Ela já foi chamada de a mãe de todas as reformas. No mundo ideal, primeiro seriam modernizadas as regras a que se subordinam partidos, políticos e campanhas, para depois chegar a vez de todas as alterações em legislações-chave necessárias para a sociedade brasileira continuar a se desenvolver: da previdência, nos tributos, leis trabalhistas. Mas, como são muitos e conflitantes os interesses que orbitam em torno da vida político-partidária, a alternativa tem sido tratar de questões pontuais, no arcabouço jurídico referente aos partidos e à política, e em leis relevantes que afetam a geração de renda e empregos. Não passou de uma ilusão dar prioridade à execução de uma reforma política perfeita, para facilitar as restantes. É preciso consertar o avião voando.
Há no PT, porém, quem defenda o atalho da constituinte exclusiva, convocada para tratar desta reforma. Seria possível, então, aprovar por maioria não qualificada 50% mais um, em vez de 3/5, como se exige em mudanças constitucionais alterações em temas vitais do ordenamento político-institucional.
Pelo risco que o país correria, não é o caminho indicado. Nas sociedades democráticas estáveis, e de longa quilometragem, é fundamental a segurança jurídica a garantia da inamovibilidade de legislações fundamentais. Daí serem países estáveis e de regimes democráticos representativos longevos. E são assim porque têm segurança jurídica, num círculo virtuoso.
Uma das chaves da estabilidade é não banalizar mexidas na Constituição. É muito simples entender: se o Congresso não consegue reunir, como exigido, 3/5 dos votos em cada uma de suas Casas, em votações em dois turnos, para mudar a Carta, é porque não existe consenso para tal. Elementar.
E nada deve ser feito contra isso. Convocar miniconstituintes para viabilizar propostas sem o consenso exigido é o mesmo que desempatar partidas de futebol com o aumento do tamanho dos gols.
Quando se analisam alguns itens da relação de mudanças na legislação políticoeleitoral, sempre mencionados quando se debate esta reforma, vê-se que há temas muito polêmicos, inadequados a serem tratados em votações sem quorum qualificado.
Um deles, o financiamento público de campanha, ou a estatização de todos os gastos de candidatos e partidos, ideia vendida, de maneira cavilosa, como se fosse a cura infalível do mal do caixa dois. É falso, pois nada garante que a prática da arrecadação do dinheiro não contabilizado deixará de existir. O contribuinte já tem sido obrigado, sem saber, a arcar com os custos de caixa dois de partidos e políticos, financiados pelo sobrepreço embutido em contratos de fornecimento de bens de serviços ao Estado. Corre o risco de pagar duas vezes.
O sensato é dotar a Justiça e o Ministério Público eleitorais de condições de investigar e punir para valer os operadores do dinheiro sujo da política. Não é preciso constituinte para isso. Outro ponto polêmico: a votação em lista fechada. É imperioso perguntar aos eleitores, sem rodeios: vocês aceitam abrir mão de escolher os candidatos e delegar este poder aos caciques partidários? Pode-se imaginar a resposta. E por isso esta é uma proposta que não pode ser votada sem quorum qualificado.
São conhecidas as fragilidades do sistema.
Mas deve-se enfrentá-las sem salvacionismos.
Não precisou constituinte para o avanço histórico da Lei da Ficha Limpa.
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