terça-feira, 22 de março de 2011

De eisenhower@edu para obama@gov


ELIO GASPARI
FOLHA DE SÃO PAULO

Na campanha de 2008 o senhor dizia que "nós podemos", mas eu lhe pergunto: podemos o quê?

SENHOR PRESIDENTE,
Outro dia acompanhei o Juscelino Kubitschek numa caminhada pela avenida Rio Branco. Ela passa ao lado do Teatro Municipal, onde o senhor discursará, depois de desistir de um comício blindado. Há 50 anos eu e JK fizemos esse percurso num carro aberto, sob uma chuva de papéis, confetes e serpentinas. Disseram que a cidade antecipara o Carnaval. Nas calçadas, o povo acenava com bandeirinhas de "We Like Ike". (Esse apelido pegou. Até o Stálin me chama de Ike.)

Dói ver as restrições a que submetem o senhor, Michelle, Malia e Sasha. Nos oito anos que fiquei na Casa Branca, de 1953 a 1961, nunca passei por coisa parecida. Na minha passagem pelo Rio só me assustei quando um sujeito fardado veio na minha direção com uma enorme espada. Era um general, saudando-me. Os estudantes estenderam uma bandeira no seu prédio dizendo que "We Like Fidel". Eu lhes fiz um aceno. Espero que o senhor Castro não apareça por aqui tão cedo porque não o tolero e pretendo evitá-lo. Até com o Mao Tse-tung convivo bem, apesar de sua presença ser desconfortável, pois não toma banho nem escova os dentes. Faço-lhe uma confidência: ele e o general De Gaulle ficaram muito amigos e estão escrevendo um livro a quatro mãos.

Soube que há gente comparando seu novo estilo na Presidência com o meu. Eu cheguei à Casa Branca como general, depois de comandar os exércitos aliados na maior guerra da história. Sim, nós vencemos. O senhor chegou com uma currículo de coronel, dizendo que "sim, nós podemos". Eu acabei com uma guerra que ninguém poderia vencer, na Coreia. O senhor herdou duas, ambas sem vitória possível. Eu teria acabado com elas no primeiro ano de mandato. Podemos o quê? Quero propor-lhe um cenário de crise.

Imagine-se no auge da campanha de 1956, sabendo que a Inglaterra, França e Israel atacaram o Egito para tomar-lhe o controle do canal de Suez. Dois dias antes da eleição, tanques da União Soviética invadem a Hungria, depõem o governo, cujo primeiro-ministro será enforcado, e matam 2.500 pessoas. Eu tivera um infarto, operara o intestino e o secretário de Estado acabou no hospital, com um câncer no estômago.
O que fiz? Nada. Condenei as duas invasões.

Às vezes, fazer nada, ou o mínimo, parece difícil, impossível mesmo. A oposição democrata achava que podíamos entrar em pelo menos uma dessas brigas. Havia até um professor, Henry Kissinger, acreditando que seria possível usar armas atômicas em guerras limitadas. Disso eu entendo, era maluquice. Nós ganharíamos a Terceira Guerra evitando-a. Diante do terror nuclear, no qual se estimava que morreriam 65% dos americanos, eles supunham que poderiam começar um conflito no estilo doce e suave do que houve entre 1939 a 1945. Guerra é o inferno, não é um brinquedo, como os videogames dos meus bisnetos.

Uma coisa é fazer o mínimo quando a valentia pode levar a um desastre, bem outra é não usar a força quando ela é o meio adequado de dissuasão. Um ano depois de não fazer nada na Europa e no Egito, eu mandei a 101ª Divisão de Paraquedistas para Little Rock, onde o governador se recusava a cumprir uma decisão da Corte Suprema que mandava acabar com a segregação racial nas escolas. Tem gente que acha que esse tipo de passo foi dado pelo meu sucessor, John Kennedy. Paciência.

Presidente Obama, acredite: o mais difícil é descobrir quando nós não podemos. Só não digo que esse foi o erro de seu antecessor porque o 11º mandamento determina que um republicano não fala mal de outro.

Finalmente, um pedido. Kubitschek contou-me que um brasileiro interessado em obter um visto para visitar os Estados Unidos precisa esperar 105 dias para a entrevista no nosso consulado do Rio. Em Brasília são 134 dias e em São Paulo, 107. Acabe com essa incompetência estrutural. Não devemos esconder inépcia atrás da máscara da arrogância. Isso, nós podemos.

Mamie recomenda-se a Michelle e despeço-me, como seu obediente soldado.
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