domingo, 19 de dezembro de 2010

O bom e o ruim da economia em 2010

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

FOLHA DE SÃO PAULO

As políticas sociais do governo foram benéficas, mas está na hora de rever os estímulos ao consumo

NESTE NOSSO último encontro de 2010 vou alinhar alguns exemplos do que de bom e de ruim aconteceu na economia brasileira neste ano. Não vou seguir um roteiro racional predefinido, mas deixar minha memória comandar essa viagem por este ano que termina.

Escrevo essa observação para não ser cobrado depois por uma hierarquia de valores que não estou construindo ou buscando.

Um primeiro ponto merece ser destacado entre os acontecimentos que marcaram a economia neste ano: saímos muito rápido de uma crise econômica e financeira gravíssima e que dominou boa parte do mundo nesses últimos 12 meses.

No passado, o Brasil sempre esteve no olho do furacão, quase sempre com a desvalorização de nossa moeda contaminando toda a economia e gerando um período de recessão e de desemprego. Desta vez, os efeitos da crise bancária nos Estados Unidos chegaram até nós de forma muito mitigada e foram revertidos em questão de poucos meses. De certa forma, essa nova resistência da economia brasileira às crises externas já tinha aparecido em 1997 e em 1998, quando o colapso das economias asiática e russa trouxe os ventos da tempestade para bem perto de nós. A correção da política cambial em janeiro de 1999 e a implantação do sistema de metas de inflação, logo após, recolocaram a economia rapidamente no caminho da normalidade.
Outro acontecimento deste ano que precisa ser comemorado foi a participação importante das camadas de renda mais baixas nos frutos do desenvolvimento econômico.

Nessa questão, o caso brasileiro precisa ser lembrado por fugir do padrão de outras economias emergentes. As políticas sociais do governo Lula -principalmente os aumentos reais do salário mínimo- fizeram com que os benefícios do crescimento sustentado da economia chegassem de forma mais rápida e mais intensa aos cidadãos de faixas de renda mais baixas.

Costumo dizer que essas políticas funcionaram como um atalho em relação ao caminho longo que tem de ser percorrido nas economias de mercado sem políticas de renda. O Peru é, para mim, um caso exemplar desse caminho alternativo.

Aproveito o gancho desse elogio às políticas sociais para tratar da minha mais contundente crítica em relação à gestão da economia em 2010: o governo já deveria ter revertido sua política de estímulo ao consumo e cuidar dos investimentos, principalmente na infraestrutura econômica.

Para usar uma imagem simbólica, deveríamos ter, em 2010, passado da era das cigarras para a das formigas. Lula termina seu mandato com as mesmas prioridades de quando tínhamos desemprego de mais de 11% da população ativa, uma conta-corrente ainda positiva e uma folga no uso de nosso sistema de estradas, de portos e de aeroportos e de geração de energia elétrica.

Por tudo isso, a grande indagação que terá de ser respondida em 2011 está relacionada a essa mudança de agenda de prioridades do governo federal. Os primeiros sinais das tensões criadas pelo atraso do governo Lula de mudar a gestão da economia já estão visíveis.

A inflação está fugindo do centro da meta do Banco Central, a situação de quase pleno emprego em setores importantes está provocando aumento perigoso dos salários e a conta-corrente externa está chegando a níveis de risco devido à explosão das importações. Outros focos de tensão vão se desenvolver ao longo de 2011, principalmente se ocorrer a recuperação da economia norte-americana na velocidade que espero.
Outra questão mal resolvida pelo governo Lula e que vai certamente marcar o mandato de Dilma Rousseff é a pressão exercida pelas importações sobre a indústria brasileira. Aqui temos outro exemplo de como Lula e sua equipe não entenderam que a evolução natural de uma economia, mesmo quando o crescimento está presente, gera necessidade de mudanças de rumo. A manutenção da mesma rota herdada de seu antecessor pode custar caro a Dilma e a todos nós, brasileiros.

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 68, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso). 
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