WALTER CENEVIVA
FOLHA DE SÃO PAULO
Este momento é ideal para começarmos a ligar nossa vida individual e coletiva por regras constitucionais
A CONSTITUIÇÃO é muitas vezes referida como a lei das leis, porque todo o universo jurídico aplicado neste país se refere, obrigatoriamente, a um ou mais dispositivos dela.
Nada obstante sua importância, pano de fundo imprescindível para cada momento de nossa realidade política, econômica e jurídica, verifica-se que o eleitor nacional não se preocupa muito com esse documento fundamental.
Somos diferentes dos europeus (Alemanha, França e Suíça, por exemplo) e mesmo dos norte-americanos. Os Estados Unidos surgiram sob preocupação dos criadores de sua estrutura constitucional, com princípios essenciais em texto breve. Nos últimos anos, porém, os ideais democráticos foram subvertidos por intervenções armadas, até mesmo aliadas a ditaduras. A força constitucional foi sacrificada.
Este momento, no qual ultrapassamos os 25 anos da prática democrática, é ideal para começarmos a ligar nossa vida individual e coletiva por regras ou princípios constitucionais, para a aplicação do direito envolvido de cada cidadão e do poder.
Exemplo: chove muito, casas caem, pessoas morrem, governantes culpam as águas. A desculpa será constitucionalmente boa? Aceitável? Outro exemplo: cresce a imoralidade ou a ilegalidade e a improbidade nos comportamentos de agentes públicos. São apuradas e punidas adequadamente? Não devemos calar-nos.
A Constituição tem resposta para nosso direito e o dever que nasce com ele. Cabe-nos estimular ações legais para tirar esses episódios de nosso dia a dia.
Sem desanimar, é preciso reconhecer que nossa tradição legal tem pouco a ver com a aplicação constitucional, conforme se confere na história. Superada a crise de instalação da República, começamos os primeiros decênios do século 20 com problemas internos e externos (entre esses, a Primeira Guerra Mundial e o estado de sítio) até a crise de 1929 e a imposição da ditadura sob Getúlio Vargas. Retomada a democracia, durou pouco, até 1964, quando severos controles por atos institucionais foram impostos pelas Forças Armadas.
Nos 50 anos, entre 1930 e 1980, tivemos quatro constituições diferentes, sendo três ao sabor do poder dominante. Surgida, afinal, a Carta de 1988, hoje sobrevive retalhada, muito detalhista em alguns pontos, omissa em outros, sem clareza suficiente nos princípios fundamentais. Foi assim que se perdeu a noção do papel da Carta constitucional para dar a tutela básica de todo o direito.
Devemos unir-nos no esforço necessário para dar vida à lei maior, sob a qual se componha a essência jurídica do país na definição de modo efetivo e prático dos rumos dos direitos individuais e coletivos. No desenho de quanto vem coberto pela Constituição, devem ser harmonizados em princípios básicos do Estado brasileiro.
Os mecanismos para realização e preservação de tais direitos, a amplitude e os limites da atuação do poder público se imporão no elo indissolúvel entre democracia e direito, tanto no espaço interno da nação quanto nas relações com o exterior.
Para que o esforço seja bem realizado, o povo deve conhecer pelo menos a súmula de suas garantias fundamentais e o modo de assegurá-las em face do poder, preservando o bem comum sob Constituição democraticamente votada.
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