domingo, 23 de janeiro de 2011

Uma razão para se orgulhar

RUTH DE AQUINO
REVISTA ÉPOCA


Existe uma máxima no mundo da mídia: “Good news is no news” (boas notícias não são notícia). Entre os escombros da tragédia de 2011, há uma notícia tão boa que não dá manchete. A cidade do Rio de Janeiro inaugurou o centro mais moderno de controle de operações do mundo, totalmente computadorizado, com radares e alertas para enchentes. Um novo sistema poderá prever dilúvios 48 horas antes e deslocar a tempo famílias em risco de perder suas casas e suas vidas.

O centro carioca de operações tem um telão de 80 metros quadrados – maior que o da Nasa, segundo o prefeito Eduardo Paes. Reúne 30 órgãos municipais e concessionárias e 400 profissionais. É resultado de uma parceria com a IBM. O objetivo é transformar o Rio em referência para o Brasil e o mundo no planejamento de eventos e gestão de crises. A ideia é repetir o modelo em metrópoles brasileiras até a Copa.
O cérebro tecnológico do prédio é um indiano que vive em Nova York, mas tem visitado tanto o Rio que uma de suas bebidas prediletas é a caipirinha e seu point favorito é a Lapa boêmia e musical. É vice-presidente de tecnologia da IBM e seu nome é Guru. Foi batizado como Guruduth Banavar, mas até a mãe dele o chama de Guru (leia a entrevista) .

Em cada monitor, vemos o que está acontecendo naquele momento em todos os pontos da cidade: obras, engarrafamentos, acidentes, falta de luz ou de gás, onde estão os reboques, por onde trafegam os ônibus, onde está sendo recolhido o lixo. É evidente que não basta ter acesso aos dados. Só com inteligência e integração esses dados podem ser úteis. Mas acabou a desculpa “eu não sabia de nada”. O prefeito tem um quarto ali para dormir, em emergências.

Uma reportagem recente da revista The Economist, intitulada “It’s a smart world” (É um mundo inteligente), traduz o que se tenta fazer nesse centro. É como se o mundo real e o mundo digital convergissem para criar eficiência. Para as pessoas comuns, significa menos estresse e mais conforto. Segundo o diretor da IBM Pedro Almeida, carioca apaixonado pelo que faz, essa é a base para o conceito de Smarter Cities, ou “cidades mais inteligentes”, que a IBM criou em 2007 e, agora, inclui o Rio como uma das vitrines mais vistosas.

Entre os escombros da tragédia, há uma ótima notícia: o novíssimo centro de alerta para enchentes.
No caso das chuvas, a era do achismo e da irresponsabilidade terá de acabar para não se repetir o vale de lágrimas da serra fluminense. Cientistas e geólogos concluíram o primeiro mapeamento do solo da cidade do Rio, depois de fotografar de helicóptero, com câmeras especiais e laser, ruas, vales e morros. Existem hoje 18 mil casas em alto risco em 117 comunidades. Fora o médio risco e o baixo risco.

Caso o novo radar da prefeitura, importado dos Estados Unidos, preveja chuvas fortes, sirenes tocarão. A IBM promete, com seu novo sistema, a ser instalado neste semestre, prever calamidades com dois dias de antecedência. Mais de 2 mil agentes comunitários foram treinados pela Defesa Civil e equipados com celulares para receber alertas por mensagens de texto.

Se um sistema parecido estivesse em vigor na serra do Rio, não estaríamos chorando hoje mais de 700 mortos. Podemos ser solidários e generosos, mas não vamos esquecer que existem culpados.

O que aconteceu em Petrópolis foi um crime premeditado. As estações meteorológicas sofisticadas existem, estão instaladas em lugares estratégicos, uma delas ao lado do vale que deixou de luto dezenas de famílias. Mas não estavam funcionando. Por quê? O prefeito Paulo Mustrangi diz que era fim de ano, havia raspado o caixa e não tinha os R$ 900 mil para fazer funcionar. O Instituto Estadual de Ambiente afirma que não recebeu nenhum pedido de ajuda do prefeito.

Prefeitos que permitem construir favelas, condomínios e hotéis em encostas e áreas de risco e não tomam providências para garantir o bem-estar de seus eleitores deveriam perder o mandato e ser levados à Justiça. Pensando bem, que Justiça? Na cidade do Rio, liminares judiciais impedem a prefeitura de reassentar mais de 130 famílias que permanecem em casas condenadas, que já deveriam ter sido demolidas. Quem vai julgar os juízes?


RUTH DE AQUINO
é diretora da sucursal de ÉPOCA no Rio de Janeiro
raquino@edglobo.com.br

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