sábado, 29 de janeiro de 2011

Acumulação de reservas está chegando ao fim


Claudia Safatle
VALOR ECONÔMICO

O processo de acumulação de reservas cambiais, que começou em 2004 e ganhou força a partir de 2006, está se esgotando. Para intervir no mercado de câmbio sem gerar pesados custos fiscais, o Banco Central (BC) voltou a fazer operações de "swap reverso" e anunciou esta semana, através da carta-circular 3.484, que vai operar por leilões também no mercado a termo.

Ou seja, a liquidação financeira de uma compra ou venda de dólares pela autoridade monetária só se dará no futuro. Como essa mesma operação poderá ser renegociada e rolada por prazo indefinido, o custo efetivo imediato da intervenção passa a ser mais modesto, representado pelo pagamento do cupom cambial até a data da liquidação.

No mercado a termo, cria-se um direito e uma obrigação correspondente, sem que o peso do diferencial de juros internos e externos sobre a esterilização das reservas recaia no orçamento do próprio exercício (conforme o prazo da operação). Pode-se, assim, diluir no tempo as despesas fiscais decorrentes da compra de moeda estrangeira.

BC cria novos instrumentos para intervir no câmbio

É claro que nem todas as intervenções serão feitas nesse mercado, e que alguma compra de reservas ocorrerá ao longo do ano. Mas o fato importante é que o BC está criando alternativas, cujos efeitos são menos onerosos ao Tesouro Nacional, conforme salientou uma fonte do governo.

O país dispõe, atualmente, de US$ 295,9 bilhões em caixa, montante mais do que suficiente para enfrentar eventuais crises externas que resultem em parada abrupta do ingresso de moeda estrangeira no país.

O custo de carregamento das reservas ocorre de duas formas: pelo diferencial entre juros internos e externos e pela valorização do real frente ao dólar. Como o país é credor em moeda estrangeira, a apreciação do real frente ao dólar resulta em prejuízos ao BC. No ano passado até novembro, a equalização cambial registrava prejuízo, para o BC, de R$ 31,8 bilhões (ou 0,9% do PIB).

Essa, no entanto, não é uma variável que só gera despesa. Em 2008, quando houve uma substancial depreciação do real, o Banco Central remeteu para o Tesouro Nacional um lucro espetacular de R$ 171,4 bilhões.

Não é trivial calcular o quanto a acumulação de reservas já custou à sociedade brasileira. Ao aumentar as reservas de US$ 85,83 bilhões, em 2006, para US$ 180,3 bilhões em 2007, estimou-se, no governo, que isso representaria aos cofres públicos um gasto de cerca de 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB). Algo próximo a R$ 50 bilhões naquela época. Atualmente, avalia-se em mais de 1% do PIB a despesa para manter reservas de quase US$ 300 bilhões.

Dentre os países que detém os maiores volumes de reservas, o Brasil é o que tem o menor valor como proporção do PIB, em torno de 13%. Mas é, também, o que pratica as taxas de juros mais elevadas (Selic de 11,25% ao ano). Portanto, é o país que mais gasta para carregar esse seguro que, apesar de muito caro, mostrou-se crucial nos momentos mais difíceis da crise global.

Para enfrentar a crise econômica global de 2008, um caixa de US$ 200 bilhões se mostrou suficiente. É razoável supor, assim, que todos os dólares comprados pelo BC de lá para cá foram para evitar excessivas volatilidade e apreciação da taxa de câmbio, e não para aumentar a proteção das contas do balanço de pagamentos.

Outra mudança relevante na atuação do Banco Central, neste início de ano, foi a de não comprar todo o fluxo de moeda estrangeira. Até o dia 21, o ingresso de dólares havia sido de US$ 9,2 bilhões, mas a autoridade monetária adquiriu US$ 3,9 bilhões no mercado a vista e outros US$ 3,5 bilhões nos leilões de swap reverso. Como esses últimos representam atuação no mercado futuro, não há a entrega de dólares e, portanto, não geram custo fiscal adicional.

Ainda que a compra abaixo do fluxo tenha outras motivações, como dar espaço para que os bancos desmontem suas posições vendidas em moeda estrangeira, ela acaba também reduzindo a pressão sobre o aumento do gasto público decorrente da acumulação de reservas.

A busca por mecanismos de intervenção que não representem compra de reservas e, portanto, não onerem ainda mais a já debilitada situação da política fiscal não significa que a ajuda do Banco Central no cumprimento da meta de superávit primário este ano seja relevante. Mas representa uma constatação de que a relação custo-benefício da política de acumulação de reservas cambiais, conduzida com sucesso no governo anterior, está chegando ao fim.

Assim como também chega ao fim a grande contribuição que a apreciação do real frente ao dólar deu para o controle da inflação desde os primórdios do Plano Real.
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