domingo, 17 de outubro de 2010

A escolha de Marina

Ferreira Gullar
FOLHA DE S. PAULO

Neste momento, Marina surge como uma nova opção, uma terceira via entre PT e PSDB
O resultado das eleições presidenciais de 3 de outubro surpreendeu todos e particularmente os responsáveis pela campanha dos principais candidatos.
Naturalmente, às vésperas do pleito, cada um deles se dizia vencedor, mas isso faz parte da tática eleitoral, não expressa o que efetivamente pensam.
Isso não significa que os três candidatos tenham a mesma avaliação do possível resultado. Serra e Marina não aspiravam a mais do que passar para o segundo turno (ele mais que ela), enquanto Dilma (vale dizer Lula) alimentava a quase certeza da vitória no primeiro turno.
Os dois foram, de fato, os derrotados nesta primeira etapa, ainda que com 47% dos votos.
É que, como se costuma dizer, o segundo turno é outra eleição e muito mais será, neste caso, porque faltam a Dilma experiência e vocação para enfrentar uma disputa como esta.
O resultado final dependerá, em grande parte, do desempenho dela nos debates frente a frente com Serra. Melhor para ela talvez fosse não debater, mas, se se negar a isso, estará admitindo fraqueza e incompetência. Vai ter que encarar.
Isso, porém, não é tudo. Outros fatores pesarão na decisão do eleitor, que vem de uma primeira disputa na qual tomou partido.
A tendência natural seria manter-se coerente com a decisão anterior e votar no mesmo candidato, especialmente no caso de pessoas mais engajadas. Noutras palavras, quem votou em Dilma voltará a votar nela e quem votou em Serra voltará a votar nele.

Mas quem votou em Marina, que está fora do páreo, votará em qual dos dois? Daí a disputa por esses votos ter começado logo em seguida ao resultado das urnas: Dilma e Serra telefonaram para Marina pedindo-lhe apoio na disputa do segundo turno; ela, porém, como fiel da balança, não se comprometeu com nenhum dos dois e afirmou que essa decisão seria tomada numa reunião plenária.
Era esperado que assim respondesse, uma vez que tal decisão envolve muitos interesses a serem examinados e discutidos por ela, pelo Partido Verde e pelos apoiadores de sua candidatura.
Trata-se de uma decisão sem qualquer dúvida importante porque, tendo ela conseguido mais de 19 milhões de votos, pode influir decisivamente no resultado final do pleito, dado esse que implica toda sorte de considerações uma vez que tanto dizem respeito à vitória ou à derrota deste ou daquele candidato quanto ao futuro político da própria Marina.
Conforme seja a sua opção, poderá preservar ou pôr a perder o que conquistou nesta campanha eleitoral.
A decisão é difícil porque envolve comprometimentos e opiniões de diferentes aliados que apelam para seu passado petista ou o repelem, por identificar o petismo com corrupção e atitudes antirreligiosas, sem esquecer os que veem em Serra um aliado mais próximo da defesa do meio ambiente e do respeito aos princípios democráticos.
É difícil ver claro e tomar decisão em meio a tantos fatores conflitantes, mas, afora isso, temos os interesses da própria Marina como uma nova liderança política que desponta e se afirma.

Ela, que até bem pouco era, dentro do Partido dos Trabalhadores, um quadro em conflito com os propósitos desenvolvimentistas de Lula -a ponto de ter sido obrigada a desligar-se do governo e do partido-, encontra-se hoje em condições de contribuir para a derrota eleitoral de seu antigo partido -o que pode significar um golpe mortal no projeto neopopulista de Lula.
Observei, em crônica anterior, que vivemos o fim de uma etapa em que as duas forças políticas surgidas da luta antiditadura esgotam seu ciclo. Pois bem, precisamente neste momento, Marina surge como uma nova opção, uma terceira via entre PT e PSDB -o que aumenta a importância da decisão a tomar.
Em termos imediatos, se apoiar Dilma, estará fortalecendo o partido que lhe fechará o caminho para o futuro; se apoiar Serra, arrisca cindir seu eleitorado e as forças que a apoiam, mas também pode viabilizar seu futuro político.
A terceira opção -manter-se neutra- equivale à primeira, já que ajudaria na vitória do petismo e, ao que tudo indica, no fim antecipado de uma terceira via, sob sua liderança. Hoje deve sair a decisão.
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