terça-feira, 22 de março de 2011

PARECE APAGÃO

APAGÃO DO SETOR PÚBLICO
Victor Martins, Gustavo Braga e Sìlvio Ribas
Correio Braziliense  

Energia elétrica, aviação, telefones... tudo vai mal

Ineficiência na gestão e falta de investimentos em infraestrutura deixam o brasileiro na mão

A gestão pública no país tem oferecido desde o começo do ano uma série de provas de ineficiência generalizada. Entre elas estão cortes no fornecimento de energia, colapsos na telefonia, atrasos de voos, panes nos sistemas da Receita Federal e do departamento de trânsito (Detran), além de episódios de claro desperdício de dinheiro. A falta de investimentos suficientes em manutenção e renovação da infraestrutura de estatais e entidades acabou impedindo, por diversas vezes, o brasileiro de usufruir de serviços essenciais. 

A falta de planejamento no gerenciamento de sistemas e bancos de dados é tanta que o próprio governo tem dificuldades em informar quantos servidores públicos e terceirizados trabalham na administração pública. Essa confusão levou o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) a pagar a mais para 79.846 aposentados que recebem pensão, no período de 2005 a 2008. Uma falha no monitoramento expressivo de 17,9 milhões de benefícios por incapacidade gerou esse rombo, estimado em R$ 160 milhões. 

Uma mostra mais recente da fragilidade do setor público ocorreu no último 2 de março. Uma pane no Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), estatal subordinada ao Ministério da Fazenda, deixou de mãos atadas quem tentava enviar a declaração do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) 2011 ou queria resolver pendências com o Detran.

O transtorno foi fruto de uma simples falha no sistema para impedir oscilações na corrente de energia elétrica, que derrubou a rede de computadores das operações do Serpro em São Paulo. Para solucionar o problema foram gastos R$ 6 milhões. A estatal garante que os gastos de manutenção foram realizados, cerca de R$ 100 milhões na média anual de 2007 a 2010. Apesar disso, a reforma da estrutura física dos centros de dados não foi privilegiada.

Para evitar problemas semelhantes, a Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social (Dataprev), vinculada ao Ministério da Previdência, já avisou que está investindo R$ 180 milhões na administração digital dos seus cadastros. Atualmente, as máquinas da estatal hospedam o impressionante número de 14 bilhões de registros.

Risco permanente
Outros serviços continuam expostos à falta de organização e cuidado com o patrimônio. Em virtude dos constantes apagões, de diferentes portes, registrados em 2010, distribuidoras de energia elétrica foram obrigadas a pagar R$ 152,4 milhões aos consumidores como compensação por falta de luz.

O valor global consta em um balanço parcial da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), os eventos considerados graves tiveram um salto nos últimos dois anos. Foram 91 grandes desligamentos no ano passado, 77 no ano anterior e 48 em 2008. Para especialistas, é tudo consequência da falta de investimentos e do clima adverso.

Apenas este ano, o país enfrentou dois gigantescos blecautes em um intervalo de poucos dias. O primeiro apagão de fevereiro afetou sete estados do Nordeste e o segundo, vários bairros da capital paulista. O episódio deixou irritada a presidente Dilma Rousseff, mentora do atual modelo elétrico nacional.

Na telefonia os riscos também são consideráveis. Para se ter ideia, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) estima que os acessos fixos e móveis de banda larga no país dobrarão dos atuais 40 mil para 80 mil em 2014. Em igual período, as linhas celulares saltariam de 175 milhões para algo entre 200 milhões e 225 milhões. As estimativas, contudo, foram elaboradas em 2008 e já estão defasadas. Dados da própria Anatel revelam que as assinaturas de telefonia celular já passaram a marca de 205 milhões, nível próximo ao previsto inicialmente para 2014.

Bruno Neto, consultor da Frost & Sullivan, afirma que o setor privado está apreensivo quanto à capacidade das redes nacionais de atender a crescente demanda. “Com a infraestrutura instalada hoje, mal se consegue suportar o ritmo atual de crescimento, que dirá nos próximos anos, quando haverá forte demanda por conta da Copa do Mundo e das Olimpíadas”, pondera. 

Segundo Neto, o receio das empresas leva em consideração também o corte de mais da metade do orçamento do Ministério das Comunicações, anunciado no início do mês, como parte do esforço fiscal do governo. “Isso pode levar a atrasos no Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) e também na licitação do espectro 4G, previsto para este ano”, acrescenta.

Outro problema é a baixíssima cobertura Wi-Fi no Brasil. A consultoria Teleco avisa que, enquanto os internautas do país contam com cerca de 4 mil hot spots — pontos de acesso gratuito — lugares como Coreia do Sul, com um quarto da população brasileira, têm mais de 40 mil. Se as obras de infraestrutura não começarem já e a todo vapor, será muito difícil usar em solo nacional dispositivos móveis como tablets, smartphones ou outros produtos semelhantes que surgirem no mercado, alerta a Teleco. 

Procurada pelo Correio, a Anatel disse que tem tomado todas as providências para que as redes e os serviços de telecomunicações sejam satisfatórios para atender compromissos firmados. A agência reguladora explica que, por ocasião dos Jogos Pan-Americanos no Rio (Pan), foi instalada em 2007 comissão de técnicos que se reúne periodicamente para tratar dos grandes eventos esportivos internacionais no país. “O Rio de Janeiro teve sua rede de telecomunicações testada e ampliada e há todas as condições estabelecidas para o Estado superar novos desafios”, garante a Anatel em nota.

Aeroportos sucateados
O grande movimento de passageiros nos aeroportos do país no ano passado, além de gerar caos e transtorno por incapacidade de atendimento, levou a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) a ampliar seu desempenho contábil. Segundo relatório financeiro e patrimonial divulgado quinta-feira, a estatal fechou 2010 com lucro líquido consolidado de R$ 30,49 milhões. O montante é 45,8% superior aos R$ 30,49 milhões apurados em 2009.

Para 2011, a expectativa é de que esses números avancem ainda mais e ajudem a evitar a repetição do conhecido apagão aéreo em datas comemorativas. “A expansão dos negócios da Infraero demandará medidas de reorganização administrativa, capazes de otimizar processos, rever a configuração empresarial e fortalecer o sistema de governança”, avalia a empresa em seu balanço anual.

A despeito de admitir a necessidade de investimento, a empresa não aplicou todos os recursos que tinha disponível no último ano. A Infraero investiu R$ 645,45 milhões em 2010, apenas 59,9% do R$ 1,07 bilhão originalmente previsto para o período. Ainda assim, os passageiros continuaram a sofrer com frequentes atrasos por falta de pista para pouso e manobras de aeronaves e de infraestrutura de atendimento aos consumidores.

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