terça-feira, 4 de janeiro de 2011

À beira do precipício

JORGE LUIS PAZ
O GLOBO

Doze são muitos anos para um governo. Em dezembro de 1998, Chávez ganhou a Presidência. Triunfo que se poderia esperar à luz dos desastrosos últimos governos e da lamentável campanha dos partidos tradicionais. Mas o bom médico não é o que mais denuncia e rechaça a doença, mas o que sabe curar.

Diante dos lugares-comuns dos golpistas e de uma esquerda incapaz de entender as razões da queda do Muro de Berlim, afirmamos em artigo em "El Universal", três meses antes da vitória eleitoral chavista, que iríamos em direção a uma espécie de suicídio coletivo.

Lamentavelmente, a realidade foi muito pior que nosso temor. Incapazes de aprender com seus próprios erros, finalmente tiraram a máscara: aceleram a implantação do que Raúl Castro chama de precipício sobre o abismo. Ou retificamos o rumo ou afundamos, disse Castro, reconhecendo erros graves que, segundo ele, são consequência do excessivo enfoque paternalista, idealista e igualitarista que a revolução instituiu, em nome da justiça social.

O mesmo se quer implantar aqui, apresentando como o paraíso da felicidade o precipício que leva ao abismo. Modelo ruim para o povo, mas com dose suficiente de ilusão para permitir a perpetuação no poder. Na Venezuela, a esperança virou cinzas após 12 anos de promessas não cumpridas.

Inflação em alta, atividade produtiva em queda, corrupção descarada, gestão governamental inepta, insegurança e crimes sem freio, perseguição e obstáculos contra o que não seja o partido único e seu governo; já não há propaganda que oculte o desastre.

Doze foram os anos de democracia na Venezuela entre 1958 e 1970, quando no governo se sucederam cinco presidentes: Larrazábal, Sanabria, Betancourt, Leoni e Caldera. Distintos e discutíveis, mas, alinhavando o mesmo tecido da democracia, conseguiram o que nunca tivera o país em um século e meio de independência.

Com o preço do petróleo a menos de 10% do atual e sem o imposto sobre o consumo (IVA), alfabetizou-se como nunca, multiplicaram-se as escolas, os serviços de saúde, a segurança pública, as universidades abriram suas portas a estudantes sem recursos, desenvolveram-se as indústrias básicas, empresas para substituição de importações, cresceu o emprego urbano, acelerou-se a construção de moradias baratas e chegaram às aldeias reforma agrária, eletricidade e estradas rurais. Tudo isso com inflação muito baixa e alto crescimento sustentado, apesar da crise de 1959-61. A corrupção não era nem sombra da atual e os governos que perdiam eleições entregavam o poder aos opositores.

Certamente, em 1998 reinava a indignação e, devido à ruína e à irresponsabilidade das elites, triunfou a esperança da maioria. Os pobres se sentiram de novo no centro da política e do afeto do presidente, coisa importante e prometedora. Mas, longe de governar, se proclamou a revolução palavrosa e o núcleo ditatorial do fracassado golpe militar se reforçou com a ditadura do proletariado, quer dizer, ditadura do partido e de seu caudilho único.

Este híbrido de imposição militar e de estatismo de partido único, sem divisão dos poderes do Estado, não pode levar senão ao precipício anunciado por Raúl Castro. A aprovação noturna de uma série de leis anticonstitucionais não fez mais do que pôr a descoberto as cartas ditatoriais já conhecidas. Habilitar o presidente até 2012 para que a Assembleia Nacional não possa legislar é claramente ilegítimo e vai contra a Constituição bolivariana vigente e os direitos fundamentais.

Os democratas, que representamos mais de 80% dos venezuelanos chavistas e não chavistas, temos a difícil tarefa de seguir defendendo a Constituição democrática e não reconhecer as leis que as violam. Não queremos um governo inepto e ditatorial empenhado em jogar o país no precipício cubano.

Espera-nos um ano duro, mas a criatividade dos democratas corajosos deverá encontrar caminhos de vida e de esperança que, aos gritos, pede o país.
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