domingo, 27 de março de 2011

O DNA do bom chefe e a arte de demitir


Por Jack Welch com Suzy Welch
Exame.com.br


É possível treinar as pessoas para que sejam líderes eficazes ou, na sua opinião, os melhores líderes já nascem prontos?
Pergunta feita por Romário Mendes Vargas, diretor de uma transportadora, Brasília, Brasil

Para algumas pessoas, saber se o indivíduo já nasce líder ou se ele se torna líder é uma questão puramente intelectual, que rende boas discussões na sala de aula ou durante um jantar social. Mas, para pessoas que trabalham na linha de frente como você, que precisa decidir quem será contratado, promovido ou demitido, saber se determinado indivíduo tem o perfil certo para chefiar é sem dúvida algo muito mais urgente. Portanto, responder corretamente a essa questão pode levar a cultura e o desempenho da empresa a novos patamares. Respondê-la de forma equivocada produzirá o efeito contrário. Então, qual é a resposta? Como se trata aqui da vida real, é claro que nada é óbvio ou simples. Existem traços de liderança que são inatos, fabulosos e extremamente importantes. Por outro lado, há dois outros traços que podem -- e, na verdade, devem -- ser desenvolvidos com treinamento e com auxílio da experiência.

Mas, antes de prosseguir, reflitamos um pouco sobre nossa definição de liderança. Ela compreende cinco características essenciais. Entre elas, convém ressaltar, não incluímos a integridade, que é um requisito de qualquer posição de chefia. Tampouco a inteligência, um item igualmente indispensável para quem quer participar de um mercado global complexo como o atual. Deixamos de fora também a maturidade emocional, outra exigência indispensável. Essas três características são pressupostos básicos. Com base em nossa experiência, o primeiro traço fundamental do líder é a energia positiva -- a capacidade de seguir sempre adiante impelido por uma disposição sadia e muito otimismo nos bons e nos maus tempos. O segundo é a capacidade de motivar os outros, fazendo com que liberem sua energia positiva. O terceiro é a determinação -- a capacidade de tomar decisões difíceis, de dizer "sim" ou "não" sem titubear. O quarto traço é o talento para executar -- ou, simplesmente, fazer o que tem de ser feito. Por fim, o líder é um sujeito apaixonado. Ele se envolve, transpira, acredita.

Bem, já deve ter dado para perceber que energia positiva e capacidade de motivar são duas coisas indissociáveis, e que dizem respeito sobretudo à personalidade. A paixão também é congênita. Há pessoas de uma intensidade enorme, que parecem transbordar de curiosidade. Amam naturalmente os outros, a vida e o trabalho. Está nelas. Elas são isso. Já determinação e capacidade de execução são coisas diferentes. Novos contratados raramente vêm com esses traços já burilados. Aliás, a média gerência também pode aprender muito exercitando-se nesses dois aspectos. O melhor professor, porém, é a guerra de trincheira. Isso porque determinação e execução decorrem, em boa parte, da autoconfiança.

Você dirá "sim" ou "não" com muito mais segurança depois de tê-lo feito diversas vezes e observado o efeito benéfico desse comportamento objetivo. De igual modo, somente perante os desafios do mundo real é que um homem de negócios percebe de fato como é importante agir com rapidez, obter as respostas desejadas e premiar os resultados. Se, porém, falhar na execução, as conseqüências não tardarão a vir -- esse é o tipo de erro que a maior parte dos líderes eficazes não comete duas vezes. Mas, afinal, o líder nasce pronto ou se faz? A resposta, talvez já esperada, é que ambas as premissas são verdadeiras. Portanto, a melhor estratégia consiste em contratar profissionais dotados de energia, que saibam motivar os outros e que sejam movidos pela paixão. Dedique-se de corpo e alma ao treinamento e ao aperfeiçoamento da determinação e da execução. Promova aqueles que apresentem uma boa dose de todos os cinco traços. Lembre-se sempre, porém, de que nem todo mundo nasceu para ser líder. Mas a partir do momento em que você se torna um deles -- e esse é o seu caso -- é sua obrigação identificar e desenvolver aqueles que nasceram para liderar.

Somos uma empresa pequena com vários problemas típicos de quem está começando. Nossa maior dificuldade no momento é o "Mark", um dos diretores. Ele acabou de pôr por terra um grande projeto. Acho que ele devia ser demitido, porém sua ausência terá um impacto muito forte. Seu estilo sofrível de administração tornou-se insustentável. Ele acha que os serviços prestados nos últimos dez anos à companhia deveriam pesar a seu favor. Concordo até certo ponto, mas acho que o desempenho é mais importante. O que deveríamos fazer?
Pergunta feita pelo diretor de uma pequena empresa de serviços industriais, Johannesburgo, África do Sul

Pequenas empresas sempre têm muita dificuldade em demitir. Já nas grandes os incompetentes são tolerados por um bom tempo porque não falta gente para encobrir seus erros. E, quando um deles é convidado a sair, geralmente o faz por uma porta lateral sem grandes traumas para o indivíduo, para a empresa ou para as atividades da companhia. Nas pequenas empresas, ao contrário, os erros dos maus profissionais geralmente derrubam os lucros com muita força e rapidez. O pior é que, quando chega o momento de despedi-los, parece difícil fazê-lo de um modo impessoal.

Quando alguém sai, é como se uma pessoa da família tivesse morrido. Isso sem falar nas conseqüências para o negócio. Mesmo que o funcionário demitido seja um sujeito com mais pontos negativos do que positivos, sua demissão pode ter efeitos bastante perversos sobre as operações e interferir nas relações com os clientes. Apesar disso, você sabe muito bem lá no seu íntimo que o "Mark" não pode mais continuar na empresa. A verdade é que existem apenas quatro tipos de executivo no mundo, divididos entre si pelo grau de desempenho de cada um -- isto é, pelos resultados apresentados -- e pelo esforço que demonstram em transmitir bons valores, como honestidade e atenção para com o cliente.

Os que apresentam bons resultados e praticam valores positivos são fáceis de lidar. Esses devem ser elogiados e recompensados sempre que possível. Já aqueles que apresentam resultados ruins mas cultivam valores positivos merecem outra chance, talvez em outro cargo dentro da empresa. O terceiro tipo de executivo, bom de resultados mas pobre de valores, é o que costuma destruir a empresa. Ele produz os números que lhe pedem, mas quase sempre nas costas dos outros. Maus profissionais dessa espécie geralmente ficam tempo demais na empresa, minando o moral e a confiança da equipe. Mas esse não é o seu problema.

O "Mark" se enquadra no quarto tipo de profissional: o que apresenta desempenho medíocre e valores insatisfatórios. Com esse, é mais fácil de lidar. Você mencionou, por exemplo, que ele cultiva interesses próprios em paralelo aos da empresa. Como se não bastasse ter posto por terra um projeto importante, ele está preocupado consigo mesmo e faz política dentro da companhia. Mark se diz "leal", mas não é o que parece. Você precisa entender que o jogo acabou. Talvez o know-how técnico do "Mark" faça falta enquanto não houver quem o substitua, mas no momento em que você tomar coragem e cortar os laços dele com a empresa certamente vai se perguntar por que demorou tanto a fazê-lo.
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