sábado, 18 de dezembro de 2010

O desafio de se evitar as armadilhas do crescimento

Valor Econômico - 15/12/2010

A esta altura não dá mais para duvidar que a economia vai desacelerar no próximo ano. Não foi outro o objetivo do recente pacote de medidas de contenção do crédito e restrição de liquidez anunciado pelo Banco Central (BC). As contas nacionais, divulgadas na semana passada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), confirmam a tendência e explicam em boa parte os instrumentos usados pelo BC.

A desaceleração ficou evidente nos dados do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre, que cresceu 0,5% sobre o trimestre anterior. No início do ano, o ritmo era bem mais vigoroso: o PIB aumentou 2,3% no primeiro trimestre do ano sobre o último trimestre de 2009 e 1,8% no segundo sobre o primeiro.

Mostram a mesma trajetória os dados acumulados em doze meses. Nos dois primeiros trimestres do ano, o crescimento do PIB em doze meses superou os 9%, refletindo uma recuperação vigorosa comandada pela indústria, depois de meses de atividade deprimida pela crise internacional. Já no terceiro trimestre, a taxa acumulada em doze meses recuou para 6,7%.

Era natural que o ritmo chinês de expansão perdesse o fôlego, especialmente à medida que mudasse a base de comparação do crescimento e se deixasse para trás os resultados mais deprimidos de 2009 - afinal, o PIB revisto do ano passado mostrou uma queda de 0,6%. O principal motivo da desaceleração, porém, são as fragilidades da economia brasileira expostas pelo crescimento.

Depois de um bom comportamento no primeiro semestre, a indústria e a agropecuária tiveram queda significativa no terceiro trimestre, de 1,3% e 1,5%, respectivamente. A desaceleração da indústria, especialmente de transformação, foi resultado da eliminação dos estoques acumulados nos trimestres anteriores e do aumento da participação das importações para atender o consumo doméstico de bens industriais. As importações foram muito facilitadas pelo câmbio valorizado.

Do lado da demanda, o consumo das famílias cresceu 1,6% no terceiro trimestre, após quatro trimestres consecutivos de desaceleração, em comparação com 0,8% no segundo, e 7% em doze meses. O aumento do consumo das famílias é resultado do nível excepcionalmente baixo do desemprego (6,1% em outubro, de acordo com o IBGE), da expansão da renda real e do crédito.

Foi notável também o aumento da formação bruta de capital fixo (FBCF), que cresceu 3,9% no terceiro trimestre, acumulando 20,2% em doze meses e 25,6% sobre igual período de 2009, sustentado pelas importações e produção interna de máquinas e equipamentos. Com isso, a taxa de investimento, medida pela relação entre a FBCF e o PIB, foi de 19,4%.

Mais notável ainda foi o crescimento das importações no PIB que, barateadas pelo câmbio, supriram a demanda das famílias e dos investimentos. As importações cresceram 7,4% no terceiro trimestre, 29,4% em doze meses e nada menos que 40,9% sobre o terceiro trimestre de 2009.

As importações tiveram um efeito negativo de 0,84 ponto percentual no PIB do terceiro trimestre e a variação dos estoques, de 0,54 ponto. Elas foram contrabalançadas pelo efeito positivo do consumo das famílias (0,97 ponto), pela formação bruta de capital fixo (0,66 ponto) e pelas exportações (0,27 ponto). O consumo do governo foi neutro.

Apesar de a taxa de investimento estar aumentando, o patamar atual não sustenta a manutenção de uma expansão do PIB no nível registrado neste ano. Economistas calculam que, para o PIB crescer ao redor de 5%, que é o valor estimado para 2011, a taxa de investimento deveria ser de 25%. Sem isso, o crescimento vai depender de mais importações, que vão pressionar a conta corrente e a inflação. Não foi por outro motivo que o BC apertou as torneiras do crédito para conter o consumo das famílias e, por tabela, as importações e a inflação.

A chave para se evitar que o crescimento, tão necessário para a melhoria dos indicadores sociais, se transforme em uma armadilha é estimular o investimento e a produção. Não basta, porém, investir mais. É preciso que as empresas operem nas mesmas condições de seus concorrentes externos. Não só o câmbio influencia essa equação, mas também a infraestrutura para o escoamento dos produtos e o sistema tributário.

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