Amigos esta reportagem está muito boa e esclarecedora. É bem verdade que nossa idiossincrasia e nosso "berço esplêndido" não nos permite agir como Inglaterra, França ou mesmo Austrália. A questão lá é que eles tiveram duas guerras mundiais e foram atacados, ao longo da história, por invernos rigorosíssimos. Ademais nos países desenvolvidos não há a leniência constitucional que temos aqui, ou seja, aqui os direitos fundamentais do indivíduo prevalecem sobre o bem público e comum, ou seja, se alguém for retirado à força e processar a União acaba vencendo e obtendo gordos ressarcimentos por prejuízos morais e supostos prejuízos financeiros, haja vista os argumentos de muitos "anistiados" que ganham bastante do Erário atualmente.
O tema é maiúsculo e requer acompanhamento da sociedade. A questão é problema é que temos um BBB 11, campeonatos estaduais e o carnaval se aproximando.
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Um país sem defesa
Com um sistema ineficiente de prevenção e alerta e Defesas Civis lentas ou inexistentes nos municípios, o Brasil fica à mercê dos eventos climáticos
Debaixo de chuva, trabalhadores da prefeitura usam máscara para evitar infecções ao trabalhar no enterro das vítimas do deslizamento em Nova Friburgo, Rio de Janeiro (Felipe Dana/AP)
Salvos raras exceções , os alertas emitidos, em geral, se perdem nos caminhos burocráticos, na falta de treinamento para intervenções pré-estabelecidas, e não chegam a tempo às áreas de risco
A Europa havia acabado de entrar no verão de 1940 quando a Força Aérea Alemã iniciou uma gigantesca campanha de bombardeios a alvos civis britânicos, durante a II Guerra Mundial. As autoridades inglesas padronizaram então um conjunto de procedimentos para diminuir o número de mortes. O plano, que ficou conhecido como Defesa Passiva, atuava basicamente em três frentes: prevenção, alarme e socorro. Nascia assim o conceito moderno de Defesa Civil, até hoje usado como modelo para prevenção de catástrofes por vários governos em todo o mundo.
Infelizmente, setenta anos depois, o Sistema Nacional de Defesa Civil (Sindec) brasileiro ainda não consegue cumprir com eficiência a primeira e a segunda etapas, ou seja, prevenção e alarme. Sem mapas detalhados das áreas de risco, sem esclarecimento e treinamento da população e sem sistema eficiente de alertas preventivos, a Secretaria Nacional de Defesa Civil (Sedec) se limita a entrar em campo depois da tragédia. Chega apenas para socorrer as milhares de vítimas que escaparam com vida e enterrar as centenas de corpos dos que não tiveram a mesma sorte.
“É preciso uma vontade política muito forte para resolver o problema, uma visão de estadista”, afirma o cientista político Rubens Figueiredo, dando a pista de que falta vontade política para remover eleitores de suas casas precariamente instaladas em áreas de risco. “Quando a lógica da razão briga com a lógica da política, dificilmente a razão vence.”
Leo Caldas/Titular
Destruição pelas chuvas em União dos Palmares, Alagoas.
Velhos vícios – As razões para a ineficiência do modelo são muitas, mas estão principalmente ligadas a dois dos piores vícios da máquina pública no Brasil: o apadrinhamento partidário no preenchimento de cargos e a destinação política de verbas. Uma auditoria do Tribunal de Contas da União nas despesas do Ministério da Integração Nacional mostra que, entre 2004 e 2009, os recursos destinados à prevenção de desastres naturais somavam 934 milhões de reais. Apenas 356 milhões de reais foram efetivamente utilizados, e desse total, 37% foram para a Bahia.
Coincidentemente, entre 2007 e início de 2010, o inquilino da pasta era o baiano Geddel Vieira Lima (PMDB). Apesar do aporte de recursos, os conterrâneos do ministro sofreram com as chuvas em 2010. No mês de abril, 45 cidades foram fortemente castigadas, duas crianças morreram e centenas deixaram suas casas em áreas de risco. Sorte pior, porém, tiveram os pernambucanos e alagoanos que não estavam entre as prioridades na distribuição de verbas de Geddel. A tromba d’água do final de junho daquele ano matou 57 pessoas nos dois estados.
Os sinais da inoperância estão por toda a parte. No mapeamento de áreas de risco, por exemplo, a Sedec levou quatro anos, entre 2004 e 2008, para mapear as áreas de risco em apenas 44 cidades – menos de 1% dos 5.560 municípios brasileiros. Destes, somente sete receberam efetivamente algum tipo de recurso para obras de prevenção a desastres. O Conselho Nacional de Defesa Civil (Condec), outra entidade do Sistema Nacional de Defesa Civil criado em 1988 para elaborar diretrizes, está há seis anos sem aprovar nenhuma resolução.
Estrutura e orçamento - Para não fazer o seu trabalho, a Sedec conta com 110 funcionários que ocupam um terço de um andar no prédio do Ministério da Integração Nacional. Tem um orçamento previsto de 133 milhões de reais para sua operação em 2011 e está estruturada em três departamentos:
Minimização de Desastres – seria o responsável pelos mapeamentos de áreas de risco, obras de prevenção e treinamento e esclarecimento da população para evacuação das áreas antes dos acidentes.
Articulação e Gestão – o grupo do alarme, responsável por articular a atuação conjunta das defesas civis estaduais e municipais nos planos de retirada da população antes das tragédias.
Reabilitação e Reconstrução – o único cujo trabalho aparece, todos os anos, para limpar a bagunça depois que os morros desabam e os rios transbordam.
Além dos departamentos, a Sedec ainda conta com o Serviço de Protocolo e Apoio Administrativo e com os dados do Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres (Cenad). Este último, equipado com um sistema informatizado de geoprocessamento de dados obtidos por satélites, é o responsável por monitorar e alertar sobre a ocorrência de eventos climáticos excepcionais como as chuvas que castigaram o Rio há 10 dias. O alerta até sai. O problema, é servir para alguma coisa.
“Os institutos de meteorologia, juntamente com todos os que conseguem calcular o nível de rios, oceanos e outras medidas que possam resultar em catástrofes, precisam estar aptos a passar o alerta de emergência”, explica João Willy Rosa, professor de Geociências da Universidade de Brasília (UnB). “Na outra ponta, os responsáveis pela Defesa Civil precisam estar aptos a receber esse alerta para agir corretamente em cada caso, em todos os estados e municípios.”
Salvos raras exceções , os alertas emitidos, em geral, se perdem nos caminhos burocráticos, na falta de treinamento para intervenções pré-estabelecidas, e não chegam a tempo às áreas de risco. Estão aí para provar os 765 mortos e mais de 13.000 desabrigados nas cidades serranas do Rio. Para entender melhor os passos dessa tragédia anunciada, é bom voltar ao dia 9 de janeiro.
Nessa data, três dias antes da catástrofe, as chuvas anormais na região Sudeste do Brasil começaram a ser detectadas pelos satélites da Nasa (Agência Espacial Americana) e do Instituto Nacional de Metereologia (Inmet). Em 11 de janeiro, por volta das 16h30, o Inmet disparou o aviso metereológico especial que apontava "acúmulo significativo de chuva em TODO o estado do Rio de Janeiro". As prefeituras da Região Serrana do Rio confirmam o recebimento do alerta. Que destino deram à informação? Nenhum.
A prefeitura de Teresópolis admite que já sabia das chuvas dois dias antes da tragédia, mas alega que, mesmo assim, não teve tempo para avisar os moradores das 93 áreas de risco do município. As autoridades de Nova Friburgo, por sua vez, dizem que repassaram o alerta à população via rádio e internet, deixando às potenciais vítimas a decisão de abandonar o lar. Nenhuma remoção foi planejada para as áreas de risco (leia aqui histórias de três vítimas que retratam a completa ineficiência do sistema no município).
“A Defesa Civil ainda carece da criação de uma linha de comando integrada para que esses alertas seja transmitidos com eficiência”, diz João Willy Rosa. Para a professora Ana Ávila, do Centro de Pesquisas Metereológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura da Unicamp (Cepagre), falta estrutura “em todos os aspectos para a emissão de alerta no Brasil”.
Pedido de socorro – Depois do desastre na Serra Fluminense, o Cenad vai ganhar mais um supercomputador, avaliado em 50 milhões de reais, e uma rede de radares meteorológicos mais avançada. Sozinhos, porém, esses investimentos não garantem uma prevenção melhor, pois não resolvem o problema da cadeia de emissão do alarme.
Manoel Marques
Estragos causados pelas chuvas no Nordeste
Em alguns estados, como São Paulo e Santa Catarina, por exemplo, um sistema próprio de alarme costuma alcançar alguma eficiência. Nessas estruturas, informações coletadas por diferentes equipamentos são recebidas por um centro de emergência estadual e analisadas por técnicos. Quando eles concluem que há risco, começam a disparar telefonemas e SMS para colegas em órgãos operacionais previamente estabelecidos nos municípios, entre eles a Defesa Civil.
Essas equipes, treinadas para receber o alerta e saber como agir, deslocam-se para as áreas de risco e implementam medidas de segurança previamente estabelecidas. Assim, na maioria dos casos, conseguem se antecipar a inundações e deslizamentos de encostas. Nem sempre com total eficiência, mas com mais agilidade do que as autoridades fluminenses.
No Sistema Nacional de Defesa Civil, infelizmente, o único alerta que circula atualmente ainda é aquele que parte de baixo para cima, ou seja, da Defesa Civil do município para a Sedec, para avisar sobre um desastre. Em lugar do alarme preventivo que deveria fazer o percurso inverso, existe apenas o pedido de socorro depois que a desgraça já se instalou. A partir dele, a Sedec organiza e mobiliza os órgãos ligados à Defesa Civil na região para socorrer as vítimas. Isso quando existe Defesa Civil na região.
Um dos maiores entraves de todo o sistema, como admite o próprio governo, é a falta de estrutura nas cidades. O secretário nacional de Defesa Civil, Humberto Viana, afirmou nesta semana que apenas 426 dos 5.565 municípios brasileiros têm Defesa Civil.
A gestão de recursos repassados pelo governo federal a estados e municípios é outro problema. Dados da Confederação Nacional de Municípios (CNM) dão conta de que, em média, somente 10% das cidades brasileiras tiveram gastos com ações de Defesa Civil nos últimos cinco anos. Isso num país que tem, segundo os mapeamentos deficientes do governo, pelo menos 5 milhões de pessoas morando em 800 áreas de risco – 500 para deslizamento e outras 300 para inundações.
Mudança de paradigma – Para que não se repitam todos os anos, após as chuvas de verão, as imagens de cidades destruídas com centenas de caixões enfileirados, o Sistema de Defesa Civil do Brasil precisa se libertar do vício das medidas paliativas e emergenciais. Como bem observou Debarati Guha-Sapir, consultora da Organização das Nações Unidas (ONU) no Centro de Pesquisas sobre a Epidemiologia de Desastres (Cred), sediado em Bruxelas, na Bélgica, é um absurdo que o Brasil, com "apenas um perigo natural para administrar", não consiga fazê-lo. "Este foi o 37º deslizamento de terra no Brasil em menos de dez anos", disse Debarati ao jornal francês Le Monde. "Imagine se o país também enfrentasse terremotos, vulcões ou furacões. O Brasil não é Bangladesh, não tem desculpas.”
Se não bastasse o modelo de sucesso britânico durante a Segunda Guerra Mundial, estão aí para ensinar o caminho os exemplos de eficiência de países como Austrália, Tailândia e Indonésia, que lidam com enchentes e tsunamis muito mais devastadores que as enchentes brasileiras.
Voltando à época da concepção da Defesa Passiva, se a Inglaterra tivesse estruturado o seu programa nos moldes da Defesa Civil Brasileira, suas principais cidades jamais teriam sido equipadas com um milhão de abrigos antiáreos logo nos primeiros meses da Segunda Guerra Mundial. A população não teria aprendido a se refugiar ao toque dos alarmes, porque não existiria a rede de radares e de observadores voluntários ao longo da costa para disparar as sirenes assim que os bombardeiros alemães cruzassem os céus sobre o Canal da Mancha. Consequentemente, as bombas alemãs teriam matado um número infinitamente maior que os 23.002 civis mortos durante os cinco meses de bombardeios.
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