Pesquisador revela que os estudantes dos MBAs dos EUA são os campeões das falcatruas escolares. Enquanto isso, em Pindorama...
A notícia correu pela imprensa de negócios anglo-saxônica e aportou nas páginas locais do jornal Valor Econômico. “Estudantes de MBA são os maiores trapaceiros”, bradava a manchete importada do Financial Times. A matéria foi baseada em estudo conduzido por Donald McCabe, um professor da Rutgers University. Há anos fascinado pela questão da ética nos negócios (coisa que os mais cínicos duvidam que exista), ele realizou uma pesquisa junto a 5.300 estudantes de pós-graduação de 54 instituições de ensino superior nos Estados Unidos e Canadá, incluindo mais de 600 alunos de escolas de negócios. Foco central: as pequenas trapaças que movimentam o cotidiano escolar – plágio, compra de trabalhos, cola e outros ardis. Resultado: os “vencedores” foram os estudantes dos MBAs – 56% deles admitiram trapacear. Mas eles não ficaram sozinhos no pódio. Logo abaixo vieram os estudantes de Engenharia (54%) e os de Ciências (50%). Os mais honestos, segundo a mesma pesquisa, são os cientistas sociais (39%). Para piorar o quadro, suspeita-se que os números reais sejam maiores e provavelmente ainda mais críticos em cursos de graduação. Questão óbvia: serão as pequenas trapaças ensaios para a “flexibilidade moral” que movimenta grandes negociatas? Talvez.
McCabe declarou-se surpreso não somente com os altos índices encontrados, mas também com a candura com que os estudantes admitiram seus feitos. O pesquisador acredita que a maior razão para um estudante trapacear é a percepção de que seus colegas são desonestos. Em um ambiente hipercompetitivo, característico das instituições de ensino superior norte-americanos, no qual o desempenho acadêmico pode definir os rumos da carreira, ninguém quer ficar para trás.
Solução à vista? McCabe acredita que as escolas precisam implantar códigos de ética mais rígidos, que balizem os comportamentos. Ocorre que as próprias escolas não são exemplos de candura. Matéria recente do semanário The Economist comenta práticas nada edificantes de algumas das mais renomadas instituições de ensino norte-americanas. De olho no prestígio e em doações, elas atraem celebridades e disputam filhos de bilionários. Sem tais expedientes, insinua o semanário britânico, alunos de nível “C”, tais como George W. Bush e John Kerry, não freqüentariam as escolas de elite.
Se o manto da meritocracia, traço forte da cultura norte-americana, revela fissuras preocupantes, qual seria a situação na “flexível” Pindorama? Lívia Barbosa, autora do clássico O Jeitinho Brasileiro (Editora Campus), acredita que a “cola” é uma peça estrutural da vida acadêmica brasileira. Entre nós, nem os alunos nem os professores a consideram falta grave. Enquanto nos Estados Unidos os artifícios são usados individualmente, em razão da acirrada competição, aqui a atividade é solidária, prova de coesão e amizade entre os estudantes. Para a antropóloga da Universidade Federal Fluminense, os alunos brasileiros colam e compram trabalhos prontos (alimentando uma verdadeira indústria paralela) porque é mais “econômico”. Estudar, raciocinam os matreiros, rouba tempo precioso de lazer. E, já que não há punição ou sentimento de culpa, a relação custo-benefício torna-se imbatível. Lívia considera que o fato é especialmente preocupante nas universidades e escolas públicas, nas quais os estudantes são custeados pela sociedade, porém, não se dão conta do privilégio e não agem à altura.
As idiossincrasias não param por aí. Muitos profissionais procuram MBAs e similares como quem recorre a uma cirurgia plástica, e se põem a pagar em prestações a “reforma” de seu desprezado diploma de graduação. Fixam-se no certificado como objetivo final e perdem oportunidades de troca de experiências e de aprendizagem. Preferem os atalhos rápidos ao estudo sério.
Entretanto, deve-se reconhecer que os estudantes não são os únicos desviantes. Freqüentemente, se estabelece um pacto tripartite de mediocridade: de um lado, entram os alunos, com notória inventividade para ações fraudulentas; de outro, apresenta-se um seleto grupo de mestres, acometidos por moléstias professorais típicas que os levam a cozinhar aulas, enrolar conteúdos ou torturar suas vítimas com demandas incompatíveis; fechando o delirante acordo, comparece a gestão das escolas, que, com assombrosa freqüência, tem pouco interesse em contrariar professores ou alunos e exime-se de suas responsabilidades. O resultado é a perpetuação do que se vê nas salas de aula: uns fingem que ensinam, outros fingem que aprendem. Quem paga a conta? Todos nós.
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