segunda-feira, 4 de abril de 2011

Ciência íntegra

FOLHA DE S. PAULO


Uma investigação internacional trouxe à tona, nesta semana, aquele que pode se revelar o caso mais grave de má conduta científica do país. O episódio torna ainda mais evidente a necessidade de efetivar mecanismos de controle, hoje quase inexistentes, contra a manipulação ou fabricação de dados na ciência brasileira.

Um total de 11 artigos publicados no exterior por um dos mais renomados professores de química do Brasil foi suspenso pela editora dos periódicos, sob a acusação de fraude, após submeter os estudos a uma revisão por especialistas independentes.

Colegas do cientista pedem cautela. Argumentam que o pesquisador da Unicamp tem extensa lista de publicações e reconhecida competência na área. De fato, é prudente esperar pela sindicância aberta pela instituição, cuja conclusão ocorrerá em um mês.

Recentemente uma equipe da UnB que tivera trabalhos considerados inválidos, em decisão unilateral da editora semelhante à que desabonou a pesquisa do professor da Unicamp, conseguiu reabilitar seus achados sobre o mal de Chagas. Publicou dois outros artigos, com novos dados.

Injustiças dessa ordem podem acontecer, em especial com cientistas de países periféricos. É urgente, todavia, investir mais na prevenção de fraudes científicas. Cada vez mais competitiva, a ciência não pode deixar de fiscalizar a si própria, de forma rigorosa.

No mundo todo proliferam episódios de manipulação. Nos EUA, casos do tipo aumentaram 161% em 16 anos. É difícil acreditar que não esteja em curso fenômeno subterrâneo similar no Brasil.

O CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), principal órgão federal de apoio à pesquisa, anuncia agora uma comissão de integridade científica. Segundo seu presidente, ela deverá atuar "quando casos assim vierem à tona".

Não basta, contudo, ter apenas o CNPq agindo para investigar os poucos e rumorosos casos que chegam a lume. Universidades e fundações de amparo à pesquisa (como a Fapesp) deveriam também tomar a iniciativa de criar comitês de integridade científica para agir de forma preventiva, com divulgação de preceitos éticos, adoção de punições rigorosas e busca ativa de casos de plágio -talvez a forma mais comum de má conduta no meio acadêmico. 
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