O rápido aumento das importações pode afetar - e já há sinais inquietantes disso - a estrutura industrial brasileira, eliminando boa parte dos produtores de insumos e componentes. Esse risco é mostrado com clareza em nova pesquisa da Fiesp. Segundo o levantamento, 55% das fábricas nacionais já se abastecem no exterior e 23% desse grupo compra bens finais. As demais importam matérias-primas, bens intermediários, máquinas e equipamentos. A forte valorização do real tem estimulado a troca de fornecedores nacionais por estrangeiros, mas esse fator, embora importante, serve para explicar apenas parcialmente a mudança. As empresas brasileiras enfrentam outras desvantagens, quando têm de competir com indústrias de fora.
A importação de matérias-primas e bens intermediários, incluídos componentes, pode ser benéfica para a economia nacional e para o conjunto da indústria, quando os participantes do comércio exploram normalmente suas vantagens competitivas. Fabricantes de aviões de todo o mundo usam turbinas de um número muito pequeno de produtores, por exemplo. Há muito tempo a indústria automobilística dos países mais avançados importa peças, componentes e até motores em grande parte originários de países em desenvolvimento. Isso é compatível com as condições de custo e com o uso mais eficiente da mão de obra e da tecnologia disponíveis em cada país. Mas o caso da indústria brasileira não se enquadra nesse conjunto.
Parte de seus atuais problemas de competitividade é comum às empresas de muitos países. A desordem cambial afetou gravemente nos últimos dois anos o comércio internacional. O esforço do governo e do banco central dos Estados Unidos para estimular a economia resultou em forte depreciação do dólar. A moeda chinesa, já subvalorizada, acompanhou esse movimento. Isso aumentou a vantagem do yuan em relação à maior parte das moedas. Alguns governos, como o coreano e o japonês, tentaram neutralizar esses efeitos intervindo no mercado de câmbio. As autoridades brasileiras tentaram limitar, por meio da tributação, o ingresso de aplicações estrangeiras, mas com efeitos muito limitados. As novas medidas podem ter freado a valorização do real, mas não mudaram a tendência.
Nenhum governo pode resolver esse problema isoladamente. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, admite isso publicamente, mas insiste em responsabilizar o Federal Reserve pela desordem cambial, como se a desvalorização artificial do yuan não fosse conhecida há muitos anos.
Uma intervenção direta no mercado de câmbio produziria efeitos inflacionários perigosos e, além disso, o abandono do regime de flutuação tornaria o mercado inseguro e seria um estímulo à especulação. Mas o governo pode atacar outros entraves importantes à competitividade - mais importantes e duradouros que o câmbio.
Esses entraves são conhecidos, genericamente, e seria preciso desenhar uma estratégia com medidas de curto e de médio prazos para removê-los. Uma ampla mudança tributária tomaria tempo, mas pode-se pensar em medidas de efeito rápido, como a pronta devolução de créditos fiscais (um velho problema) e a desoneração, pelo menos parcial, da folha de pagamentos. Uma política racional de crédito, sem cartas marcadas e sem benefícios dirigidos a um número restrito de eleitos, também poderia facilitar a vida das empresas. Os bancos oficiais têm meios para isso. Falta repensar sua forma de atuação.
A indústria poderia propor medidas de efeito rápido, indicando os benefícios de cada uma - e sem se concentrar em barreiras e subsídios. A proteção pode ser importante, mas é preciso usá-la com eficiência e de acordo com as normas internacionais. Subsídios podem ser contraproducentes e, em geral, favorecem alguns privilegiados. Entidades da indústria têm produzido estudos sobre competitividade, mas a maior parte das propostas envolve medidas de médio e de longo prazos, algumas politicamente complicadas. É hora de pensar numa pauta prática e de fácil execução.
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