"O segredo de uma mudança bem-sucedida é convencer todos os funcionários dos benefícios que eles terão com ela"
Max Gehringer diz a verdade com bom humor e muito talento. Faz o retrato fiel das relações interpessoais no dia-a-dia das grandes corporações. Não diz apenas o que pensa, fala sobre o que conhece. Afinal, passou por empresas com a Pepsi-Cola, Elma Chips e Pullman/Santista. Em 1999, foi eleito um dos 30 executivos mais cobiçados do mercado. Hoje é colunista das revistas VIP, Você e Exame. O jornalista e consultor participou, no início do mês de abril, em Florianópolis (SC) do Fórum Excelência 2003 - um passeio pelo mundo dos negócios. Falou sobre uma de suas especialidades: "A comédia Corporativa". Em entrevista ao PortalQualidade.com, ele fala sobre suas idéias e sobre o problemas das organizações.
Equipe Editorial: Quais são os maiores problemas que o senhor detecta nas grandes corporações, no que se refere ao relacionamento interpessoal?
Max Gehringer: Os motivos são muitos, mas, se a gente espremer bem, acaba ficando com um: a quantidade de funcionários preocupados consigo mesmos e sem nenhuma consideração para com os colegas. Quanto mais gente assim uma empresa tiver, pior será o clima interno. Mas, alguém perguntaria, se essas pessoas são tão chatas e ficam envenenando o ambiente, por que a direção da empresa não as demite? Porque eles interessam à direção da empresa. São pessoas que, pensando na própria carreira, não medem esforços para conseguir resultados. E elas foram recrutadas exatamente por serem o que são, totalmente focadas na realidade prática e insensíveis aos sentimentos alheios. É bom para a empresa, é bom para elas e é péssimo para quem quer fazer da empresa um lugar de convivência agradável.
Equipe Editorial: No seu entender, o que é uma boa empresa para se trabalhar?
Max Gehringer: A que proporciona duas coisas: a primeira é a liberdade para o funcionário ser criativo e participativo. E a segunda é uma premiação, além do salário normal, proporcional aos resultados da empresa. A soma das duas coisas faz com que o funcionário se sinta alguém importante dentro da organização, mesmo que execute tarefas simples e que não demandem muito estudo.
Equipe Editorial: Qual o segredo para se diferenciar num mercado competitivo?
Max Gehringer: Essa é pergunta cuja resposta é tão velha quanto o próprio mercado: "ser melhor que a concorrência". Como a concorrência por uma boa vaga no mercado de trabalho está cada vez mais acirrada, diferenciam-se dos demais aqueles que estão mais atualizados. Os que têm boa escolaridade, falam outros idiomas de forma fluente, sabem usar todas as ferramentas que a informática proporciona e - como qualquer produto, já que no fundo todos nós somos produtos ofertados ao mercado de trabalho - os que sabem como administrar seu marketing pessoal. Isso significa ser visível, ser apreciado e ser o primeiro nome a ser lembrado na hora de uma promoção.
Equipe Editorial: O que é preciso fazer para se manter no mercado?
Max Gehringer: Atualizar-se constantemente. Eu conheço muita gente que diz "Ah, meu problema é que eu passei dos quarenta anos...". Isso só é um problema para quem perdeu tempo. Toda vez que alguém me escreve reclamando da "discriminação por idade", lá pelas tantas o escrevente acaba confessando: "É verdade que eu precisaria dar uma melhoradinha no meu inglês...". Estamos em uma época em que estudar virou uma atividade que não tem mais fim, como tinha há vinte anos atrás, quando a pessoa se formava e dava uma relaxada. Hoje em dia, relaxou, dançou.
Equipe Editorial: O que está sendo mais valorizado hoje: o conhecimento teórico ou a experiência?
Max Gehringer: As duas coisas, desde que venham juntas. Quem só tem uma base teórica, mesmo que muito boa, vale três ou quatro reais por hora no mercado de trabalho. E quem tem vinte anos de experiência, com muita prática e pouca teoria, vale mais ou menos o mesmo. Mas, ao se juntar as duas coisas, o valor da pessoa sobe exponencialmente.
Equipe Editorial: O que é ser um funcionário de talento?
Max Gehringer: Talento significa "fazer alguma coisa melhor que qualquer outro colega". Nas empresas, tem gente com talento para negociar, com talento para entender programas de computador, para entender o mercado financeiro, com talento político, e assim por diante. O que faz um talento ser reconhecido por uma empresa é algo muito simples: o quanto esse talento pode ser usado em benefício da própria empresa. Uma vez, eu tive um funcionário com um talento anormal para escrever. Cada memorando que ele mandava era uma aula de literatura. E eu sugeri que ele saísse da empresa e fosse para algum lugar - um jornal, talvez - onde aquele talento pudesse ter uma aplicação prática. Porque ali, na empresa, infelizmente, "escrever melhor que todo mundo" não gerava um centavo a mais de lucro.
Equipe Editorial: É possível formar uma equipe somente com pessoas talentosas?
Max Gehringer: É, desde que cada um saiba o seu lugar. Pessoas muito talentosas tendem a ser individualistas. Quando colocadas num grupo, destoam. E aí o risco é ver o talento ser sufocado pelo sistema, ou pela inveja alheia. Um bom líder é como um técnico de futebol: ele tem menos talento futebolístico que qualquer um de seus jogadores, mas sabe arranjar e ordenar a equipe para que cada um de seus talentos brilhe na hora certa. Com liberdade para criar, mas sem nunca esquecer que todos fazem parte de um conjunto que precisa atuar com harmonia e com uma certa dose de sacrifício em benefício do resultado final.
Equipe Editorial: Para enfrentar o dia-a-dia nas grandes corporações, a melhor saída é o bom humor?
Max Gehringer: Eu não diria isso. O bom humor é um ingrediente importante, mas não é o prato principal. Sem bom humor, o ambiente fica ácido demais, ou azedo demais. E, como qualquer ingrediente, o bom humor também deve ser usado na dosagem certa. Exagerou, vira caricatura. Mas, tão importante quanto o bom humor, há outros ingredientes: respeito e integridade pessoal, por exemplo. Pegue um ambiente onde todos se respeitam, todos são íntegros, todos são motivados, e adicione uma pitada de bom humor. O resultado será o tipo do lugar onde todo mundo vai querer trabalhar.
Equipe Editorial: Como o profissional pode se prevenir e ficar atento para não ficar obsoleto?
Max Gehringer: Lendo. Quem abre um jornal, ou acessa um site, ou lê uma revista especializada, percebe instantaneamente se está atualizado ou obsoleto: é só ver quantos termos, ou conceitos, lhe são estranhos ou desconhecidos. "Ler e procurar entender" é uma dica simples, mas a maioria das pessoas faz o contrário: quando vê uma palavra esquisita, pula para o parágrafo seguinte. E cada um desses pulos é um salto rumo à obsolescência.
Equipe Editorial: A inovação e a melhoria contínua são características das organizações bem-sucedidas no mercado atual. De que forma os profissionais precisam se preparar para enfrentar esse mercado?
Max Gehringer: Quando a empresa manda vinte funcionários fazer um curso de aperfeiçoamento, o que eles devem ter em mente é que a obrigação da empresa termina quando o curso acaba, mas a obrigação de cada um continua depois disso. Quem delega 100% do próprio desenvolvimento para a empresa está correndo um risco danado, o de ser substituído por quem soube se preparar melhor por conta própria.
Equipe Editorial: Como a liderança deve agir para eliminar da equipe a cultura do direito adquirido? Como as organizações devem agir para se manterem competitivas e não ficarem obsoletas, se a equipe tem resistência a mudanças?
Max Gehringer: Resistência a mudanças é uma das coisas mais antigas do mundo. Jesus foi crucificado porque representava uma mudança, e essa palavra é quase sempre associada à "ameaça". Quem é a favor das mudanças? Quem tem menos a perder. Quem é contra? Quem já conseguiu acumular alguma coisa - cargo, dinheiro, poder - e tem medo de ficar sem uma parte disso. O "direito adquirido" é, portanto, um mecanismo de defesa de quem já batalhou muito e conseguiu alguma coisa. O segredo de uma mudança bem-sucedida é convencer todos os funcionários dos benefícios que eles terão com ela. Quando a empresa impõe uma mudança, ou falha ao explicá-la adequadamente, as resistências aparecem imediatamente.
Entrevista concedida com exclusividade para a equipe editorial do PortalQualidade.com..
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