sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Inflação: o jogo está feito!


Luiz Carlos Mendonça de Barros
FOLHA DE S. PAULO

Com a definição dos cortes no Orçamento de 2011, o governo Dilma se diz preparado para enfrentar a aceleração da inflação que já assusta os mercados. Essa é uma herança do último ano do período Lula, quando todos os instrumentos possíveis foram usados para estimular o crescimento e, com isso, ganhar as eleições do ano passado.

A expansão agressiva do crédito nos bancos públicos -principalmente no BNDES- e uma expansão "nunca vista neste país" de gastos do governo fizeram com que a economia entrasse em 2011 com a inflação ameaçando o limite superior do sistema de metas.

A decisão de agora faz parte do plano de batalha estabelecido pelo Banco Central na última reunião do Copom: aumento moderado dos juros Selic, medidas administrativas para reduzir a expansão do crédito bancário e redução dos gastos do governo. Com esse elenco de medidas, o Banco Central acredita que 1,5 ponto percentual de aumento dos juros será suficiente para estabilizar a inflação em 4,5% ao ano ao longo de 2012.

Embora fazer uma avaliação das chances de isso ocorrer seja hoje muito difícil, vou pelo menos tentar trazer ao leitor da Folha algumas certezas que tenho. Aprendi com a vida que, em uma situação de insegurança, como a que vamos viver nos próximos meses, é importante definir o que pode ser previsto e deixar o resto apenas no campo das alternativas.

Em primeiro lugar, podemos esperar mais dois aumentos de 0,5 ponto nos juros Selic nos próximos três meses. Com a decisão de reduzir os gastos do governo, o BC perdeu a capacidade de surpreender o mercado com uma política de juros mais agressiva. E, se o BC sentir necessidade de reduzir ainda mais o crescimento do crédito bancário, deverá utilizar -mais à frente- medidas administrativas para fazê-lo.

Outra questão que foi respondida de forma clara com a decisão de corte do Orçamento diz respeito ao compromisso da nova presidente com o controle da inflação. Da mesma forma que Lula sempre liberou o BC para agir nesses momentos, Dilma dá agora sinais claros de seguir essa mesma cartilha.

Outra informação de natureza política que pode ser extraída desse evento é a de que o ministro Palocci realmente está por trás da ação do governo sobre a economia, deixando para o ministro Mantega a missão de porta-voz.

Aliás, esse é outro ponto que deve causar problemas à frente. Até as pedras sabem que, para combater a aceleração da inflação no Brasil de hoje, será preciso uma forte redução do ritmo do crescimento econômico.

E digo isso não por masoquismo ou revanchismo político, mas, sim, por um simples raciocínio econômico básico. Existe um forte componente de excesso de demanda -sempre em relação à oferta existente- na dinâmica da inflação de hoje.

E, o que é pior, um dos canais mais relevantes nesse processo -como tenho afirmado neste espaço- tem sido o mercado de trabalho. Sabemos pela experiência de outros países que, quando a situação de escassez de mão de obra qualificada se estabelece no mercado de trabalho, em uma situação de demanda pressionada, podemos estar entrando em uma região em que o aumento da inflação pode passar a ser exponencial.

Por isso, os comentários do ministro da Fazenda, ao tornar pública a decisão sobre o Orçamento de 2011, são perigosos. Ao garantir que os cortes não vão reduzir o crescimento deste ano -e que, segundo sua previsão, será de 5%- de duas, uma: ou a decisão tomada não é para valer, ou ele está falando da economia em Marte.

Não por outra razão vários analistas do mercado financeiro vêm expressando a opinião de que os cortes não serão totalmente realizados.

Esse ceticismo acaba por diminuir a eficiência das medidas adotadas, pois elas dependem da confiança dos agentes econômicos para serem bem-sucedidas. O ministro deveria pelos menos reconhecer a necessidade de uma moderação no ritmo da economia para acomodar as tensões inflacionárias. As coisas ficariam mais fáceis.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, 68, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).


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