mestranda em Desenvolvimento Econômico na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Email: anaelisagpereira@gmail.com

Luciano Nakabashi é doutor em economia, professor de economia da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Email: luciano.nakabashi@gmail.com

Adolfo Sachsida é doutor em economia, analista econômico do Ipea e pesquisador do CNPq.
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