quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Política industrial do governo Lula fecha o ano sem cumprir as principais metas

ESTADO DE S. PAULO

Em meio à ameaça de desindustrialização, governo faz um balanço dos erros e acertos e discute novo plano para Dilma Rousseff

Alexandre Rodrigues / RIO

Criada em 2008 para coordenar as ações do governo de incentivo à indústria, a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) deve terminar 2010 sem cumprir as quatro principais metas para este ano. Em meio à ameaça de desindustrialização identificada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, o governo faz um balanço dos erros e acertos da política industrial da era Lula e discute novo plano para Dilma Rousseff.

Em vez dos 21% do Produto Interno Bruto (PIB) estabelecidos pela principal meta da PDP, a taxa de investimento fixo na economia deverá fechar 2010 perto de 19% do PIB. A elevação do gasto privado com pesquisa em desenvolvimento, que a segunda meta fixava em 0,65% do PIB, deve se manter em 0,5%.

Outro objetivo, o aumento de 10% no número de micro e pequenas empresas exportadoras, foi prejudicado pelo câmbio desfavorável. Em 2009, houve queda de 4%.

A quarta meta, a de elevar a participação das exportações brasileiras a 1,25% do total mundial, pode até ser alcançada, especula Reginaldo Braga Arcuri, presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI).

A fatia do Brasil nas exportações mundiais pode chegar a 1,35%, mas puxada por produtos primários, que tomaram a liderança dos manufaturados na pauta. Mesmo com a previsão de crescimento de 27% das exportações este ano, a conta deve fechar abaixo do nível de US$ 208 bilhões projetados pela PDP em 2008.

"As metas não servem apenas se foram cumpridas. Servem mais para definir de onde se parte e onde se quer chegar, além de aprender com o que acontece no caminho. Guiam as ações, criam parâmetros de avaliação e dão ao setor privado uma visão clara de para onde o governo quer direcionar o País", diz Arcuri, que participa da secretaria executiva da PDP com representantes de outros órgãos, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Ministério da Ciência e Tecnologia sob a coordenação do Ministério do Desenvolvimento.

Para o governo, as metas foram frustradas pela crise mundial, desencadeada pouco depois do lançamento da atual política industrial.

Escalada. Foi essa a explicação que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ouviu do BNDES, principal instrumento do plano. A recuperação da taxa de investimento, a principal meta da PDP, foi o motivador da recente escalada de desembolsos do BNDES.

Turbinadas por empréstimos do Tesouro, as liberações do banco saltaram de R$ 92,2 bilhões em 2008 para R$ 137 bilhões em 2009 e devem ultrapassar R$ 146 bilhões este ano, com ênfase no financiamento de bens de capital. Mesmo assim, só foi possível até agora recompor o nível de 2008 do investimento. Segundo projeções do banco, a meta de 21% do PIB só será superada entre 2012 e 2013.

"A crise internacional não é nenhuma desculpa, é um fato concreto. Na formulação da PDP, todas as curvas estavam com vetores para cima e eles caíram perpendicularmente", diz o presidente da ABDI. "A recuperação em V mostra que os fundamentos da economia estão sólidos. Houve a retomada da trajetória anterior, mesmo que não tenhamos a recuperação em números absolutos."

O governo ainda não fechou um balanço das metas da política industrial, cujos resultados só devem ser medidos no início de 2011. No entanto, técnicos dos órgãos envolvidos nas ações da PDP trabalham num relatório de avaliação do que foi conseguido até agora. O documento deve ser entregue pelo ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, à presidente eleita, Dilma Rousseff, com sugestões para a formulação de uma política industrial para o novo governo.

Além de reformular as metas, a ideia é intensificar a interação com o empresariado e agregar categorias como a cadeia produtiva do trigo, a indústria de brinquedos e a de eletrônicos de consumo (como televisores, celulares e aparelhos de som) aos setores econômicos definidos como prioritários pela PDP.

Nos últimos dois anos, setores como os de carnes, software, petroquímica e fármacos receberam incentivos do governo para financiar investimentos, internacionalização e operações de consolidação.

PARA ENTENDER
Segundo plano industrial falha, mas continua

A PDP foi o segundo plano industrial do governo Lula. Deu lugar à Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), de 2004, ao estabelecer um sistema de metas que guiou a articulação entre órgãos de governo e o meio empresarial em favor da competitividade da indústria. A avaliação no governo é de que, mesmo sem atingir as metas, a PDP foi um instrumento acertado, que deve ser reproduzido na gestão Dilma. A determinação para que a proposta de um novo plano fosse deixada para a próxima gestão veio da própria presidente eleita, ainda como ministra da Casa Civil. O pedido foi reiterado pelo presidente Lula ao BNDES, numa reunião na sede do banco em abril.
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