ELIANE CANTANHÊDE
FOLHA DE SÃO PAULO
O Egito vive uma festa histórica, depois de mais de 10 milhões irem às ruas para derrubar o ditador Hosni Mubarak, que, em 30 anos, empobreceu dramaticamente a população e enriqueceu constrangedoramente a própria família.
Depois da festa, vem a ressaca e começa a acomodação de forças políticas e a definição do cronograma da redemocratização. Uma fase de divisões, conflitos, dissidências.
Na expectativa mais otimista, a Junta Militar e as oposições vão se unir para tirar o país da lama e do atraso, convocar eleições e articular uma constituinte. Mas... as Forças Armadas apoiavam no regime que caiu, e as oposições estão divididas em 14 partidos e agremiações, aí incluída a Irmandade Islâmica. Obter consenso de grupos tão heterogêneos e tão reprimidos durante tanto tempo não vai ser fácil.
Para quem prevê um destino a la Turquia, militarizada, ou a la Irã, teocrático, o embaixador Cesário Melantonio avisa que não é bem assim. Há nove anos e meio na região e há mais de três no Cairo, ele antes serviu exatamente nesses dois países. As diferenças são, antes de tudo, ancestrais: os três são muçulmanos, mas o Egito é árabe, a Turquia, otomana, e o Irã, persa.
Mas, se é para seguir exemplos, melhor que seja a Turquia, democrática e 27ª economia do mundo, enquanto o Egito é a 82ª, com metade da renda per capita. Já o Irã é xiita, confuso, mistura política e religião. O Egito é sunita, que separa.
Os próprios agentes das revoluções foram e agiram de formas bem diferentes. No Irã, os aiatolás assumiram. Na Turquia, os militares participaram da transição. No Egito, dois terços da população têm menos de 30 anos e metade tem internet, além de celular. Lutam não por teocracia, mas sim liberdade, crescimento e justiça social.
Apesar das naturais dificuldades do início, ou reinício, o processo no líder Egito é positivo e deve ter um efeito saneador no mundo árabe. As ditaduras que se cuidem.
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