domingo, 23 de janeiro de 2011

A monocultura conquista o MST

Josie Jeronimo
Correio Braziliense 


Assentamentos cultivam mamona e girassol, usados pela Petrobras na fabricação de biocombustível

  Inspirado no ideário comunista de garantir ao homem do campo um pedaço de chão para sobreviver sem se curvar ao capitalismo moderno, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) está passando para o outro lado do balcão. O governo conseguiu inserir assentamentos do Nordeste e do Sul do país no processo produtivo do biocombustível. No lugar das policulturas voltadas para a subsistência e a agricultura familiar, terras conquistadas graças a processos de reforma agrária tornam-se aos poucos grandes culturas de mamona e girassol. A parceria existe em pelo menos quatro estados do Nordeste, mas o MST pressiona para que a Petrobras amplie os contratos de compra da produção das sementes para outros estados. Paraíba e Pernambuco seriam os próximos da fila.

A monocultura tão criticada por militantes do MST tornou-se realidade nos assentamentos, pois a Petrobras e empresas que revendem o óleo beneficiado para a estatal compram com facilidade a produção. E em vez de se dedicarem à venda do feijão ou do milho que cultivavam, os produtores têm optado pelo dinheiro certo que a produção de oleaginosas tem garantido. Além de comprar a safra, a Petrobras oferece assistência técnica aos produtores dos assentamentos. 

Maria Sheila Rodrigues, da Cooperativa de Trabalho das Áreas de Reforma Agrária do Ceará (Cooptrace), entidade ligada ao MST, conta que, dos 7 mil hectares distribuídos entre os 3.239 agricultores filiados, 6.800 são destinados ao cultivo da mamona e 190 ao do girassol. Assentados que optam por “consorciar”, termo usado para a combinação das culturas, plantam algum feijão entre as fileiras da planta espinhosa usada na produção do biocombustível, mas a quantidade é pequena e não é nem mesmo calculada, segundo Maria Sheila. “Temos contrato de compra e venda com a Petrobras. O quilo da mamona sem casca é R$ 1. No feijão e no milho, não tem critério de preço, na mamona é garantido. Não temos controle de quanto é produzido de alimento, pois quase tudo é consumido pelas famílias.” 

Adaptação fácil 
Atraídos pelo mercado certo do biocombustível e pela garantia de renda, pois as plantas resistem mais às intempéries, os assentados modificam o modo de trabalho. De acordo com os agricultores, há projetos de reestruturação produtiva, de análise de solo, estudos para financiar matéria orgânica para aumentar a produção de oleaginosas e, consequentemente, a renda dos trabalhadores. No Ceará, a estimativa é de que 33 mil assentados atuem na produção de biocombustível. 

Enquanto os assentamentos do Ceará são cobertos pelo verde da mamona, em Sergipe o amarelo dos girassóis avança sobre a cultura de alimentos nas cooperativas ligadas ao MST. Lucas de Oliveira, que atua na Cooperativa Regional dos Assentados da Reforma Agrária do Sertão de Sergipe (Coprase), afirma que os homens do campo se acostumam ao cultivo dos girassóis. Ele conta que alguns produtores ainda plantam feijão para a subsistência, mas a possibilidade de sobreviver da venda das sementes da oleaginosa tem movimentado os agricultores porque a planta se adaptou bem à seca. “Temos dois contratos com a Petrobras, de assistência técnica e de comercialização de grãos. Estamos na segunda safra. Temos que adaptá-la ao plantio de milho e feijão, mas os agricultores estão gostando porque o girassol tem uma certa resistência à seca. Para a região, é perfeito.” 

O presidente da União das Associações Comunitárias do Interior de Canguçu (Unaic), André Santos, afirma que a entidade ainda não tem parceria com a Petrobras e vende a produção de mamona, girassol e soja para empresas que beneficiam as sementes no estado, o Rio Grande do Sul. Os agricultores aguardam a parceria com a Petrobras para eliminar os intermediários e receber valor de preço final nas vendas. 

A Petrobras informou que as parcerias com as cooperativas fazem parte do Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel, que tem como uma das diretrizes os “selo combustível social”. A estatal, no entanto, pontua que não há “vinculação contratual” com os assentamentos. A Petrobras Biocombustível informa que faz parte da estratégia do programa orientar os assentados a diversificar a produção agrícola, dando informações técnicas sobre o plantio “consorciado” das oleaginosas com o cultivo de feijão e milho. 

Fonte limpa 
Biocombustível é o nome dado a fontes de energia geradas a partir de vegetais. No Brasil, a cana-de-açúcar, a soja, a mamona e a semente de girassol estão entre as plantas mais comuns na geração de biocombustível, que substitui o petróleo como fonte de energia, considerada uma energia limpa.
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